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CAPITALISMO VERMELHO
Para representante brasileiro em Washington, transferência de produção é caminho inevitável
Destino de fábricas é a China, diz embaixador
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Transferir ao menos parte da
produção para a China será um
caminho inevitável para algumas
indústrias brasileiras, se elas quiserem sobreviver à concorrência
do país asiático. A conclusão foi
apresentada ontem pelo embaixador brasileiro em Washington,
Roberto Abdenur, que defendeu
ainda o abandono da visão "romântica" em relação à China.
Abdenur sustentou que a solidariedade do país asiático em relação ao Brasil e outros países em
desenvolvimento é limitada. "A
Índia e a China não se apresentam
no mundo como países em desenvolvimento, mas como potências", declarou o embaixador durante encontro da versão latino-americana do Fórum Econômico
Mundial.
A parceria estratégica com a
China esteve no topo da agenda
do governo em 2004, quando o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou Pequim e recebeu em
Brasília seu colega Hu Jintao. Na
época, foram anunciados bilhões
de dólares de investimentos chineses em infra-estrutura no Brasil, o que não se materializou até
hoje. Em contrapartida, o Brasil
reconheceu a China como uma
economia de mercado, o que também não saiu do papel, mas produziu impactos políticos.
"Sou cético em relação à China
como grande investidor no Brasil,
como foi o Japão", afirmou Abdenur, que trabalhou como embaixador em Pequim no fim dos
anos 80 e no começo dos 90. "Não
devemos ter ilusões."
A transferência de produção para a China já é uma realidade na
indústria de óleo e farelo de soja,
afirmou Carlos Lovatelli, presidente da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) e diretor da Bunge.
"Só exportamos grãos para a
China. Acabou a possibilidade de
exportar bens de valor agregado",
disse Lovatelli. Segundo ele, empresas do mundo todo estão mudando suas fábricas de óleo e farelo de soja para o país asiático. "Exportamos nossa força de trabalho
para lá", acrescentou.
A Bunge, por exemplo, não tinha nenhuma fábrica na China
até 2004 e hoje possui duas.
Há dez anos, o Brasil exportava
apenas óleo e farelo de soja para a
China. Em 2005, a quase totalidade das vendas era de soja em grão,
que custa metade do preço do
óleo. Lovatelli calcula que a transferência das atividades de processamento do Brasil para a China
equivalha a 1,5 milhão de toneladas de óleo e farelo por ano, o que
dá uma perda líquida de US$ 400
milhões (R$ 880 milhões).
O embaixador Abdenur disse
que a abertura de fábricas na China é uma estratégia de internacionalização e sobrevivência das
companhias. "A médio e longo
prazos, esse processo será saudável para as empresas brasileiras."
Mão-de-obra intensiva
Na opinião do embaixador, os
setores intensivos na utilização de
mão-de-obra são os principais
candidatos a transferir operações
para a China -processo conhecido como "outsourcing", amplamente usado por empresas de
países desenvolvidos.
Maurício Mesquita Moreira,
economista do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), defendeu a integração latino-americana como uma das maneiras de enfrentar a enorme escala
do mercado chinês.
O economista destacou que a
produtividade do país asiático
nos últimos anos cresceu em média 8% a 10% ao ano, enquanto no
Brasil o índice ficou entre 3% e
4%. Esse movimento praticamente anulou a vantagem que o Brasil
tinha em termos de produtividade em relação à China.
Moreira é contra a tese de transferência de produção. "Nós não
temos exatamente um excesso de
empregos no Brasil", afirmou.
Outro problema apontado por
ele é o crescimento da participação da China na exportação global de produtos manufaturados e
a estagnação da América Latina.
O país asiático ampliou sua fatia
de 1% nos anos 80 para 12% hoje,
enquanto o Brasil e seus vizinhos
se mantiveram na casa dos 4%.
"O futuro é muito difícil para os
produtores de manufaturados. O
mundo está congestionado nessa
área", disse Moreira, ao lembrar
que a Índia é outro país que passou a competir na venda de bens
industriais.
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