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LUÍS NASSIF
O voluntarismo do BC
Independentemente do que possa ocorrer no plano da política monetária, haverá
volatilidade grande no mercado por conta das eleições presidenciais. Mas o Banco Central contribuiu decisivamente para o nervosismo das últimas semanas. Não se tratou de apenas uma ação equivocada, mas de um conjunto delas.
A ação do BC visou prevenir dois processos inerentes ao momento atual, de transição somada à fragilidade das contas internas e externas: a volatilidade do mercado de títulos e do mercado cambial. Nessas fases de transição, o mercado
foge dos títulos longos e se refugia no dólar.
Desde que foram criadas pelo então diretor do BC no governo Sarney Luiz Carlos Mendonça de Barros, as LFTs (Letras Financeiras do Tesouro) se
constituíram no papel da transição por excelência, posto que
amarradas à taxa Selic (a taxa
de negociação dos títulos públicos).
Na mais medíocre fase econômica das últimas décadas
-a gestão Mailson da Nóbrega, no final do governo Sarney-, o dólar era vendido
com ágio de 100%, mas as LFTs
atravessaram incólumes o período. No ano passado, em plena crise argentina, o dólar foi a
R$ 2,80, mas as LFTs seguiram
firmes. Elas se tornaram o papel por excelência dos investidores conservadores, dos bancos estatais e grandes bancos e
de seus fundos.
Pois foi esse papel que o BC
colocou em risco com sua atuação.
Neste ano havia a rolagem
de grande volume de LTNs
cambiais. No vencimento do
papel, o BC passou a oferecer
"swap" de câmbio (seguro),
mas amarrado a LFTs de prazo mais longo.
Acabou colocando muito
mais LFTs do que o mercado
comportava, e com prazos
muito longos. Pior, poluiu o
papel, passando a atrelar a
venda de dólar futuro -que
tem risco cambial- com LFT,
que é título de dívida pública.
A dívida pode ser dolarizada,
prefixada ou amarrada na Selic. Mas não se pode atrelá-la
ao dólar para proporcionar
hedge cambial ao mercado.
Embora seja papel com larga
demanda, o Banco Central
passou a oferecer mais LFT do
que o mercado comportava.
Quando se deu conta de que
esse "swap" casado não funcionava, passou a oferecer "swap"
puro, criando passivos cambiais complicados para o próximo governo, ao mesmo tempo em que entrava em operação o SPB (Sistema de Pagamentos Brasileiro), reduzindo
a liquidez da economia e aumentando o risco de crédito.
Essa conjugação de fatores
levou a um processo de vendas
de LFTs no mercado que derrubou seu preço. Por seu conservadorismo, as LFTs são títulos de pouca margem de rentabilidade para os "carregadores" (as instituições que as
mantêm em carteiras). Quando são de prazo longo, qualquer alteração no preço tem
impacto profundo nos resultados. Os primeiros movimentos
de deságio provocaram prejuízos enormes e criaram nervosismo no mercado, levando as
instituições a se desfazer mais
do papel, derrubando ainda
mais seu preço.
Pior, o BC resolveu antecipar
a orientação de obrigar todos
os fundos a contabilizar as cotas pelo valor de mercado dos
títulos. Assim, a perda provocada pelo próprio BC acabou
sendo explicitada com muito
maior ênfase, trazendo medo
ao mais conservador dos investidores depois dos poupadores:
o dos fundos DI e de renda fixa.
A volta à normalidade passa,
antes de tudo, pela recuperação da imagem das LFTs, o que
depende de algumas posições
claras. A primeira é aceitar
que em períodos como o atual
o dólar tende a subir mesmo, e
há que manter a cabeça fria e a
tranquilidade até passar a
tempestade.
Em junho, por exemplo, haverá a saída de US$ 1 bilhão,
por conta de vencimentos de
dívida de empresas, que não
serão rolados. Esse dólar ou será suprido por exportadores ou
pelo BC. O papel do BC não é
inundar o mercado de "swaps"
e tentar segurar o dólar a ferro
e fogo, mas, primeiro, se preparar para ofertar a moeda nessa
fase de transição.
Segundo, acalmar os investidores em fundos de renda fixa
e DI. Terceiro, ouvir mais o
mercado, não para seguir suas
recomendações, mas para tornar mais eficaz a atuação do
BC e reduzir esse grau de voluntarismo que trouxe ao já
conturbado momento econômico brasileiro uma insegurança a mais, que não havia.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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