|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUÍS NASSIF
O nó do fluxo cambial
Ao aumentar os juros para
criar o diferencial para atrair
os dólares, ampliam-se as
dívidas pública e externa
|
ESSA HISTÓRIA de que a volatilidade cambial é passageira
não cola. A economia mundial já entrou em um circuito disfuncional provocado pelo livre fluxo de
capitais.
A tentativa de amarrar o financiamento da dívida pública ao investimento externo só não foi tão irresponsável quanto a indexação das tarifas públicas ao IGP-M, porque pode ser revertida.
Há anos a economia mundial caminha em cima da navalha. Países
com problemas de balança comercial (como o Brasil de 1999 e o México de 1995) e países com superávits
robustos (Coréia do Sul) passaram
pela mesma crise cambial unicamente devido ao fato de permitir o
livre fluxo de capitais.
A Excalibur do crescimento sustentado brasileiro dependerá de se
estabelecerem controles ao livre fluxo de capital especulativo. Seria importante recuperar o trabalho
"Crescimento Econômico com Poupança Externa?", publicado por
Luiz Carlos Bresser-Pereira e Yoshiaki Nakano, na "Revista de Economia Política" de abril-junho 2003.
A poupança externa só é relevante
para países com desequilíbrio no balanço de pagamentos e que precisam
financiar suas importações. O ingresso do fluxo financeiro de dólares
provoca diversos efeitos deletérios.
Ao aumentar a taxa de juros, para
criar o diferencial necessário para
atrair os dólares, ampliam-se as dívidas pública e externa. O processo
só seria sustentável se, ao aumento
da dívida, correspondesse o aumento do investimento em setores com
potencial de exportação.
O segundo efeito é o da apreciação
da moeda nacional ou a sua sustentação a um custo fiscal pesado.
Como se pode pretender esticar o
prazo da dívida e reduzir as taxas de
juros, amarrando-a ao mais volátil
dos ativos: os dólares que ingressam
na economia brasileira? A mera saída de parte dos dólares chacoalha o
câmbio, impactando a rentabilidade
de toda a carteira de investimentos
externos.
Há quem defenda o investimento
externo em ações, em substituição
aos empréstimos. Mas, se em aplicações de portfólio, o efeito será o mesmo. Como ativo fundamentalmente
líquido, a fuga das ações tem a mesma natureza das fugas de títulos públicos.
Toda a fundamentação da liberalização financeira dos anos 90 era que
o investimento externo será fundamental para financiar o desenvolvimento dos países emergentes. "O fato de que a poupança externa corresponde ao déficit em conta corrente geralmente não é mencionado. Quando o é, o fundamento lógico
que o FMI [Fundo Monetário Internacional] utiliza para minimizar seu
papel é um típico pressuposto da
corrente dominante: a teoria dos déficits gêmeos", diz o trabalho.
O curioso é que, em 1994, nas comemorações dos dez anos do Plano
Real, o economista Edmar Bacha
publicou um trabalho sustentando
(com atraso de dez anos!) que abrir a
economia para fluxo de capitais não
era garantia de aumento da taxa de
investimento. De lá para cá, todos os
pretextos foram utilizados para
manter esse fluxo volátil. Certamente nem Luiz Inácio Lula da Silva
nem Geraldo Alckmin têm envergadura para romper com esse nó.
Internet: www.luisnassif.com.br
Luisnassif@uol.com.br
Texto Anterior: Ajuda para exportador prejudicado pelo câmbio sairá em 15 dias, afirma Furlan Próximo Texto: SP registra maior deflação em seis anos Índice
|