São Paulo, quinta-feira, 06 de julho de 2000


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SOCORRO
Estudo de Fabio Giambiagi e André Averbug, do BNDES, diz que demora em fechar acordo agravou situação do país
"FMI errou três vezes na crise brasileira"

CHICO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO

O FMI (Fundo Monetário Internacional) cometeu pelo menos três erros importantes antes, durante e depois da crise da desvalorização cambial brasileira, ocorrida em janeiro de 1999, embora o acordo com o organismo internacional e a política econômica adotada com seu amparo devam ser considerados bons para o país.
Essas conclusões são dos economistas Fabio Giambiagi e André Averbug, do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), no estudo "A Crise Brasileira de 1998/1999 -Origens e Consequências", que foi divulgado esta semana pelo banco estatal.
Na época em que o estudo foi feito, Averbug trabalhava no BNDES cedido pelo Pnud, o programa das Nações Unidas para o desenvolvimento, graças a um convênio estabelecido entre os dois órgãos.
O BNDES ressalva que as opiniões dos economistas não representam, necessariamente, o ponto de vista da instituição como um todo.
O primeiro erro, de acordo com o estudo, foi a cláusula vigente na primeira versão do acordo, assinado no final de 1998. Segundo a cláusula, as reservas internacionais líquidas do país não poderiam ser inferiores a US$ 20 milhões.
Essa cláusula, no entender dos economistas, ressaltou, no período pré-crise, a idéia de que o governo brasileiro estava perdendo autonomia decisória no que se refere ao propósito de manter a política então vigente de câmbio fixo, com desvalorização gradual.
"Na prática, o acordo com o FMI limitava a margem de intervenção do Banco Central em defesa da política cambial", dizem os autores do texto, acrescentando em seguida: "Com essa cláusula, o acordo com o FMI tornou-se de certa forma estéril."
Já nas conclusões do trabalho, eles afirmam que a limitação "acabou alimentando as especulações contra a política cambial praticada até janeiro de 1999".

Demora
O segundo erro do organismo internacional teria sido o de "ter contribuído para a paralisia que tomou conta das autoridades brasileiras nas primeiras semanas da crise, após a desvalorização".
Giambiagi e Averbug sustentam que a demora do organismo internacional em restabelecer as negociações com o país durante a crise "deu sua cota de contribuição" para que as autoridades econômicas do país tenham assistido "passivamente" à alta do dólar a uma média de mais de 4,5% por dia útil.
Nesse ponto, o estudo condena a paralisia, mesmo considerando os complicadores trazidos por "eventuais divergências entre o presidente do Banco Central na época (Francisco Lopes) e o ministro da Fazenda (o mesmo de hoje, Pedro Malan) e pelo fato de ainda não terem sido votadas medidas de ajuste fiscal necessárias a um programa de estabilização".

Repique
O terceiro erro do FMI na crise brasileira teria ocorrido já no segundo semestre de 1999, após a turbulência ter sido controlada.
Foi, segundo o estudo, o fato de não ter sido feita uma revisão mais rápida da permissão para o país gastar parte das suas reservas no mercado de câmbio.
Esse erro, de acordo com os economistas, permitiu, em parte, "a alta espasmódica da inflação no final de 1999".
Na época, o dólar, após ter caído do pico de mais de R$ 2,00 que atingiu no primeiro trimestre do ano para R$ 1,65, chegou novamente a R$ 2,00. Isso pressionou os preços internos, que já sofriam os efeitos de outros fatores, como a alta do barril do petróleo no mercado internacional.
No seu conjunto, o trabalho dos dois economistas é amplamente favorável à política do governo após a crise.
Em relação ao FMI, eles destacam que o "colchão" representado pelo empréstimo de US$ 42 milhões feito pelo Fundo permitiu ao governo brasileiro "superar circunstâncias dramáticas", entre elas a elevação e posterior redução dos juros em intensidade e velocidade adequadas.
A austeridade fiscal decorrente da receita do FMI, para os economistas, "mudou radicalmente o contexto econômico do país", permitindo que o Brasil conseguisse superar a crise com a inflação subindo "relativamente pouco".
A nova política permitiu ainda ao país voltar a crescer (descontados os efeitos típicos de cada período, ditos sazonais), contra todos os prognósticos, só não obtendo melhor desempenho por causa dos efeitos negativos trazidos para 99 pela recessão do último trimestre de 98, no pré-crise.
Essa recessão, de acordo com o estudo, também teve seu lado bom: teria ajudado o Brasil a sair da crise a custos menores do que, por exemplo, pagaram o México e a Coréia do Sul.
A situação recessiva prévia teria impedido o repasse generalizado aos preços dos custos da desvalorização cambial, explicando, em parte, a baixa inflação ao consumidor (8,9% pelo índice oficial, medido pelo IBGE).
O representante do Fundo Monetário Internacional no Brasil, Lorenzo Pérez, afirmou à Folha que não vai fazer comentários sobre o estudo antes de sua publicação.


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