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OPINIÃO ECONÔMICA
Tudo contra o investimento
GESNER OLIVEIRA
A conjuntura econômica
conspira contra o investimento produtivo. Esse é um dos
principais obstáculos a uma recuperação sustentada da economia
nos próximos meses.
Os números comprovam uma
retração do investimento. Não do
investimento no sentido coloquial
de aplicação financeira, mas da
ampliação da capacidade produtiva do país. Dados do IBGE registram uma queda de 6,4% no investimento no segundo trimestre
de 2003 comparativamente ao período imediatamente anterior. O
declínio chegou a 9% relativamente ao mesmo período de 2002.
Mais evidências. A importação
de bens de capital apresentou
queda de 21% até julho. A atividade da construção, que representa dois terços da formação de
capital, caiu 11% no primeiro semestre quando comparada com o
mesmo período de 2002.
Os dados do IBGE permitem estimar uma taxa de investimento
(isto é, a razão entre o investimento e o PIB) de 17,6% no primeiro semestre de 2003. É o menor valor desde 1967. Na década
de 1970, por exemplo, a taxa de
investimento foi na média superior a 21%. Para voltar a crescer
de forma sustentada, seu valor
deveria ser até maior, dado o aumento da necessidade de capital
por unidade de produto.
Há três fatores que inibem a inversão em capacidade produtiva
na atualidade. Em primeiro lugar, a alta taxa de juros. Apesar
das reduções nas últimas duas
reuniões do Copom (Comitê de
Política Monetária), o juro real
(isto é, deflacionado pelas expectativas futuras de inflação) continua superando os dois dígitos.
Utilizando as medianas das expectativas da pesquisa Focus do
Banco Central para a taxa de juros Selic e o IPCA, obtém-se um
juro real em torno de 11%.
Em segundo lugar, persiste
grande indefinição quanto ao
marco regulatório nos segmentos
de infra-estrutura como energia e
telecomunicações. Em particular,
ainda não está claro quando e se
haverá mudanças significativas
no modelo de agências reguladoras concebido e parcialmente implementado pela administração
anterior.
A relutância em investir em infra-estrutura é especialmente nociva pelas suas repercussões no
conjunto da economia. Diferentes
segmentos acompanham, por
exemplo, a trajetória de expansão
da capacidade do setor elétrico e
as chances de nova crise na segunda metade da década caso a
economia volte a apresentar uma
taxa de crescimento próxima a
4% ao ano.
O roteiro para a nova agenda
de desenvolvimento econômico
divulgado pelo governo na última
reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
constitui um avanço em relação
àquilo que vinha sendo o discurso
oficial. Em contraste com o bombardeio contra as agências reguladoras, pela primeira vez se explicitou o compromisso "com o estabelecimento de modelos regulatórios transparentes, bem definidos e específicos para os setores de
infra-estrutura". Mas sem nada
de concreto que possa dar maior
segurança para o investidor.
Em terceiro lugar, há muita
apreensão quanto ao respeito aos
direitos de propriedade em virtude da frequência e intensidade de
manifestações de movimentos como os dos sem-terra e sem-teto no
campo e na cidade, respectivamente.
Some-se a isso o fato de que as
reformas em discussão no Congresso e, em particular, a reforma
tributária não asseguram em seu
conteúdo maiores estímulos à inversão produtiva. A reforma previdenciária é necessária, mas,
contrariamente àquilo que se
apregoa, não deve elevar a taxa
agregada de poupança e investimento.
Por sua vez, o texto aprovado
na madrugada da quinta-feira
para a reforma do sistema de impostos é um monstrengo tributário. No tangente ao custo de investimento, há uma única menção à desoneração de bens de capital, uma vez que o IPI "terá reduzido seu impacto sobre a aquisição de bens de capital pelo contribuinte do imposto, na forma da
lei". É pouco diante do risco de
aumento da carga tributária que
a proposta encerra e seu consequente efeito negativo sobre a atividade produtiva.
É provável que a economia volte a crescer no segundo semestre e
de forma mais nítida no último
trimestre. O IBGE divulgou ontem um primeiro e tímido sinal
de que a indústria teria saído do
fundo do poço, confirmando o
que outros indicadores de antecedentes já vinham apontando. A
produção industrial acusou expansão de 0,4% relativamente a
junho, com uma mãozinha da
Petrobras, que registrou aumento
atípico da produção de petróleo e
gás natural em julho.
Porém, sem um aumento da taxa de investimento, a recuperação da economia será frágil e de
curta duração. E sem uma retomada sólida não haverá a tão necessária quanto prometida geração de empregos.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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