São Paulo, domingo, 6 de setembro de 1998

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MERCADO TENSO
Economistas dizem que rombo nas contas externas precisa cair porque financiamento será mais restrito
Poupança externa fica cara
e mais difícil

Antonio Kandir, ex-ministro e deputado federal pelo PSDB de São Paulo da Reportagem Local


Desde o início do Plano Real, o país vem importando mais do que exporta e só consegue pagar a conta porque recebe a poupança de outros países. Com o efeito dominó da crise asiática que chegou à América Latina, o mundo não está mais disposto a financiar parte do consumo e dos investimentos realizados no Brasil. A avaliação é de economistas ouvidos pela Folha.
"Não vai haver mais essa facilidade de financiamento", diz o economista e ex-ministro Antonio Kandir. A solução é diminuir o tamanho do rombo das contas externas.
Para Kandir, num cálculo otimista isso significa diminuir o déficit comercial (importações menos exportações) em US$ 4 bilhões em dois anos. O déficit estimado para este ano é de US$ 6 bilhões.
Cenários mais conservadores apontam para a necessidade de reverter o déficit de US$ 6 bilhões num superávit de US$ 10 bilhões.
O déficit total brasileiro atual está em cerca de US$ 30 bilhões. Nesse item da contabilidade estão incluídos o déficit comercial e o déficit da conta de serviços, que inclui, entre outros, o pagamento de juros, de fretes internacionais e fluxos de turistas -estimado entre US$ 24 bilhões e US$ 26 bilhões.
Kandir calcula que daqui a dois anos o rombo não poderá ser superior a US$ 25 bilhões.
Esse total, segundo Kandir, deverá ser igual ao montante de investimentos diretos que entrarão no Brasil naquele ano.
Logo, é preciso diminuir o buraco em US$ 5 bilhões. Como os gastos da conta de serviços são extremamente rígidos, ele calcula ser possível reduzi-lo em US$ 1 bilhão. O resto do ajuste fica por conta dos ganhos de exportação e cortes na importação.
Na opinião do economista Luiz Gonzaga Belluzzo, o país não deve contar com investimentos produtivos (diretos) superiores aos que aconteceram neste ano.
O fim das privatizações de maior peso e a recessão mundial não devem estimular a entrada de mais capitais, avalia Belluzzo.
O governo já sinalizou sua preocupação em reduzir o déficit, criando uma burocracia para a liberação da importação de produtos. O Decex (Departamento de Comércio Exterior) ficou com o poder de analisar, pelo tempo que achar conveniente, qualquer pedido de importação.

Medidas emergenciais
A grande maioria dos especialistas ouvidos defende medidas emergenciais para conter a crise, pois não haveria tempo para o ajuste demorado das contas.
Até agora, o governo adotou medidas consideradas tímidas para defender a moeda. O resultado foi a queima de US$ 17 bilhões de reservas, segundo estimativas do mercado financeiro, que calcula as reservas em menos de US$ 60 bilhões. Quando as reservas chegarem a US$ 50 bilhões soará o alarme: o país estará mais vulnerável.
Ninguém aposta em uma melhora iminente, depois de uma semana tensa. A Bolsa de São Paulo caiu 13,47% na semana, e o Brasil ficou mais arriscado para receber investimentos, segundo a agência de classificação de risco Moody's.
O ponto central da crise é justamente a avaliação do mercado de que o Brasil não vai conseguir pagar seus credores externos.
Dos cerca de US$ 220 bilhões que o país deve, aproximadamente 80% são dívidas privadas de empresas e de bancos que aproveitaram a grande oferta de dinheiro que havia no mercado. Mas o dinheiro, que era barato, ficou caro.



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