São Paulo, domingo, 06 de novembro de 2005

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BANCO X BANCO

Inspeção indica deficiências nas concessões de crédito da instituição, que tem R$ 50 bi para empréstimos neste ano

BC aponta controles "frágeis" no BNDES

LEONARDO SOUZA
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O BNDES tem controles "frágeis" para a concessão de crédito, sem sistema adequado para avaliar o nível de risco dos tomadores de empréstimos, tanto no caso de empresas não-financeiras quanto no de bancos. A avaliação é do Banco Central, que realizou inspeção no BNDES de abril a agosto do ano passado e desde então cobra providências da instituição, cuja carteira de empréstimos deve alcançar R$ 50 bilhões neste ano.
Em expedientes trocados entre as duas instituições, aos quais a Folha teve acesso, o BC relaciona oito irregularidades e 15 deficiências nos procedimentos adotados pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social), incluindo descumprimento a resoluções do CMN (Conselho Monetário Nacional).
O BNDES reconhece a grande maioria das falhas e apresenta, em diferentes momentos, diversos planos para corrigi-las, muitos dos quais considerados insuficientes pelo BC. A última proposta do BNDES, encaminhada no final de julho deste ano, ainda está sob análise do Banco Central.
O BNDES é o maior banco de fomento do país e praticamente a única fonte de crédito de longo prazo. Nos primeiros relatórios decorrentes da inspeção, os técnicos do BC destacaram que o aumento no volume de crédito concedido pelo BNDES entre 2003 e 2005 (de R$ 35 bilhões para a previsão inicial de R$ 60 bilhões neste ano, revista para R$ 50 bilhões) intensificaria a necessidade de correção de deficiências do banco. "Os controles internos do Sistema BNDES, tais como existem atualmente, são frágeis e não atendem às prescrições da resolução do Conselho Monetário Nacional 2.554", escreveram os técnicos do BC.
A referida resolução do CMN trata dos critérios de avaliação de risco para operações de crédito. "As etapas do processo desempenhadas pelo Sistema BNDES (avaliação, concessão, monitoramento e cobrança) estendem-se por diversas unidades e gerências, mas há poucos elementos de integração entre elas, e aqueles que existem funcionam, no geral, de modo incipiente [...], retirando eficiência da gestão de crédito e representando pontos de risco para todo o sistema", relataram.
Os técnicos do BC também ressaltaram que no processo de crédito, tanto para as operações diretas quanto para as indiretas (repassadas por agentes financeiros), "foram constatadas deficiências, com destaque para aquelas referentes aos modelos de classificação de risco de crédito".
Ao conceder empréstimos para pessoas jurídicas, os bancos cobram juros levando em consideração o risco do cliente. Ou seja, a capacidade de o tomador do crédito pagar a dívida. A taxa de juros cobrada de acordo com a probabilidade de calote é chamada de "spread de risco". Segundo o BC, o BNDES não conta com mecanismos para definir o "spread de risco" com base em critérios técnicos. Isso significa que poderia haver cobrança desigual de juros dos tomadores de crédito.
Em dezembro de 2004, o BNDES apresentou plano para corrigir a falha, mas o BC o considerou insuficiente. "A resposta oferecida ratifica a deficiência apontada a respeito da fixação do "spread de risco", arbitrado sem estudo técnico que o amparasse", escreveu o BC.
Em expediente do dia 16 de setembro passado, o diretor de Fiscalização do BC, Paulo Cavalheiro, também ressaltou que as providências que haviam sido apresentadas pelo BNDES em dezembro de 2004 eram insatisfatórias, o que levou o BNDES a apresentar novas propostas em julho deste ano. "Apesar da pertinência dessa iniciativa [a de dezembro], as providências a serem implementadas tornavam-se imprecisas e vagas", escreveu Cavalheiro.
Em sua última defesa, o BNDES reconheceu as falhas apontadas pelo BC. "Podemos estimar que até o final de outubro de 2005 todas as questões estarão esclarecidas e que o BNDES poderá voltar a cobrar o "spread de risco" em consonância com a classificação de risco da operação."
Resolução do CMN obriga instituições financeiras a rever periodicamente a classificação de risco dos devedores por atraso, o que obriga bancos a separar recursos para cobrir eventuais prejuízos com operações de crédito. Quanto mais o cliente atrasa para quitar o débito, maior a reserva que o banco é obrigado a fazer. O BNDES não faz a reclassificação.
O BC também apontou como irregularidade o fato de o BNDES suspender em alguns casos a inadimplência de determinados clientes sem amparo em normas internas do próprio banco. "De fato, a ausência de normas pode ensejar um grande grau de subjetividade", escreveu o BNDES, que criou grupo de trabalho para cuidar do assunto. Algumas falhas do controle de risco do BNDES persistem desde 2001, anota o BC.

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