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ALFÂNDEGA
Tecon, responsável por metade do movimento de contêineres em Santos, teria liberado mercadorias sem passar pela Receita
Terminal é acusado de operar sem inspeção
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A Polícia Federal e a Secretaria
da Receita Federal vão investigar
a Santos-Brasil, empresa que opera o Terminal de Contêineres de
Santos (Tecon de Santos, o maior
da América Latina), por suposta
prática de fraude na liberação de
mercadorias importadas antes de
desembaraço aduaneiro.
Denúncia feita à Procuradoria
da República no Estado de São
Paulo em setembro deste ano levou os dois órgãos a iniciar investigação na Santos-Brasil.
A empresa é controlada pelo
Opportunity, pela Previ e pelo Citigroup e opera desde 1997 o Tecon de Santos.
O terminal, responsável pelo
movimento de metade dos contêineres que transitam no porto
de Santos -ou cerca de 20% dos
contêineres embarcados e desembarcados no país-, é acusado de
liberar parte de mercadoria para
clientes antes da inspeção de auditores da Receita Federal. Nos
documentos encaminhados ao
Ministério Público Federal, essa
facilidade teria sido dada em
2002, 2003 e 2004 a uma montadora e a uma fabricante de peças.
A Santos-Brasil adquiriu o direito de arrendar por 25 anos o
Tecon de Santos em leilão público
realizado na Bovespa, em novembro de 1997. Contrato no valor de
R$ 274 milhões foi celebrado com
a Codesp (Companhia Docas do
Estado de São Paulo).
No dia 16 de setembro, a Delegacia de Polícia Federal em Santos
instaurou o inquérito policial nš
916 para apurar a denúncia. No
dia 6 de outubro, Antonio Vieira
da Silva Hadano, delegado da Polícia Federal em Santos, ouviu
Paulo da Silva Junior, ex-funcionário da Santos-Brasil, que confirmou a saída de mercadorias do
terminal antes da alfândega.
No termo de declaração feita à
Polícia Federal, Silva Junior afirma que "recebeu da direção da
empresa a ordem expressa de facilitar as liberações das cargas de
importações de empresas". Em
seu depoimento, ele diz que essa
liberação ocorria porque as empresas não podiam ficar "sem determinados itens de importações,
sob pena de paralisação de seus
serviços e linhas de produção".
Interesses comerciais
O ex-funcionário da Santos-Brasil declarou ainda à Polícia Federal que essa prática era feita para atender interesses comerciais.
Disse também que recebia telefonemas ou mensagens por e-mail
estabelecendo os números de caixas e as referências dos materiais
que deveriam ser entregues aos
importadores. Essas informações,
segundo disse à Polícia Federal,
deveriam ser mantidas em sigilo.
Procurado pela Folha, o ex-funcionário não quis falar por medo
de ameaças e represálias.
José Roberto Sagrado Da Hora,
delegado de Política Federal em
Santos, diz que haverá, a partir de
agora, uma investigação para
identificar as empresas que se beneficiaram desse suposto esquema e se houve ou não pagamento
de impostos nessas operações. A
conclusão desse inquérito, segundo informa, pode levar um ano.
Documentos encaminhados ao
Ministério Público Federal de
Santos mostram notas emitidas
pela Santos-Brasil de autorização
para a "saída de carga solta". Em
alguns desses documentos, as Declarações de Importações -as
DIs- mencionadas não existem,
segundo informa a Receita.
Em algumas das notas, o número de DI tem um dígito a mais (oito dígitos, não sete). Há um caso
em que o mesmo número de Declaração de Importação é citado
em dois documentos de liberação
de carga solta com datas de desembaraço diferentes -o que
muda é só a referência das caixas
de peças para veículos. A Receita
suspeita que, nesse caso, possa ter
havido clonagem de DIs para liberar produtos sem fiscalização.
Erro de digitação ou fraude
Nota de autorização de "saída
de carga solta" emitida pela Santos-Brasil em 16 de dezembro de
2002 foi a que mais chamou a
atenção da Receita. Nesse documento, cita que peças de uma
montadora de veículos foram desembaraçadas em 19 de dezembro
de 2002. Segundo a Folha apurou
com a Receita Federal, ou houve
um simples erro de digitação ou
fraude descarada.
"Vamos fazer diligência, buscar
dados para conclusão de uma sindicância. Se houve falsificação de
DI, provavelmente isso foi feito
para acobertar o desembaraço de
carga. Os interessados são as empresas que importaram e o armazém", diz José Guilherme Antunes de Vasconcelos, inspetor da
Alfândega da Receita Federal em
Santos. "As mercadorias não podem ser retiradas dos recintos
sem autorização da Receita."
"Nunca ouvi falar nisso [em liberação de mercadorias antes de
ser feito o desembaraço aduaneiro]. Desconheço essa prática. Para
uma carga ser liberada, tem de
passar pela fiscalização", afirma
Ronaldo Lázaro Medina, o coordenador-geral da Coana (Coordenação Geral de Administração
Aduaneira da Receita).
A inspeção de mercadorias que
chegam ao país por auditores da
Receita Federal deve ser feita
quando elas entram pelo chamado canal vermelho e, eventualmente, pelo amarelo. Quando a
carga passa pelo canal verde, o
que acontece no caso da maioria
dos produtos que chegam ao Brasil, significa que o desembaraço já
está liberado pelo sistema eletrônico. No caso do canal amarelo,
pode ou não haver inspeção da
Receita Federal.
Empresas de fachada
De janeiro a setembro deste ano,
a Receita Federal em Santos já encaminhou representações fiscais
para fins penais ao Ministério Público Federal que envolvem 167
pessoas físicas responsáveis por
empresas. As irregularidades
constatadas pela Receita nessas
representações vão desde montagem de empresa de fachada e falsa
declaração de conteúdo (importou um produto, mas declarou
outro) até sonegação fiscal.
O número de representações
fiscais para fins penais encaminhadas pela Receita ao Ministério
Público Federal de janeiro a setembro deste ano é 110% maior
do que o de igual período do ano
passado. "Temos hoje mais ferramentas para identificar as fraudes", afirma Vasconcelos. O porto
de Santos, segundo informa, é
responsável por 28% das mercadorias que chegam ao país. Movimenta cerca de 70 milhões de toneladas por ano.
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