São Paulo, terça-feira, 07 de agosto de 2007

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Braskem critica "estatismo" no setor petroquímico

Presidente da empresa vê ato "intempestivo" da Petrobras na compra da rival Suzano

Sócia da estatal em outros empreendimentos, Braskem afirma que governo tinha se comprometido a não competir com setor privado

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

Presidente da Braskem, maior empresa petroquímica da América Latina, José Carlos Grubisich afirma que a compra da Suzano Petroquímica pela Petrobras foi um movimento "intempestivo" da estatal, que fugiu ao script desenhado pelo próprio governo para o setor.
"O governo tinha se comprometido a dar à iniciativa privada a liderança do setor com a contrapartida de que a Petrobras seria um agente de motivação e de estímulo para o desenvolvimento da petroquímica, e não um concorrente das empresas privadas", afirmou Grubisich à Folha. Com a compra da Suzano, anunciada na sexta, a Petrobras, que é sócia da Braskem em outras empresas, passa a ser a segunda indústria petroquímica do país.  

FOLHA - O sr. acha que a compra da Suzano Petroquímica foi um movimento de reestatização do setor?
GRUBISICH
- Foi um retrocesso esse movimento que a Petrobras fez de comprar 100% do capital da Suzano Petroquímica sem a participação ativa nas negociações do grupo Unipar [que tem parte da petroquímica no Sudeste]. Nós vemos com preocupação esse processo, que pode levar à reestatização de parte do setor petroquímico brasileiro. Nós achamos que esse processo pode levar a um desequilíbrio de jogo no setor.

FOLHA - Que tipo de desequilíbrio?
GRUBISICH
- A Petrobras tem um peso muito importante no início da cadeia produtiva da petroquímica, seja no fornecimento da nafta, do propeno, seja do gás natural. É importante que ela explicite de forma clara se tem ou não intenção de reestatizar parte do setor petroquímico. É fundamental que a Petrobras diga, de maneira objetiva, se esse movimento foi uma etapa no processo de consolidação da petroquímica do Sudeste e se ela está ou não comprometida em trazer a Unipar, ou a Unipar e mais alguém, para dar à iniciativa privada a liderança do processo.

FOLHA - O que o sr. acha que a Petrobras deveria fazer?
GRUBISICH
- A Petrobras deveria repetir o que foi feito na Braskem, de ser minoritária, mas com participação relevante. Nas empresas em que somos sócios, a Braskem detém 60% e a Petrobras, 40%, como nos casos da Ipiranga e da joint-venture da refinaria de Paulínia.
Em todo o processo que a Braskem conduziu, essa convenção foi respeitada. A Petrobras ficou como minoritária, mas com presença no conselho e com a capacidade de influir nas principais decisões da empresa.
Em Paulínia (SP), quando foi feito o lançamento da pedra fundamental, com a presença do presidente Lula e do presidente da Petrobras, José Carlos Gabrielli, foi colocado de forma clara que o papel da Petrobras era o de alavancar o setor privado para acelerar o desenvolvimento da petroquímica.

FOLHA - O sr. se surpreendeu com a compra da Suzano pela Petrobras?
GRUBISICH
- O que surpreendeu foi que, em todo o entendimento conceitual no processo de consolidação que vinha sendo discutido com a Petrobras e as empresas petroquímicas, a liderança seria do setor privado.

FOLHA - O sr. acha que a Petrobras pode favorecer a Suzano, agora controlada pela estatal, no fornecimento de matéria-prima?
GRUBISICH
- Na hora em que a Petrobras assume o controle de parte do setor e promove a reestatização, isso desequilibra o jogo. Como é que vai se administrar a questão do fornecimento da matéria-prima? É importante a gente ter isonomia de preço na compra da matéria-prima para a Petrobras garantir a competitividade.

FOLHA - O que a Petrobras deveria ter feito no caso da Suzano?
GRUBISICH
- A Petrobras deveria ter chamado a Unipar para ser sócia, numa equação na qual a estatal ficaria com 40% do capital. A Unipar ficaria com 60%, e as duas montariam um modelo de governança corporativa que alinhasse seus interesses, para que a estatal se sentisse participante do processo, mas sem o controle.

FOLHA - O sr. acha que esse movimento pode prejudicar os planos de investimentos futuros no setor?
GRUBISICH
- Qual o nosso interesse? Qual o interesse do país? O que a gente quer é que a petroquímica volte a investir, volte a criar emprego, volte a ser competitiva no mercado global, e esse movimento da Petrobras pode gerar uma dúvida estrutural no setor e fazer com que os investimentos fiquem prejudicados para o futuro.

FOLHA - Qual é a tendência no mundo?
GRUBISICH
- As empresas de petróleo no mundo estão concentrando os investimentos em buscar novas reservas de petróleo e gás, além de investir na produção. É isso que tem criado valor nas empresas. A BP saiu do negócio da petroquímica, a Shell também, a Total vendeu sua participação, e no Brasil houve a privatização.
O governo tinha se comprometido a dar à iniciativa privada a liderança do setor com a contrapartida de que a Petrobras seria um agente de motivação e de estímulo para o desenvolvimento da petroquímica, e não um concorrente das empresas privadas. A impressão que se tem é a de que esse movimento é uma revisão daquilo que tinha sido colocado de maneira clara e objetiva na lei da privatização do setor. O que eu acho é que a compra da Suzano foi um passo fora do script, um movimento intempestivo da Petrobras de comprar o controle da Suzano.


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