São Paulo, terça-feira, 07 de setembro de 2004

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RESENHA

Professor descreve economia brasileira de 1947 a 2001

MARCOS ANTONIO CINTRA
DA EQUIPE DE EDITORIALISTAS

O professor Antonio Dias Leite, entre muitas outras atividades, foi responsável pela primeira estimativa da renda nacional, relativa ao período 1947-1949, em pesquisa realizada na Fundação Getúlio Vargas e publicada em 1950. A partir de sua longa e profícua experiência, como professor universitário e ministro de Estado, ele passa em revista os conceitos básicos das ciências econômicas, que ele ajudou a consolidar, bem como elabora um grande panorama da economia brasileira entre 1947 e 2001.
O olhar panorâmico permite compreender que a economia e a sociedade brasileira passaram por profundas transformações durante esse período. O país montou as principais indústrias, em articulação com o empresariado nacional, as empresas estatais e as multinacionais. As cidades cresceram, mediante um dos mais intensos e rápidos processos de êxodo rural da humanidade, acompanhando a modernização da agricultura. A sociedade se sofisticou, e foram aperfeiçoados os mecanismos de controle da gestão pública e privada: os partidos políticos, o sistema judiciário, a imprensa, os sindicatos, as organizações não-governamentais etc.
Mas o sobrevôo do professor Leite possibilita também observar os problemas estruturais ainda não equacionados, sobretudo a elevada concentração da renda e da riqueza, a incapacidade do sistema bancário e do mercado de capitais domésticos de desenvolver instrumentos de crédito de longo prazo para financiar o investimento produtivo e a deterioração ambiental do território rural e urbano.
Além disso, fica evidente na análise do professor a dependência externa do país. No início dessa longa história de mudanças, o país dependia da importação de insumos estratégicos (petróleo e aço, por exemplo), de tecnologia e de capitais. Mais de 50 anos depois, o país caminhou para a auto-suficiência em petróleo e em inúmeros outros setores, mas continuou dependente de novas tecnologias e, sobretudo, de capitais. A abertura comercial e financeira dos anos 90 por si só não logrou promover uma estrutura produtiva competitiva internacionalmente, assim como o processo de industrialização anterior, entre 1956 e 1982, não fomentou a expansão das exportações.
O resultado foi um elevado endividamento externo, que aumentou a vulnerabilidade do país aos acontecimentos e humores dos agentes financeiros internacionais. A instabilidade dos juros e do câmbio reduziu a taxa de crescimento da produção e do emprego doméstico. Por isso, o autor recoloca, acuradamente, a necessidade de retomar a discussão de uma estratégia nacional de longo prazo para o país.

Deterioração
Articular um novo projeto de desenvolvimento sustentável e eqüitativo não parece tarefa fácil. Grande parte da capacidade de planejamento e de coordenação dos interesses públicos e privados pelo Estado brasileiro se deteriorou muito nos últimos anos. Além disso, a "inserção internacional" do país, sob o comando das elites financeiras e rentistas, mediante regras de "bom comportamento" medidas pelas oscilações diárias do risco-país, limita a capacidade de implementação de políticas ativas de desenvolvimento. As políticas fiscal e monetária permanecem subordinadas às regras do sistema financeiro doméstico e internacional, contendo o investimento público e privado.
Entretanto, e essa parece ser a principal conclusão do livro, as dificuldades do empreendimento não são obstáculos intransponíveis. Neste momento, a oportunidade histórica de um novo ciclo de desenvolvimento parece bater às portas do país, se a política macroeconômica permitir a articulação do dinamismo interno com a expansão da economia mundial.
A cautela na gestão macroeconômica pode permitir o equacionamento dos mecanismos de financiamento da infra-estrutura econômica e restaurar a confiança empresarial na expansão sustentada da economia, a fim de promover a ampliação da capacidade produtiva nos insumos básicos, principais estrangulamentos da economia brasileira. A leitura atenta do livro de Leite pode auxiliar a destravar "corações e mentes", fomentando uma articulação política, empresarial e sindical para enfrentar os desafios do desenvolvimento.


A ECONOMIA BRASILEIRA: DE ONDE VIEMOS, ONDE ESTAMOS E O QUE ESPERAR DO FUTURO. Autor: Antonio Dias Leite. Editora: Campus. Quanto: R$ 59,90 (248 págs.). Internet: www.campus.com.br).


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