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LUÍS NASSIF
O desastre Itamar
Em 1982, a decretação da moratória brasileira alijou o país do
mercado internacional. O isolamento foi rompido mais de dez
anos depois, em uma operação do
governo mineiro, com títulos soberanos, sem aval e sem garantia do
Tesouro Nacional.
Apesar de uma situação estruturalmente complicada, na área de
pessoal, Minas Gerais teve administrações financeiramente responsáveis, mesmo no governo populista de Newton Cardoso. Com
Hélio Garcia, todos os acordos políticos tinham que passar pelo aval
da área econômica, para não comprometer as contas públicas. E jamais o interesse de Minas foi colocado acima do interesse nacional.
Mesmo decisões que poderiam
eventualmente prejudicar o Estado eram aceitas, desde que claramente identificado o interesse nacional em jogo.
Não se menosprezam as dificuldades atuais. Mas a decisão do governador Itamar Franco de decretar unilateralmente a moratória
do Estado, sem procurar negociar,
sem procurar apresentar suas razões, prejudica o país, inviabiliza
renegociações soberanas das dívidas estaduais com a União e envergonha o Estado.
Foram quase 20 anos com o país
tentando apagar do cenário internacional a fama de caloteiro, de
povo pouco sério, não afeito a honrar seus compromissos nem a
acatar contratos. Nesse período,
grande parte dos "spreads" cobrados dos financiamentos ao Brasil
decorria dessa fama de caloteiro,
reforçada pela moratória de 1986,
que aumentou substancialmente o
risco Brasil.
Agora, o mesmo Estado que ajudou na recuperação da imagem
internacional do país torna-se instrumento de prejuízo para o país
como um todo, nas mãos de um
governador voluntarista, que pensa exclusivamente no seu interesse
político imediato, pouco se importando com as consequências para
o país
Os argumentos invocados por
Itamar para denunciar o acordo
são sofismas baratos. O primeiro
deles é que Minas negociou mal
sua dívida por aceitar taxas de juros de 7,5% ao ano, acima do IGP,
contra taxas de 6% de outros Estados. As condições de renegociação
eram as mesmas para todos os Estados, já que foram autorizadas
por uma lei específica. Estados que
pagassem à vista 20% da dívida teriam direito a 6% de juros. Como
Minas pagou 10%, a taxa de equalização foi de 7,5%. O resultado financeiro é o mesmo.
O segundo argumento é que o Estado começou a pagar agora
amortização de R$ 80 milhões por
mês, o que não ocorria antes. O Estado sempre pagou R$ 70 milhões
mensais de custo da dívida. Ocorre
que, pelas taxas de juros do mercado, o dinheiro ia integralmente
para pagar juros, não permitindo
amortização. Agora, com juros favorecidos, existe a amortização.
A situação do Estado não é fácil.
Minas gasta 95% de sua receita
corrente com a folha. Desse total,
40% equivalem à folha de aposentados. Nos últimos quatro anos,
não conseguiu reduzir o quadro de
pessoal porque não havia mecanismos de CLT, como o Baneser, de
São Paulo. Os primeiros 1.400 demitidos foram readmitidos pela
Justiça.
A atitude de Itamar prejudicou
todos os Estados que aspiravam a
uma negociação adulta com o governo federal. E prejudicou todos
os setores que questionam a consistência do programa de ajuste
fiscal, dentro de uma perspectiva
madura e racional.
Depois desse rompante, o governo não poderá sequer abrir negociações com os Estados, sob risco
de passar a imagem de derrota do
ajuste fiscal. O governo federal será obrigado a executar as garantias, deixando Minas em situação
mais delicada ainda.
O federalismo brasileiro exige
governantes responsáveis, que saibam defender soberanamente os
interesses de seus cidadãos, mas
que se comportem como pessoas
investidas da responsabilidade de
zelar pela segurança nacional. Itamar não faz uma coisa nem outra.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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