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ANÁLISE
Bush só reduzirá o déficit com mágica
EDMUND L. ANDREWS
DO "NEW YORK TIMES"
A economia está crescendo.
A arrecadação tributária está
subindo. Mas será que esses fatores bastarão para resgatar o presidente Bush de um déficit que parece destinado a se manter acima
dos US$ 400 bilhões? A resposta,
infelizmente, é quase certamente
não, dizem os analistas.
Apesar de todos os cortes anunciados ontem pelo presidente, o
total de cortes previstos para o
ano que vem não devem passar de
US$ 15 bilhões, sem grande efeito
sobre o déficit.
Até agora, as maiores porções
do Orçamento -programa de
assistência médica Medicare, Seguro Social e gastos militares-
estão imunes a cortes e seus custos devem crescer rapidamente
nos próximos anos.
Além disso, o plano de Bush para substituir parte do sistema previdenciário por contas privadas
de poupança requererão trilhões
de dólares em captação adicional
ao longo das próximas décadas.
A base da estratégia orçamentária de Bush é a crença de que um
crescimento econômico vigoroso,
estimulado por cortes de impostos -com o objetivo de estimular
os americanos mais prósperos a
produzir mais riqueza-, geraria
altas acentuadas na arrecadação
tributária, o que gradualmente reduziria o déficit.
À primeira vista, seu otimismo
talvez tivesse justificativas. Afinal,
a alta da arrecadação tributária
ajudou Washington no boom
econômico dos anos 1990, tirando
o Orçamento do vermelho. Analistas orçamentários democratas e
republicanos, porém, dizem que
esse desfecho é muito menos provável na atual situação. Os contrastes são grandes.
Ao longo da maior parte dos
anos 90, os gastos do governo
cresceram em passo de lesma.
Mas no primeiro mandato do
presidente Bush, eles dispararam
e devem continuar crescendo rapidamente à medida que a geração "baby-boom" (os nascidos
entre 1946 e 1964) passa a viver de
aposentadorias.
Nos anos 90, o maior salto na arrecadação tributária surgiu dos
contribuintes de alta renda que
realizaram imensos lucros com a
bolha das Bolsas encerrada em
2000. Mas os cortes de impostos
de Bush em 2001 e 2003 reduziram as alíquotas pagas pelos mais
ricos e cortaram à metade os impostos sobre os dividendos e ganhos de capital, o que torna praticamente impossível que a arrecadação tributária venha a crescer
em ritmo substancialmente mais
elevado que a economia.
"Não acredito que seja provável
que tenhamos uma repetição dos
anos 90", disse Douglas Holtz-Eakin, o diretor, apontado pelos republicanos, do Serviço de Orçamento do Congresso. "Não podemos resolver essa situação por
meio do crescimento."
A Casa Branca espera concentrar a atenção pública em suas
propostas de reduzir dezenas de
programas domésticos. Mas, embora muitos desses cortes devam
ser severos, seu impacto sobre o
déficit será pequeno.
No geral, Bush promete cortar
ou eliminar 150 programas do governo federal. Mas analistas republicanos que trabalham no Congresso previram na sexta-feira
que era improvável que esses cortes reduzissem o orçamento em
mais de US$ 15 bilhões. E nem
mesmo isso está garantido.
O outro lado da equação de
Bush -arrecadação tributária
mais alta resultante de um crescimento acentuado da economia-
dificilmente conseguirá cobrir a
diferença. A despeito do forte
crescimento econômico e da disparada dos lucros empresariais
no ano passado, a arrecadação tributária federal respondeu por
apenas 16,3% do PIB (Produto Interno Bruto), total comparável ao
nível dos anos 50 e muito abaixo
dos 21% atingidos durante a bolha do mercado de ações em 2000.
"O que é pouco realista é que
eles estejam tentando bancar um
governo com as demandas que
existem hoje e contando com um
fluxo de receita digno dos anos
50", disse Robert Bixby, diretor da
Concord Coalition, um grupo de
pesquisa pró-disciplina fiscal.
A arrecadação tributária cresceu muito acima do esperado durante o boom econômico e a bolha do mercado do final dos anos
90, mas os analistas dizem que há
pouca probabilidade de que isso
se repita na presente década.
Brian Riedl, analista de orçamento da Heritage Foundation,
um grupo de pesquisa conservador de Washington, estimou que
os déficits ficarão em torno dos
US$ 400 bilhões ao ano até 2009,
com as tendências atuais de gastos com o Iraque e os principais
programas de benefícios.
Para que Bush possa cumprir
sua promessa de reduzir o déficit
à metade até 2009, disse Riedl, o
presidente teria de cortar US$ 200
bilhões de programas domésticos
que agora custam menos de US$
500 bilhões ao ano. "Não há como
atingir esse objetivo cortando só
os gastos que dependem apenas
do Executivo", disse. "Seria preciso reduzir programas que garantem benefícios permanentes."
Cerca de dois terços dos US$ 2,3
trilhões do atual Orçamento se dirigem a programas de benefícios
permanentes. O Serviço Orçamentário do Congresso estima
que os custos do Medicare subirão em US$ 55 bilhões em 2005, a
US$ 380 bilhões. Os desembolsos
do Seguro Social devem subir US$
23 bilhões, a US$ 540 bilhões.
Mas Bush concentrou quase todos os seus cortes em programas
controlados pelo Executivo, que
tiveram custo total de US$ 466 bilhões no ano passado. Congelar
no nível atual os gastos com o amplo elenco de programas bancados por Washington e permitir
que eles cresçam apenas de acordo com a inflação resultaria em
corte de US$ 10 bilhões no Orçamento, de acordo com o Serviço
Orçamentário do Congresso. É
uma redução de 1% nos gastos,
numa tarefa complexa politicamente, que resultaria em economia de custos de US$ 15 bilhões.
O senador Judd Gregg, republicano e presidente do Comitê Orçamentário do Congresso, disse
que nem os cortes de gastos de
Bush nem sua esperança de forte
crescimento econômico bastariam para cobrir a diferença.
"Não se pode atingir o objetivo,
em nossa situação atual, a não ser
que cortemos programas de benefício permanente", disse. "Isso
acontece pelo mesmo motivo que
Willy Sutton usou para explicar
por que roubava bancos: é lá que
está o dinheiro."
Chad Kolton, porta-voz do Serviço de Administração e Orçamento da Casa Branca, disse que
Bush conseguirá reduzir o déficit
à metade ao longo dos próximos
cinco anos. "Temos uma estratégia dupla para reduzir o déficit à
metade, pela restrição dos gastos
governamentais e estímulos a
maior crescimento que gere
maior arrecadação", disse Kolton.
Mas, mesmo que a alta na arrecadação tributária ajude a reduzir
o déficit nos próximos cinco anos,
os cinco subseqüentes provavelmente seriam muito mais difíceis.
Bush quer tornar permanentes
os seus cortes de impostos, que
expiram em 2011. Isso custaria
US$ 1,8 trilhão ao longo dos próximos dez anos, e a maior parte
do custo recairia após 2009. Mas
Bush já não estará no cargo quando esse momento chegar.
Tradução de Paulo Migliacci
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