São Paulo, terça-feira, 08 de fevereiro de 2005

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SALTO NO ESCURO

Diretor que fez contrato com termelétrica é hoje senador pelo PT

Petrobras rejeita culpar ex-dirigente

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A diretoria da Petrobras descartou qualquer estratégia jurídica que possa significar responsabilização de ex-dirigentes por prejuízos nos contratos firmados com a americana El Paso e a brasileira MPX para a construção de termelétricas no país. O principal motivo é que o diretor de Gás e Energia na época do primeiro contrato é o atual senador Delcídio Amaral (MS), do PT.
Ele era da Diretoria de Engenharia e foi o primeiro diretor de Gás e Energia, função criada em outubro de 2000. Dali, saiu para concorrer às eleições de 2002.
Amaral participou da operação com a El Paso para a construção da usina Macaé Merchant, no Rio de Janeiro, que inspirou e serviu de parâmetro para a TermoCeará, da MPX. De propriedade do empresário Eike Batista, a MPX, agora, negocia a instalação da TermoPantanal no Estado que elegeu Amaral ao Senado.
Ontem, a Folha revelou que a Petrobras decidiu abrir um processo de arbitragem contra as empresas. Na prática, isso significa que a contenda será examinada por um tribunal composto por especialistas indicados pela estatal e as empresas, em esfera privada, distante do Judiciário. A decisão do tribunal é final, sem possibilidade de recurso.
Outra decisão tomada com aval do Planalto e comunicada ao escritório de advocacia Pinheiro Neto, de São Paulo, é que o processo de arbitragem a ser iniciado a partir desta semana contra a El Paso e a MPX tem o objetivo de renegociar os contratos, não de anulá-los. Nem governo nem Petrobras querem passar a impressão ao mercado de "rompimento de contrato".
O escritório Pinheiro Neto foi chamado para defender a Petrobras, que vai formalizar o processo de arbitragem sob a alegação de prejuízos de R$ 4,51 bilhões à estatal caso os termos originais sejam mantidos.

Apagão
Os dois contratos foram fechados durante a crise de energia elétrica, no segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso. O primeiro, com a El Paso, foi feito com base em prognósticos que indicavam escassez na oferta de energia e crescimento da demanda. O segundo, com a MPX, foi assinado quando a crise já estava passando, e o mercado, se estabilizando.
Sob a alegação da necessidade de uma resposta rápida, o governo Fernando Henrique Cardoso optou por reduzir os riscos para os investidores. Para isso, a Petrobras assinou um acordo de participação paralelo aos contratos, instituindo uma "contribuição de contingência".
Esse instrumento prevê que a Petrobras pague às empresas um valor suficiente para que sejam honrados os impostos, o custo operacional, o retorno do capital e uma margem de lucro. Como o cenário de escassez de oferta previsto em 2001 não se confirmou, o preço de mercado não cobriu a diferença. E o prejuízo sobrou para a Petrobras, que paga mensalmente cerca de US$ 20 milhões (R$ 52 milhões) para a El Paso e US$ 4,8 milhões (R$ 12,5 milhões) para a MPX.
As empresas negam irregularidade e apregoam que a estatal quer romper os contratos. Afirmam que elas assumiram o risco nas construções das usinas e responderam rapidamente à necessidade do governo de mais energia, durante um período crítico no fornecimento. Se as tendências se confirmassem, acrescentam as empresas, a Petrobras também teria lucrado, pois cabe a ela o fornecimento do gás natural como matéria-prima.

Parecer
A responsabilização de ex-dirigentes e até mesmo de ministros de Estado que aprovaram os contratos no Conselho de Administração da Petrobras foi defendida pelo advogado Eros Grau, em um parecer elaborado antes que ele assumisse o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal.
O parecer de Grau foi à gaveta, e a diretoria da Petrobras optou por centrar esforços na "contribuição de contingência" e deixou de lado as alternativas de pedir a anulação dos contratos, o retorno dos valores já pagos e a responsabilização dos ex-dirigentes.


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