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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Impotência do Banco Central?
Poucos duvidam de que a
apreciação do real foi longe
demais, com prejuízo para
o crescimento da economia
O BANCO Central é impotente
para conter a valorização do
real? A essa altura, poucos
duvidam de que a apreciação foi longe demais, com prejuízos para as
contas externas e, sobretudo, para o
crescimento da economia. A deterioração do balanço de pagamentos
em conta corrente só não é maior
porque o cenário mundial continua
ajudando e, também, porque o modesto crescimento da demanda doméstica contribui para restringir a
demanda por importações. Mas o
impacto negativo da moeda forte sobre o PIB, provocado pela desaceleração do quantum exportado e pela
substituição de produção nacional
por importações, tornou-se bastante perceptível em 2006.
Convence cada vez menos o argumento de que a apreciação ajuda a
manter a inflação dentro da meta e
permite, assim, que o BC pratique
juros menores. Esse argumento se
reduz essencialmente ao seguinte:
se o real não tivesse experimentado
a apreciação que experimentou em
2006 e nos anos anteriores, a inflação seria maior e o BC teria que ter
praticado juros reais ainda maiores
do que os que aplicou. Resumo da
opereta: o crescimento será sempre
medíocre, na faixa de 3% ou um
pouco mais. Com apreciação, via
efeito do câmbio sobre as exportações líquidas. Sem apreciação, via
efeito de juros mais altos sobre a demanda doméstica. Em qualquer hipótese, porém, a inflação ficará dentro da meta...
Nem o próprio BC aceita mais essa argumentação. Pelo menos não
totalmente. Afinal, a autoridade monetária começou a fazer pesadas
aquisições de reservas em 2006,
com o intuito não-declarado de barrar a tendência à valorização do real.
Evidentemente, ninguém acredita
na versão Mickey Mouse de que as
intervenções do BC visam apenas
acumular reservas sem nenhuma
preocupação com a taxa de câmbio.
Entretanto as reservas ultrapassaram a marca de US$ 90 bilhões e o
real voltou a subir neste início de
ano. Daí a sensação de impotência.
Mas a sensação é ilusória. O governo e o BC têm (ou podem recuperar)
os instrumentos necessários para
estabilizar o câmbio ou até promover uma certa depreciação (recomendável) do real.
Alguns instrumentos são inconvenientes ou inócuos. Por exemplo: seria inconveniente reduzir as tarifas
de importação ou outras barreiras,
mesmo que fosse possível fazê-lo de
comum acordo com os nossos parceiros no Mercosul ou de maneira
compatível com as regras do bloco.
A razão é que o Brasil e os demais
países do Mercosul estão engajados
em negociações comerciais com outros países ou blocos regionais. Nessas negociações, as tarifas constituem importante instrumento de
negociação e obtenção de contrapartidas. Seria contraproducente, e
até meio ridículo, promover uma
abertura comercial unilateral com o
intuito de impedir a tendência à valorização cambial.
Outro exemplo: seria inócuo no
curto prazo e estrategicamente inconveniente tentar alcançar esse objetivo com facilidades adicionais para a remessa de capital e aplicações
no exterior por parte de residentes
no Brasil. Inócuo porque a liberdade
já é muito ampla. Inconveniente
porque, em conjunturas mais adversas, pode voltar a ser necessário introduzir ou reforçar controles sobre
a saída de capitais de residentes.
Não se assuste, leitor, com o parágrafo anterior. Lamentavelmente,
toda discussão econômica importante está sempre contaminada pela
mistura de ideologia e interesses. No
Brasil, a turma da bufunfa e o lobby
financeiro conseguiram, com ajuda
de economistas, estigmatizar a administração cuidadosa dos fluxos de
capital e dos passivos externos do
país. Propagou-se a versão de que isso seria incompatível com o século
21, com o espírito de uma economia
de mercado, com o espírito da "globalização" e até com a liberdade do
cidadão e os direitos da pessoa humana.
Abro aqui um pequeno parêntese.
Nada tenho contra a bufunfa e os
seus detentores e adoradores. Os
que conseguem acumulá-la (dentro
da lei e dos bons costumes) têm inegavelmente os seus méritos. Desagradável é quando a bufunfa quer
pensar, escrever livros, autobiografias e artigos de jornal. Aí não há
quem agüente. Nem os parentes
próximos (sobretudo esses). Os bufunfeiros deveriam ficar rigorosamente silentes e recolhidos à atividade meritória de acumular mais
bufunfa.
Fecho o parêntese e percebo, alarmado, que o meu espaço está acabando. Ainda não respondi à pergunta do início do artigo. Só me resta
voltar ao assunto na quinta que vem.
O leitor verá, se tiver paciência, que é
perfeitamente possível conter e inverter o movimento da taxa de câmbio. Tudo depende de uma coordenação habilidosa da política de juros,
com compras de reservas e controles
seletivos sobre o mercado de câmbio
e os fluxos de capital.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 51, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional:
Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
pnbjr@attglobal.net
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