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LUÍS NASSIF
A come-quieto das cervejas
Nessa guerra das cervejas,
pouco se falou da Schincariol,
empresa do interior paulista
que surgiu nos últimos anos
conquistando fatias crescentes
do mercado nacional. No início, a concorrência atribuía o
fenômeno à suspeita de que a
empresa não pagasse impostos.
É possível, como ocorre em
quase toda empresa em início
de processo de expansão. Agora, grande, as vantagens comparativas residem na capacidade de entender o mercado.
A posição da Schincariol tem
sido cômoda nessa guerra, assistindo de longe e se permitindo criticar as duas pontas a
AmBev (associação da Antarctica com a Brahma) e a Kaiser.
A proposta da AmBev de levar
o Guaraná Antarctica para o
mundo é vista com ressalvas,
principalmente porque nos últimos anos não se investiu sequer no mercado brasileiro. O
Guaraná Antarctica chegou a
15,2% do mercado de refrigerantes e hoje possui apenas
6,3%. Mesmo antes da crise da
Antarctica, o Guaraná vinha
caindo porque é o refrigerante
mais suscetível à guerra de preços, especialmente as empreendidas pelas tubaínas. Hoje em
dia, os independentes possuem
30% do mercado brasileiro e
estão se estruturando cada vez
mais.
O fator preço ainda é determinante no mercado de cervejas. Se se colocar Schincariol
com base 100 de preço, a garrafa retornável da Brahma e Skol
vai para 127, a da Antarctica,
para 122, e a da Kaiser, para
111.
Mas o ponto central da análise da Schincariol é que, no
mercado de cerveja, as marcas
envelhecem e são substituídas.
Se não se considerar a Bavaria,
as cervejas de marca Antarctica caíram de 19,9% do mercado em outubro de 1997 para
13%. A Brahma caiu de 24,7%
para 21,3% e foi salva pela
Skol, que saltou de 22% para
27,5%. A Kaiser também caiu
nesse período, enquanto a
Schincariol cresceu de 7% para
8%. A própria Budweiser soma
45 pontos no mercado americano, mas, sem a Bud Light,
cairia para 30 pontos.
O curioso nessa batalha é que
a Kaiser -principal adversária da fusão- vem perdendo
mercado consistentemente nos
últimos anos. Está bem posicionada em São Paulo e em algumas regiões do país. Mas vem
perdendo espaço na maior parte das demais. No Nordeste, em
outubro de 1997 tinha 11% do
mercado. Hoje, caiu para
8,7%. Na Bahia, caiu de 10%
para 6,9%, enquanto a Schincariol saltava de 15,3% para
18%.
Os dados apresentados pela
Schincariol, a partir dos relatórios da Nielsen, demonstram
uma extrema volatilidade em
todos esses mercados. E essa
guerra se desenvolve em torno
da instalação de fábricas em
regiões estratégicas e de uma
boa ofensiva sobre os pontos-de-venda. Uma das razões da
baixa participação da Kaiser
no mercado deve-se ao fato de
ter abandonado a expansão
dos pontos-de-venda, nos últimos anos. E parte da queda da
Antarctica se deve à ofensiva
bem-sucedida da Brahma no
Nordeste, que sempre foi mercado cativo da ex-concorrente.
Concentração
Independentemente do voto
a ser proferido no caso AmBev,
é hora de o Cade (Conselho
Administrativo de Defesa Econômica) passar a investigar as
práticas de abuso cometidas
indistintamente por todas as
grandes cervejarias. Do leitor
Cláudio Fernandes, recebo as
seguintes informações sobre
práticas danosas à concorrência:
"a) permissão para que as
cervejarias tenham "pontos exclusivos", normalmente obtidos por meio da doação de
móveis, luminosos e produtos;
b) a integração vertical: a
produção nacional de malte e
de extrato de guaraná está nas
mãos da AmBev, o que praticamente impedirá a entrada
de novos players no mercado;
c) o fato de ser considerada
legal a "compra" de espaço nas
gôndolas dos supermercados,
que são hoje o mais importante canal de distribuição de bebidas;
Dessas práticas nem a Kaiser
está isenta e são profundamente prejudiciais ao desenvolvimento de uma indústria
de bebidas de médio e pequeno
portes, vinculada aos mercados regionais, como existe em
praticamente todos os países
desenvolvidos".
E-mail: lnassif@uol.com.br
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