São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2004

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"Default" é trunfo político do país, afirma analista

CÍNTIA CARDOSO
DE NOVA YORK

A queda-de-braço entre a Argentina e o FMI (Fundo Monetário Internacional) tem sido usada como trunfo político do governo de Néstor Kirchner.
A afirmação é de Charles Calomiris, professor da Universidade de Columbia. O economista tornou-se um desafeto do governo argentino em 2001 ao prever a moratória da Argentina em artigo do jornal "Wall Street Journal". Meses depois, o "default" ocorreu.
Com ironia, a estratégia argentina é considerada "inteligente" por Calomiris. "Criticar o FMI tem sido uma política interna muito positiva para o presidente. O FMI tem sido usado como um bode expiatório para explicar o porquê de tudo ter dado tão errado para o país." O economista completa: "É uma política muito inteligente porque, sempre que a Argentina latiu, o Departamento de Tesouro dos EUA vacilou".
Uma possível flexibilidade do FMI é, para Calomiris, reflexo da situação interna do governo americano. "A administração Bush trata a Argentina como uma criança mimada, deixando o país negociar os empréstimos incondicionalmente", diz.
Esse mimo refletiria um predomínio da política sobre a questão puramente econômica. Em um ano eleitoral, o presidente George W. Bush não se mostra disposto a criar mais rusgas. "O Departamento do Tesouro tem exercido pressão sobre o FMI para não impor condições à Argentina."
Calomiris, entretanto, diz acreditar que a possível vitória argentina sobre o Fundo está longe de ser um indício de tempos de bonança para o país.
O "abutre", como foi apelidado pelo ex-ministro da Economia Domingo Cavallo, afirmou que o crescimento da Argentina não vai durar. "No ano que vem, a história será outra. A eleição nos EUA terá acabado. Aí, o sr. Kirchner vai ter que mudar a sua política."
Uma das receitas prescritas por Calomiris é um esforço do governo para melhorar a condição de acesso ao capital externo. Mas a série de processos de credores da dívida argentina contra o país tem fechado as portas do mercado internacional. Outro problema é que boa parte do crescimento argentino tem sido apoiada no aumento dos preços das commodities.
Para Ricardo Fuente, economista da consultoria Ecolatina, a Argentina já atendeu a todas as exigências do Fundo que constavam do acordo.
Segundo ele, todas as metas monetárias e fiscais e a aprovação de certas leis e normas pelo Congresso foram cumpridas -é a mesma defesa que o governo argentino apresenta para dizer que o Fundo tem de renovar o acordo com o país.
E se houver "default? Na análise de Fuente, "a conseqüência no curto prazo é quase nenhuma, porque o país de fato está crescendo com recursos próprios, não está crescendo com fundos do exterior. O impacto negativo pode vir no médio ou longo prazo, na dificuldade de financiar certas operações".


Colaborou Carolina Vila-Nova, de Buenos Aires


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