|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Brasil vira moda, e Lula pode ser bom negócio
Flavio Florido - 11.out.02/Folha Imagem
![](../images/b0804200301.jpg) |
Operadores em pregão da Bolsa de Mercadorias & Futuros, em SP |
RICHARD LAPPER
RAYMOND COLITT
DO "FINANCIAL TIMES"
Apenas seis meses atrás temia-se de modo geral que
o Brasil, a maior economia da
América do Sul, estivesse derivando inexoravelmente em direção
aos rochedos do calote da dívida e
do colapso financeiro. Aconteceu
quase o contrário: o Brasil está na
moda em Wall Street. Corretores
e investidores que evitavam o país
no ano passado hoje estão ávidos
por comprar títulos e ações brasileiros.
Na semana passada, o risco-país
(medido pelo JP Morgan) caiu
abaixo dos mil pontos pela primeira vez em dez meses. Desde
outubro do ano passado o preço
do C-Bond (principal título da dívida pública brasileira transacionado no exterior) aumentou quase 70%, o que reduziu os rendimentos em mais de 14 pontos percentuais.
Acredita-se amplamente em
que a tendência continue, porque
os rendimentos do Brasil atraem
investidores que têm dificuldades
para obter retornos decentes nos
mercados debilitados da corrente
dominante.
Nos programas matinais na televisão brasileira, economistas
não discutem se o país poderá evitar o calote, mas se conseguirá
atingir um grau de investimento
("investment grade", um tipo de
zona de segurança) nas agências
de classificação de risco até o final
de 2004. "O novo governo teve
um começo impressionante e ganhou a batalha inicial da confiança", afirma Morris Goldstein, economista do Instituto para Economia Internacional em Washington. "Até agora ele mostrou que
os pessimistas e céticos como eu
estavam errados."
Por que isso aconteceu? Uma
rápida mudança na política do
PT, no governo, é uma das principais razões. Tendo votado em dezembro de 2001 pela "ruptura"
com o modelo econômico "neoliberal" introduzido por Fernando
Henrique Cardoso, o partido se
aproximou do centro do espectro
político em uma velocidade impressionante. Mesmo antes da
campanha para as eleições presidenciais de outubro passado, a liderança do PT tinha prometido
cumprir as obrigações da dívida e
manter as políticas necessárias a
fim de manter a inflação baixa.
Esses compromissos foram reforçados durante a crise financeira
do último verão, quando líderes
do PT perceberam que o caos financeiro inviabilizaria até o mais
modesto programa de reformas.
No final do ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
deixou claro que manteria as metas fiscais acertadas em agosto
com o Fundo Monetário Internacional. E cumpriu sua palavra.
Austeridade fiscal
Em algumas áreas o governo foi
ainda mais austero que seu antecessor, aumentando a meta do superávit fiscal primário de 3,75%
para 4,25% do Produto Interno
Bruto. O presidente do Banco
Central de Lula, Henrique Meirelles, antes do BankBoston, aumentou as taxas de juro para
combater as pressões inflacionárias desencadeadas pela desvalorização do real no ano passado.
Lula adotou grande parte da
agenda de reformas de FHC e
agora está acelerando a planejada
reforma fiscal e do sistema de
aposentadorias. "O aprendizado
foi muito rápido", diz Octavio de
Barros, principal economista brasileiro no banco espanhol BBVA.
O novo governo também herdou uma economia marcada por
várias tendências positivas. As exportações estão crescendo rapidamente, em parte devido à alta dos
preços das commodities. A constante desvalorização do real no
ano passado encareceu as importações e ajudou a tornar as exportações mais competitivas. O Brasil
deverá registrar um superávit comercial de pelo menos US$ 16 bilhões neste ano, o que ajudará a
reduzir o déficit de conta corrente
para cerca de 1% do PIB e a reforçar o real.
A inflação de 2002 -os preços
no varejo aumentaram 12,53%
(IPCA)- teve um efeito benéfico,
ao reduzir o valor das obrigações
da dívida nominais em reais e aumentar as receitas de impostos,
por isso o superávit fiscal para os
primeiros dois meses deste ano
foi maior que o esperado.
Crescimento lento
O crescimento ainda é lento.
Economistas privados esperam
uma expansão não superior a 2%
neste ano, e as taxas de juro reais
continuam ao redor de 13%. Em
consequência, o Brasil ainda enfrenta um potencial problema de
dívida. Mesmo assim, a combinação de uma moeda mais forte
com uma inflação maior reduziu
o peso da dívida. A dívida pública
líquida chegou a R$ 904 bilhões
no fim de fevereiro, ou 56,6% do
PIB, uma queda de dois pontos
percentuais desde outubro.
Goldstein continua cauteloso,
afirmando que "há muitos casos
de lua-de-mel que azedam". Mas
até ele está começando a se perguntar se haverá uma "surpresa
positiva. Talvez Lula seja um bom
negócio".
Tradução de Luiz Roberto Gonçalves
Texto Anterior: Em menos de cem dias, país faz superávit de US$ 4 bi Próximo Texto: Opinião econômica: Abono para o mínimo Índice
|