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São Paulo, terça-feira, 08 de abril de 2003

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ANÁLISE

Brasil vira moda, e Lula pode ser bom negócio

Flavio Florido - 11.out.02/Folha Imagem
Operadores em pregão da Bolsa de Mercadorias & Futuros, em SP


RICHARD LAPPER
RAYMOND COLITT
DO "FINANCIAL TIMES"

Apenas seis meses atrás temia-se de modo geral que o Brasil, a maior economia da América do Sul, estivesse derivando inexoravelmente em direção aos rochedos do calote da dívida e do colapso financeiro. Aconteceu quase o contrário: o Brasil está na moda em Wall Street. Corretores e investidores que evitavam o país no ano passado hoje estão ávidos por comprar títulos e ações brasileiros.
Na semana passada, o risco-país (medido pelo JP Morgan) caiu abaixo dos mil pontos pela primeira vez em dez meses. Desde outubro do ano passado o preço do C-Bond (principal título da dívida pública brasileira transacionado no exterior) aumentou quase 70%, o que reduziu os rendimentos em mais de 14 pontos percentuais.
Acredita-se amplamente em que a tendência continue, porque os rendimentos do Brasil atraem investidores que têm dificuldades para obter retornos decentes nos mercados debilitados da corrente dominante.
Nos programas matinais na televisão brasileira, economistas não discutem se o país poderá evitar o calote, mas se conseguirá atingir um grau de investimento ("investment grade", um tipo de zona de segurança) nas agências de classificação de risco até o final de 2004. "O novo governo teve um começo impressionante e ganhou a batalha inicial da confiança", afirma Morris Goldstein, economista do Instituto para Economia Internacional em Washington. "Até agora ele mostrou que os pessimistas e céticos como eu estavam errados."
Por que isso aconteceu? Uma rápida mudança na política do PT, no governo, é uma das principais razões. Tendo votado em dezembro de 2001 pela "ruptura" com o modelo econômico "neoliberal" introduzido por Fernando Henrique Cardoso, o partido se aproximou do centro do espectro político em uma velocidade impressionante. Mesmo antes da campanha para as eleições presidenciais de outubro passado, a liderança do PT tinha prometido cumprir as obrigações da dívida e manter as políticas necessárias a fim de manter a inflação baixa. Esses compromissos foram reforçados durante a crise financeira do último verão, quando líderes do PT perceberam que o caos financeiro inviabilizaria até o mais modesto programa de reformas. No final do ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro que manteria as metas fiscais acertadas em agosto com o Fundo Monetário Internacional. E cumpriu sua palavra.

Austeridade fiscal
Em algumas áreas o governo foi ainda mais austero que seu antecessor, aumentando a meta do superávit fiscal primário de 3,75% para 4,25% do Produto Interno Bruto. O presidente do Banco Central de Lula, Henrique Meirelles, antes do BankBoston, aumentou as taxas de juro para combater as pressões inflacionárias desencadeadas pela desvalorização do real no ano passado. Lula adotou grande parte da agenda de reformas de FHC e agora está acelerando a planejada reforma fiscal e do sistema de aposentadorias. "O aprendizado foi muito rápido", diz Octavio de Barros, principal economista brasileiro no banco espanhol BBVA.
O novo governo também herdou uma economia marcada por várias tendências positivas. As exportações estão crescendo rapidamente, em parte devido à alta dos preços das commodities. A constante desvalorização do real no ano passado encareceu as importações e ajudou a tornar as exportações mais competitivas. O Brasil deverá registrar um superávit comercial de pelo menos US$ 16 bilhões neste ano, o que ajudará a reduzir o déficit de conta corrente para cerca de 1% do PIB e a reforçar o real.
A inflação de 2002 -os preços no varejo aumentaram 12,53% (IPCA)- teve um efeito benéfico, ao reduzir o valor das obrigações da dívida nominais em reais e aumentar as receitas de impostos, por isso o superávit fiscal para os primeiros dois meses deste ano foi maior que o esperado.

Crescimento lento
O crescimento ainda é lento. Economistas privados esperam uma expansão não superior a 2% neste ano, e as taxas de juro reais continuam ao redor de 13%. Em consequência, o Brasil ainda enfrenta um potencial problema de dívida. Mesmo assim, a combinação de uma moeda mais forte com uma inflação maior reduziu o peso da dívida. A dívida pública líquida chegou a R$ 904 bilhões no fim de fevereiro, ou 56,6% do PIB, uma queda de dois pontos percentuais desde outubro.
Goldstein continua cauteloso, afirmando que "há muitos casos de lua-de-mel que azedam". Mas até ele está começando a se perguntar se haverá uma "surpresa positiva. Talvez Lula seja um bom negócio".


Tradução de Luiz Roberto Gonçalves


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