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LUÍS NASSIF
A chance do século
Em sua palestra no Fórum
da Liberdade, realizado na
PUC (Pontifícia Universidade
Católica), em Porto Alegre, o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso disse que Luiz Inácio
Lula da Silva não irá conseguir
fazer o desenvolvimento, como
ele também não conseguiu, porque é um processo que depende
de muitas variáveis, e não apenas da vontade do presidente. A
hora é de olhar para a frente. Só
que, para não perder o rumo, é
fundamental analisar o que
aconteceu lá atrás.
Algumas vezes na vida de
uma nação, poucas delas, ocorrem movimentos sociopolíticos
ou econômicos que provocam
grandes mobilizações regionais
ou sociais capazes de mudar a
história de um país. É quando
algum evento rompe a estratificação social e abre espaço para
a inclusão de grandes contingentes populacionais no mercado de consumo.
É o que ocorre hoje com a China. Houve a abertura econômica, que criou novos consumidores e chamou a atenção das
multinacionais, que fizeram investimentos, gerando mais emprego, mais consumo, mais investimento, em um círculo virtuoso que se prolongou por toda
a década.
O Brasil teve três oportunidades similares e as jogou pela janela.
A primeira foi na Abolição da
Escravatura. A falta de políticas
sociais adequadas, em vez de
consumidores, criou favelados e
um problema de falta de integração social que persiste até
hoje.
A segunda foi no período militar, por volta de 1970, quando
ocorreu o grande êxodo rural e
regional. Uma política correta
de inclusão social teria dobrado
o mercado consumidor brasileiro, impulsionado o mercado interno de forma irreversível e
permitido ao país cruzar a linha
do subdesenvolvimento. A falta
de providências, de investimentos em áreas sociais, explodiu
com o sistema educacional, com
o sistema de saúde, gerando
mais problemas sociais.
A terceira e maior oportunidade foi com o Plano Real. Ao
estancar a inflação, o Real provocou a maior inclusão econômica da história do país. Melhor
ainda: sem os grandes e traumáticos movimentos regionais,
sem traumas políticos, sem pressões adicionais sobre os serviços
públicos. Apenas milhões de
pessoas cruzando a linha da pobreza, pelo controle da superinflação, com uma conjuntura internacional extraordinariamente favorável ao investimento.
Tudo foi abortado pelo erro do
câmbio. A valorização tornou
as contas externas vulneráveis.
Para não mexer no câmbio, o
governo abortou o crescimento
com taxas de juros extraordinariamente elevadas, provocando
inversão fulminante nas decisões de investimento. Mês após
mês, a multidão de novos consumidores foi refluindo de volta
ao limbo a que estavam jogados
antes do Real. A chance do século esteve ao alcance das nossas
mãos e foi jogada fora.
Os juros criaram uma dívida
interna impagável. As fragilidades criadas passaram a exigir
políticas muito mais audaciosas, um estadista que rompesse
com a armadilha montada.
Para os próximos anos, se assistirá à economia se arrastando ano após ano, até que uma
nova crise da dívida provoque
uma monetização, um surto inflacionário rápido e fulminante,
que recrie as condições de crescimento da economia.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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