|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Governo petista admite "bagunça" sindical
Após quatro anos no poder, sindicalistas são incapazes de brecar proliferação de sindicatos, o que sempre criticaram
No ano passado, foram liberados 307 registros para novos sindicatos, quase um por dia; número é 24% maior do que o de 2005
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo Lula, comandado
por sindicalistas, não foi capaz
de modificar em quatro anos a
"bagunça" que caracteriza o
movimento sindical no Brasil.
Alvo de críticas da CUT
(Central Única dos Trabalhadores) e do PT no passado, o
sindicalismo se mantém com
regras que resultam na proliferação de entidades sem representação e de fachada, com interesses apenas no dinheiro
dos trabalhadores.
Estima-se a existência de 25
mil sindicatos (patronais e de
trabalhadores) no país, segundo informa o Ministério do
Trabalho, a partir de arquivos
da década de 30. Entre 2003 e
2006, o ministério concedeu
1.064 registros para novos sindicatos. Somente em 2006, foram 307 registros liberados,
quase um por dia -número
24% maior do que o de 2005.
Com os registros, esses sindicatos ficaram autorizados a receber parte do imposto sindical
(equivale a um dia de salário).
Em 2006, a arrecadação desse
imposto foi de R$ 1,073 bilhão.
A expansão dos sindicatos resultou numa espécie de "canibalismo" no meio sindical, segundo advogados, líderes sindicais e membros do governo.
Há 20 dias, o ministro Luiz
Marinho (então no Trabalho)
disse a uma platéia de sindicalistas do comércio: "Com essa
estrutura sindical, continuarão
ocorrendo aberrações, pois não
é preciso comprovar representatividade. Basta ter lá o registro em cartório. O ministério
nega, vem lá o juiz e manda
conceder o registro. Então, virou uma bagunça danada. Só se
muda isso com nova lei com base na representatividade."
Disputa
A disputa para representar
uma categoria profissional em
uma base territorial (município ou região) resulta em milhares de ações judiciais, em
troca de acusações entre sindicalistas e em afirmações de que
o setor responsável pela concessão de registros se transformou num "balcão de negócios".
Amadeu Roberto Garrido de
Paula, advogado que assessora
sindicatos, especialmente na
constituição dessas entidades,
sugere uma investigação do Ministério Público, uma espécie
de CPI no departamento de registros sindicais do MTE.
"O regime que existe lá é antidemocrático. O poder deles é,
na prática, maior do que o da
Justiça na liberação de registros", afirma o advogado, que
tem uma dúzia de pedidos para
abertura de sindicatos.
Desde a Constituição de 88, o
ministério está obrigado a conceder registro ao sindicato que
foi criado numa assembléia,
respeita a unicidade (uma categoria em uma região) e não sofreu pedido de impugnação por
outra entidade. Só que, em
muitos casos, há dúvidas sobre
o cumprimento das exigências.
Resultado: sindicatos acabam nascendo exclusivamente
para ocupar o espaço de outras
entidades, sem considerar os
interesses dos trabalhadores.
Há sindicatos sérios, mas estão
na casa das "centenas", reconhecem os sindicalistas.
Quatro meses após assumir o
governo, o presidente Lula admitia: "Vamos parar de brincar.
A reforma sindical é necessária
porque temos apenas 20% dos
sindicatos com representatividade. Os outros 80% atendem a
interesses." O projeto de lei de
reforma sindical -que não refletiu consenso entre trabalhadores, empresários e governo-
emperrou no Congresso.
"Continuam as facilidades
para os sindicatos que são de
interesse do governo", afirma
Luiz Carlos Prates, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos
(filiado à Conlutas), que, desde
2005 enfrenta outro sindicato
na sua base: o Sindiaeroespacial, que representa os trabalhadores em empresas de aviação (a principal é a Embraer).
Registro
"Impugnamos esse sindicato, mesmo assim o Ministério
do Trabalho concedeu o registro após dois meses do pedido."
Elias Jorge da Cruz, secretário-geral do Sindiaeroespacial
(ligado à CUT), que surgiu em
2005, informa que os trabalhadores do setor não se sentiam
representados pela categoria
metalúrgica. "Vamos devolver
aos sócios o imposto sindical
que cabe ao sindicato", afirma
Cruz. O Sindiaeroespacial já
tem 1.500 sócios.
Há inúmeros exemplos de
disputa por base de trabalhadores que se transformaram
em trocas de acusações. Em
Capivari (SP), o Sindicato dos
Comerciários (filiado à CUT)
informa que o Sindicato dos
Comerciários de Piracicaba teria surgido com base em um
documento falso -ambos disputam comerciários da região .
A denúncia foi parar na Polícia
Federal, que arquivou o caso.
O Sindicato de Piracicaba informa que, como o documento
que seria falso é de 1963, cabe à
PF a decisão sobre o caso. "Tinha 14 anos naquela época", diz
Antonio Roberto Previde, presidente do sindicato de Piracicaba (filiado à Força).
Se a reforma sindical não
sair, o país corre o risco de ter
um sindicato de categoria por
município -o que seria o limite para o setor, na avaliação de
Clemente Ganz Lúcio, diretor
técnico do Dieese. A fragmentação dos sindicatos prejudica
o trabalhador, na sua opinião,
porque ele perde força nas negociações com os patrões.
Texto Anterior: Mercado Aberto Próximo Texto: Governo vê excesso de normas sindicais Índice
|