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CONTAS VIGIADAS
Lista omite casa de cinco andares, coleção de arte e empresas
Edemar declarou ao BC ter bens que valem só R$ 3,2 mi
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Você abriria uma conta num
banco cujo dono declara ter bens
que valem R$ 3,17 milhões? Cerca
de 600 empresas, fundos de pensão, prefeituras e investidores fizeram isso. O banqueiro Edemar
Cid Ferreira, dono do Banco Santos, apresentou uma declaração
de bens ao Banco Central com
itens que atingem esse valor.
A declaração do banqueiro, que
tramita em segredo de Justiça, foi
obtida pela Folha. O documento
foi apresentado à comissão de inquérito do BC que apura de quem
foi a responsabilidade pela quebra do Banco Santos.
Sem casa nem coleção
Nenhuma das extravagâncias
pelas quais o banqueiro ficou conhecido, como a casa de 4.100 m2
e a coleção que contempla artistas
contemporâneos, múmia egípcia
e placa fúnebre maia, constam da
declaração. Os bens mais valiosos
do banqueiro estão em nome de
"offshores", empresas abertas em
paraísos fiscais para ficarem fora
do alcance da Justiça brasileira.
O bem mais valioso de Edemar
que está na lista é um lote de 29,68
mil ações preferenciais da Tele
Norte Leste Participações, a holding da Telemar. Vale R$ 1,58 milhão. Isso porque os mais de 25
milhões de ações que o banqueiro
tem da Procid Participações, a
controladora do banco, viraram
pó na última quarta-feira, com a
liquidação da instituição. O banco
de Edemar deixou um rombo de
R$ 2,24 bilhões.
A estimativa feita pela Folha
contabiliza só os bens para os
quais é possível atribuir um valor
preciso. As empresas de Edemar
não entraram na conta porque a
bancarrota do Banco Santos afetou o valor dos outros negócios
do banqueiro numa escala difícil
de ser mensurada.
A lista de Edemar não traz nenhuma das "offshores". O decreto-lei 1.060, de 1969, determina
que empresas e investimentos no
exterior devem constar das declarações de bens.
Só uma das "offshores" que
Edemar reconheceu ser dele, a Alsace-Lorraine, levantou US$ 224,6
milhões, segundo o próprio banqueiro. O valor, correspondente a
R$ 552,4 milhões, é 173 vezes
maior do que os bens declarados
ao BC. Documentos revelados pela Folha em março último mostram que Edemar operava com 40
"offshores".
Vistos pelo ângulo imobiliário,
os bens declarados por Edemar
parecem pertencer a alguém de
classe média. Em vez da casa de
cinco andares no Morumbi, na
zona sul de São Paulo, que consumiu pelo menos R$ 50 milhões na
construção, o banqueiro declara-se dono de um apartamento de
dois dormitórios com cerca de
150 metros quadrados num bairro de classe média, a Pompéia, na
zona oeste paulistana. O único
imóvel de que Edemar diz ser dono na cidade de São Paulo vale R$
152.139,45, de acordo com a lista.
Aparecem na relação duas áreas
em Juquiá, município no sul do
Estado de São Paulo: uma com 16
hectares (avaliada em R$ 76,3 mil)
e outra de 15 hectares (R$ 111 mil).
O inquérito
A declaração de bens de Edemar
faz parte de um inquérito aberto
pelo BC para apurar as causas da
bancarrota do Banco Santos e as
responsabilidades dos diretores.
Dos 26 diretores e ex-diretores do
banco nos últimos cinco anos, 19
aceitaram enviar suas listas de
bens sem que existisse uma ordem judicial para isso.
Sete diretores, no entanto, consideram que o pedido do BC viola
o sigilo fiscal e, por isso, não revelaram seus bens. A Receita Federal também se recusou a entregar
as declarações dos diretores, e a
decisão foi considerada correta
pela juíza Luciana da Costa
Aguiar Alves Henrique, da 17ª Vara Federal em São Paulo.
Apesar dos dados sigilosos que
contêm, os desdobramentos do
inquérito tramitaram sem segredo de Justiça entre o final de novembro de 2004 e o início de abril.
Edemar faz parte do time que
entregou a declaração ao BC. A
lista de bens do banqueiro é exígua por uma simples razão: a
grande maioria dos seus bens está
em nome de empresas que são
controladas por "offshores". Empresas em paraísos fiscais são usadas por quem quer manter seus
bens fora do alcance da Justiça.
A casa no Morumbi está em nome de uma empresa chamada
Atalanta, que tem como sócios a
mulher e a irmã do banqueiro
(Marcia e Edna Ferreira de Souza
e Silva), mas é controlada pela
Blueshell Inc., empresa nas Ilhas
Virgens Britânicas. A coleção de
arte é da Cid Ferreira Collection,
uma sociedade entre a mulher do
banqueiro, um dos filhos do casal
(Eduardo) e a Wailea Corp., também nas Ilhas Virgens Britânicas.
A Justiça, no entanto, tem ignorado o fato de esses bens serem
controlados por "offshores". O
juiz Fausto Martins de Sanctis, da
6ª Vara Federal Criminal em São
Paulo, decidiu, em março deste
ano, seqüestrar a coleção e a casa
do banqueiro por considerar que
há indícios de que a gestão de
Edemar no banco foi fraudulenta.
Outro lado
O advogado de Edemar, Sergio
Bermudes, disse não estar habilitado para comentar valores dos
negócios do seu cliente.
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