São Paulo, domingo, 08 de julho de 2001

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CRISE DO DÓLAR

Maioria dos economistas ouvidos pela Folha diz que o Banco Central erra estratégia para conter alta do dólar

Analistas pedem choque agressivo de juros

ISABEL CLEMENTE
PEDRO SOARES


DA SUCURSAL DO RIO

Falta agressividade ao BC (Banco Central). De oito economistas ouvidos pela Folha, sete não vêem outra saída contra o dólar a não ser um choque de juros.
O economista Renê Garcia, consultor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e ex-diretor da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), chega a defender a repetição da "fórmula 99", quando o governo aumentou os juros e recorreu a empréstimos externos para acalmar os investidores.
"Há momentos em que a economia precisa de um governo-xerife, daqueles que chegam ao bar e mostram suas armas. A fórmula de 99 pode ser repetida. O mercado está querendo isso, até porque tudo indica que a Argentina está saindo de um drama para entrar numa tragédia", afirmou Garcia.
Os juros precisam responder mais rapidamente, defende Garcia, para quem o Copom (Comitê de Política Monetária) tem de agir independentemente das reuniões previamente marcadas.
O ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas é mais enfático. Acha que a maior liberdade do BC deveria ser traduzida em mexidas diárias na Selic [taxa de juros básica da economia". "Se o BC começar a sinalizar os juros diariamente, o que eu acho que é o mais importante hoje, e tirar o viés de baixa da taxa, como fez na crise da Ásia, ele erra menos", disse.
Para ele, o BC, ao elevar os juros para 18,25% na última reunião do Copom, "achou que os juros estavam no lugar certo, mas não estavam". "Tanto é que o dólar começou a subir. E vender dólar ou papel cambial com juros no lugar errado só queima reservas e aumenta a dívida cambial de curto prazo." A saída imediata, continua, é o BC subir os juros de forma mais drástica, o que garantiria intervenções esporádicas e bem-sucedidas no mercado.
O ex-diretor do BC enxerga uma "sucessão de erros", que começou com a sinalização do viés de baixa anunciado junto com a alta de juros, num momento desfavorável. "O viés de baixa amarrou o BC." O segundo erro da autoridade monetária foi vender LTNs (Letras do Tesouro Nacional) a 22%. "Se o BC queria ser consistente com os juros de 18,25%, não venderia o papel prefixado a 22% [de juros"."
Outro economista da FGV, Lauro Vieira de Faria, concorda que houve um erro de estratégia do BC de privilegiar a venda de dólares e de títulos cambiais em detrimento de juros mais altos.
"Foi uma estratégia errada porque o mercado se utilizou dos títulos para comprar dólar mais barato e se financiar com taxas de juros camaradas", disse. Faria considerou o anúncio de US$ 6 bilhões em intervenções "estranhíssimo". "Não se sabe mais qual é a política cambial do país."
O economista da FGV faz coro aos que acham que o BC abusou das intervenções no mercado. "O sistema tem que funcionar via juros, com intervenções esporádicas. E aumento de 0,5 ponto percentual nos juros num país como o nosso é praticamente nada."
Nem todos os especialistas, no entanto, concordam que o BC abusou das intervenções. O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, por exemplo, defende uma atuação mais frequente no mercado. Para tanto, considera válida inclusive uma nova negociação com o FMI, para a obtenção de recursos que garantam mais munição.

Choque, mas não tanto
Para o economista Raul Velloso, um "choque de juros" poderia conter o dólar, mas refuta a idéia de elevar a taxa para 45%, como logo após a crise do real, no início de 1999. Para Velloso, subir os juros é parte da solução, pois atrai investimentos do exterior, irriga o mercado de dólares, fazendo a cotação cair. "Também torna mais caras as aventuras no mercado", diz, referindo-se a movimentos especulativos. José Márcio Camargo, da PUC-Rio, diz mais: para manter a alta dos juros dentro da meta, a alta dos juros "certamente não será desprezível".
Questionado se cinco pontos percentuais a mais na taxa seriam suficientes para conter a fúria do mercado, Camargo disse ser exatamente o que ele espera.
Para Camargo, a crise argentina e o racionamento de energia estão mexendo com as expectativas do mercado, que passou a buscar cada vez mais proteção cambial. A munição anunciada de US$ 6 bilhões para intervir no mercado foi um erro do BC, diz. "Acho que o BC se colocou numa camisa de força desnecessária."
Para o economista Eustáquio Reis, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a taxa de câmbio está fora do ponto de equilíbrio, que, na sua avaliação, é de R$ 2,15 a R$ 2,20. Portanto, há espaço para "um movimento mais agressivo de juros".
Ele ressalva, entretanto, que há uma tendência recessiva se desenhando à frente, o que pode inibir o uso desse instrumento (juros).



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