|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Desempregados rurais saqueiam caminhões em AL
Na entressafra, 100 mil ficam sem emprego na zona da mata canavieira; governo de Pernambuco cria ajuda emergencial
"Seis meses só na base da macaxeira e do fubá não dá", diz trabalhador; alguns jogam terra em buracos da estrada para obter trocados
DA ENVIADA ESPECIAL A
PERNAMBUCO E ALAGOAS
A entressafra da cana-de-açúcar no Nordeste, que vai de
março a setembro, significa desemprego e ameaça de fome para 100 mil trabalhadores rurais
de Pernambuco e de Alagoas.
Sem alternativa de emprego
na região da monocultura canavieira, eles saqueiam caminhões que transportam comida
na BR-101.
No dia 28 de junho, a reportagem da Folha presenciou
uma tentativa de saque em Alagoas. Por volta do meio-dia, um
grupo obstruiu a pista com galhos de árvores e pneus em
chamas. A fumaça tirou a visão
dos motoristas, forçando-os a
reduzir a velocidade. Cerca de
20 homens, com os rostos cobertos e pedras nas mãos, barraram o carro da reportagem
para obrigar os caminhões que
vinham atrás a parar.
A Polícia Rodoviária Federou chegou, de armas em punho, e o grupo correu para dentro dos canaviais. O fato aconteceu no município de Messias,
a poucos metros da antiga usina Bititinga, hoje desativada.
Os saques na BR-101 se tornaram rotineiros. As usinas
atribuem os atentados a integrantes de movimentos de
sem-terra, mas entre os acampados há trabalhadores rurais
do corte da cana. Em frente à
usina Bititinga, há um acampamento do Movimento Terra
Trabalho e Liberdade e vilas de
casas de ex-empregados que
continuam morando no local.
"O povo passa muita necessidade por aqui na entressafra.
Seis meses só na base da macaxeira [mandioca] e do fubá não
dá para agüentar. Se a usina estivesse funcionando, haveria
emprego", afirma Edson Barbosa Farias, 32, pai de quatro
filhos, que acompanhou à distância a tentativa de saque. Segundo ele, era a segunda tentativa de saque no dia. Na semana anterior, uma carga de margarina foi roubada no local.
Para receber uns trocados
dos caminheiros, trabalhadores desempregados jogam terra
em buracos da BR-101.
Chapéu de Palha
O governo de Pernambuco
relançou, no mês passado, o
programa Chapéu de Palha para assegurar R$ 190 por mês a
20 mil famílias de trabalhadores rurais em 52 municípios.
O quadro só não é mais dramático porque, a cada dois
anos, os demitidos podem se
habilitar ao seguro-desemprego. No ano em que recebem o
benefício, os trabalhadores
permanecem na região. No outro ano, viajam para cortar cana
em outros Estados.
O alagoano José Cláudio dos
Santos, 42, cinco filhos, vive
nessa gangorra. Nessa época,
no ano passado, estava em
Campos dos Goytacazes (RJ),
trabalhando com contrato
temporário. Neste ano, como
está recebendo o seguro-desemprego, trabalha "clandestino", sem carteira assinada, nos
canaviais de Alagoas.
Pobreza
O governador de Alagoas,
Teotônio Vilela Filho, diz que o
Estado tem a terceira maior taxa de mortalidade infantil e
metade da população vive abaixo da linha de pobreza.
"Certamente a cultura da cana contribuiu para essa situação, mas sem ela a situação seria muito pior. Onde a usina fecha, sabe o que entra? O capim
para a produção de gado, que
emprega apenas um vigésimo",
afirma Vilela Filho.
(ELVIRA LOBATO)
Texto Anterior: Rubens Ricupero: Corrupção e barbárie Próximo Texto: Sem trabalho durante a entressafra da cana, famílias não têm o que comer Índice
|