São Paulo, domingo, 08 de agosto de 2004

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RETOMADA

Apesar de apoio a Lula, empresário diz temer alta dos juros e da meta de superávit; para ele, "tempestade ainda está por aí"

Onda de otimismo traz riscos, afirma Staub

GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

O empresário Eugênio Staub, 61, presidente da Gradiente, uma das maiores empresas do setor eletroeletrônico no Brasil, enxerga riscos bastante grandes de o atual momento de otimismo na economia acabar se transformando num grande problema para o país no futuro. "Quando as coisas estão mal, existem riscos para a economia, mas quando estão bem, os riscos são ainda maiores", diz Staub.
Para ele, o primeiro grande risco do país é o de o governo achar que tudo está resolvido e cruzar os braços. Staub acha que há ainda muito a ser feito para a consolidação do crescimento. "O furacão apenas passou. A tempestade ainda está por aí", diz o empresário.
Eleitor de primeira hora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e do conselho de administração do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Staub diz ainda que vê dois grandes riscos para a economia que podem se tornar uma grande ameaça para a continuação do processo de crescimento da economia.
O primeiro risco seria o de o governo promover um novo aumento de juros para combater a ameaça da volta da inflação. A seu ver, o Brasil deveria até mesmo reduzir os juros.
O segundo risco seria, para Staub, o de o governo aumentar a meta de superávit primário de 4,25% do PIB para 4,5% do PIB se decidir não renovar o acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional). "O Brasil não precisa dar esse tipo de prova ou posar de mais realista do que o rei", diz Staub.
Para o empresário, o Brasil precisa começar a trabalhar numa agenda do desenvolvimento para promover o crescimento sustentável da economia.
A seguir, a entrevista:

 

Folha - O sr. acha que se justifica tanto otimismo na economia?
Eugênio Staub
- De fato, hoje, há motivos para o otimismo. Nós estamos muito mais aliviados. Só neste ano foi criado 1,2 milhão de empregos formais, e a economia está mostrando sinais de crescimento, mas isso não significa que tudo está resolvido. Ainda há muita coisa a ser feita. Quando as coisas estão mal existem riscos para a economia, mas quando estão bem os riscos são ainda maiores. Isso é verdade inclusive na vida empresarial. Os problemas acontecem exatamente quando você baixa a guarda. São esses riscos na administração da economia que precisam ser evitados.

Folha - Quais seriam esses riscos?
Staub
- São três grandes riscos. O primeiro grande risco é o de achar que tudo deu certo e que não é preciso fazer mais nada. Nós já vivemos essa experiência logo depois do Plano Real, quando o país vivia uma tremenda euforia e se achava que o mercado ia resolver tudo. E fomos surpreendidos por uma sucessão de crises. Para mim, esse sentimento de que não é preciso fazer mais nada é um grande risco para a economia.

Folha - Quais seriam os outros riscos?
Staub
- Um grande temor que tenho, por exemplo, é o fato de certos setores industriais estarem com sua produção batendo no teto e isso ser utilizado para aumento dos juros. Já se ouve falar principalmente no meio financeiro que alguns setores industriais estão no limite da capacidade e que isso irá provocar aumento de preços, como aconteceu com o aço. Para combater essa inflação, o governo seria inevitavelmente obrigado a aumentar os juros. No setor financeiro existe essa expectativa. Seria uma barbaridade para a continuidade do crescimento se o Banco Central tomasse essa iniciativa.

Folha - Mas não há ameaça de alta da inflação com a indústria no limite de sua capacidade?
Staub
- Pode até ter um mês com inflação mais alta, mas não a ponto de precipitar um novo aumento de juros. Neste mês, por exemplo, a inflação até caiu. A meu ver, acho até que dá para baixar os juros. O governo precisa baixar os juros reais da economia.

Folha - Qual seria o terceiro risco?
Staub
- O terceiro risco, a meu ver, é de o Brasil não renovar o acordo com o FMI e as nossas autoridades econômicas quererem dar uma demonstração de que são mais rígidos do que o Fundo. Ou seja, decidirem aumentar a meta de superávit primários dos atuais 4,25% do PIB para algo como 4,5% do PIB. O Brasil não precisa dar esse tipo de prova e posar de mais realista do que o rei.

Folha - O sr. seria a favor de o Brasil renovar o acordo com o FMI?
Staub
- Não acho necessário. Se renovar, terá de ser feito em condições mais favoráveis para o país. De qualquer forma, o que me preocupa é o risco de o Brasil querer andar mais na linha do que o necessário caso não renove o acordo com o FMI. O Brasil não tem necessidade de agir como o sujeito que sai da cadeia depois de cumprir sua pena. O país não precisa andar mais na linha do que qualquer outro.

Folha - O que o Brasil precisa fazer?
Staub
- Tem tudo a ser feito. É necessário voltar a pensar numa agenda de desenvolvimento econômico. É preciso também trabalhar no detalhamento da política industrial cujas linhas gerais foram anunciadas há pouco tempo, mas ainda não saíram do papel. Há necessidade de o Brasil dar prioridade à redução da vulnerabilidade externa até atingir o nível de grau de investimento ("investment grade") pelas agências de "rating" (significa baixo risco ao se investir no país). Há necessidade também de promover o investimento produtivo, além é claro de baixar os juros.
Todos os problemas nacionais estão aí para serem enfrentados. O furacão apenas passou. A tempestade ainda está por aí.


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