São Paulo, quarta-feira, 08 de setembro de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

Um pacote para os serviços

ABRAM SZAJMAN

O governo federal editou o chamado "pacote de bondades", com medidas destinadas ao estímulo econômico. Apesar de serem atitudes louváveis e bem-vindas, deixaram a sensação de que foram concebidas com o olhar voltado para o espelho retrovisor: seu foco não está no presente ou no futuro da economia, mas no passado. Mais exatamente na década de 1970, quando o setor dinâmico da economia era a indústria.
Ao direcionar quase que exclusivamente para o setor industrial a redução de tributos, assim como novas linhas de crédito e o incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico, o governo parece ignorar que, durante a década de 90, de acordo com o IBGE, 6 milhões de empregos foram transferidos da indústria para o setor de serviços.
A cidade de São Paulo é emblemática dessa transformação, que gradualmente vai consolidando o setor terciário como força propulsora da economia. Em 2003, do total de investimentos privados realizados na cidade, 84% contemplaram o setor de serviços, enquanto apenas 10% se dirigiram para a indústria.
Quando se desloca o objeto da análise da cidade para o Estado de São Paulo, o quadro muda radicalmente: a indústria sai na frente, com 64% do total de investimentos, e os serviços ficam com 33%.
Como no passado, quando se converteu de metrópole do café em centro industrial, São Paulo continua a puxar o Estado e a indicar-lhe o caminho -hoje é a capital financeira da América Latina e a cidade mais rica do país.
Mas houve um intervalo de pelo menos dez anos -a chamada década perdida dos anos 80- em que São Paulo perde a vocação industrial e vaga sem rumo, até conseguir recuperar no setor de serviços o eixo de seu dinamismo.
Processo semelhante ocorre em outras grandes cidades brasileiras e assinala as amarguras de uma transição sem planejamento. Não me refiro a um planejamento do tipo soviético, nem mesmo ao PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), que privilegiou a indústria durante o regime militar, mas ao planejamento inteligente e sensível que esteve presente em todas as experiências capitalistas de sucesso na segunda metade do século 20.
Ninguém ignora, por exemplo, que, na base do êxito de economias do Sudeste Asiático, como a da Coréia do Sul, esteve uma revolução educacional que não foi fruto do acaso, e sim de planejamento.
Veja-se, nos Estados Unidos, o caso da Flórida, que recebeu 30 milhões de visitantes estrangeiros em 2003. Alguém se lembra de que a menos de meio século a Flórida era um pântano, quando lá se começou a investir e se criaram incentivos de maneira planejada?
Paris recebe de 50 milhões a 60 milhões de turistas estrangeiros por ano, enquanto para o Brasil inteiro vieram menos do que 3 milhões de visitantes em 2003. Está certo que a capital da França fica no centro da Europa, mas mesmo assim é difícil de engolir que uma única cidade atraia 20 vezes mais turistas que 8.000 quilômetros de praias.
Salta aos olhos que, entre nós, estão faltando políticas públicas que multipliquem o emprego nas áreas em que ele mais facilmente pode ser gerado, como é o caso do turismo. Essas políticas podem e devem ser de caráter macro, como a infra-estrutura rodoviária e aeroportuária, mas não só. Há providências simples que cada cidade pode adotar, como reduzir o IPTU de quem melhora a calçada ou a fachada do imóvel e aumentar o tributo, ao contrário, para quem facilita a deterioração dos logradouros públicos.
Em resumo, o pacote que está faltando é aquele que melhore o ambiente microeconômico para atrair investimentos básicos em infra-estrutura e proporcione, ao mesmo tempo, a criação de linhas específicas de crédito para investimentos planejados em setores determinados, como gastronomia, moda e atividades culturais e de lazer.
Também seria bom incluir nesse pacote a criação do Poupatempo do Empresário, conforme proposto pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo, para reduzir o absurdo tempo (até 155 dias) que se leva para abrir ou fechar uma empresa.
Finalmente, mas não em último lugar, é preciso tirar a cunha fiscal da garganta do empresário do setor de serviços, que nos últimos anos só ganhou aumento de carga tributária como recompensa pelos empregos que criou.


Abram Szajman, 65, é presidente da Fecomercio SP (Federação do Comércio do Estado de São Paulo).

Hoje, excepcionalmente, a coluna de Antonio Barros de Castro não é publicada.


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