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OPINIÃO ECONÔMICA
Mais uma vez, os planos de saúde
ANTONIO PENTEADO MENDONÇA
Finalmente, depois de discussões de todos os tipos, carregadas
com fortes doses de demagogia e
desconhecimento do assunto, parece que o governo está conseguindo racionalizar o tema planos de saúde privados.
Num país com a saúde oficial falida e sem condições de preencher
as necessidades da população,
tanto que basta ligar a televisão
para ver o estado deplorável em
que se encontram milhares de leitos da rede pública, os planos de
saúde privados há muito deixaram de ser um produto complementar para se transformar no arrimo de mais de 40 milhões de segurados que hoje se beneficiam
da sua eficiência.
A imensa maioria está coberta
por planos empresariais, com coberturas mais abrangentes e com
restrições muito menores do que
as oferecidas pelos planos individuais. E é aí que mora o perigo.
Em nome da defesa dos segurados dos planos individuais, o governo corre o risco de comprometer o atendimento de milhões
de brasileiros protegidos pelos
planos empresariais.
É evidente que os planos individuais precisam de regras claras e
que seus titulares merecem toda a
proteção do Estado. Todavia,
num discurso emotivo, pretender
dar a eles as mesmas vantagens e
condições oferecidas pelos planos
coletivos é impossível. E na base
desse raciocínio está uma regra
simples, que pode ser formulada
com uma pergunta: "Você pode
pagar quanto custa?".
É só alguém andar por um
shopping center e ver os preços
para ter a resposta. Dois jeans, fabricados com brim azul, não custam obrigatoriamente a mesma
coisa, e só uma minoria pode ter o
mais caro.
Em saúde essa regra atinge seu
limite máximo. É por isso que nos
países europeus, onde, ao contrário daqui, a prevenção é a base da
saúde pública, os governos se responsabilizam também por uma
série de terapias impossíveis de
ser garantidas pela iniciativa privada.
Na semana passada, depois de
meses insistindo, sem nenhum
amparo legal, em que os segurados deveriam obrigatoriamente
migrar para planos com as novas
regras, o governo caiu em si e deu
marcha a ré, submetendo-se ao
princípio básico que norteia os regimes democráticos, que é o respeito à lei. Por conta disso, já não
é mais obrigatória a adaptação
dos planos antigos às novas regras.
É a volta do bom senso, mas
ainda é insuficiente para anular as
outras ameaças muito mais sérias
que pairam sobre a população.
Em primeiro lugar, não há como se pretender obrigar que os
preços dos planos novos sejam
iguais aos preços dos planos antigos. Na medida em que os novos
produtos devem contemplar coberturas mais abrangentes, que
não eram obrigatórias nos contratos antigos, é evidente que o
seu preço tem que ser mais alto.
Se fosse diferente, seria o mesmo
que obrigar o preço de uma dúzia
de bananas e meia dúzia de jacas
ser o mesmo que o de cinco laranjas, e isso não é possível, ainda
mais quando as diferenças envolvem acrescer transplantes de órgãos em planos que cobriam gesso e analgésicos.
Assim, é indispensável que se
pare de dizer que os novos planos
custarão a mesma coisa que os
antigos porque isso não é verdade. Os aumentos são procedentes,
e o máximo que seria possível dizer é que os procedimentos já cobertos não terão aumentos. Pretender incluir as novas coberturas
de graça é, no mínimo, falta de visão, uma vez que a sua consequência prática tem sido a redução do número de novos planos
oferecidos à população.
Em segundo lugar, e mais grave,
porque colocam em risco a própria estrutura da saúde pública, as
novas regras ameaçam acabar
com os planos gerenciados pelos
pequenos hospitais de cidades do
interior e periferias das grandes
cidades.
Ao exigir que passem a dar coberturas altamente sofisticadas, a
lei os impede de continuar existindo, porque eles não têm condições de fazê-lo, e a única solução
para o problema, que seria a contratação de outros operadores
mais sofisticados para suprir as
novas exigências, está fora de
questão, justamente em virtude
do aumento de preço que ela
acarretaria.
É indispensável que o governo
se convença de que esses planos
atendem -e bem- mais de 80%
dos eventos que afetam a saúde de
seus segurados e que querer obrigá-los a dar os 20% restantes é
desmontar algo que funciona,
sem oferecer a competente contrapartida.
A entrada em vigor da obrigatoriedade dos planos referenciais
em dezembro próximo decretará
automaticamente a quebra dos
planos menores e a migração de
seus segurados para as filas do
SUS.
Recentemente escutei de um
dos grandes especialistas em saúde pública brasileira que: "Se o
país destinasse US$ 100 bilhões
por ano para a saúde, estaria destinando a mesma coisa que a
França, só que o brasileiro, em razão do tamanho da população, estaria recebendo um terço do que
recebe o francês". Ora, se nem em
seus sonhos mais otimistas o ministro José Serra imagina valores
dessa ordem, seria de muito bom
senso o governo rever a obrigatoriedade dos planos referenciaisconforme desenhados e assim
continuar recebendo a ajuda da
iniciativa privada num campo em
que ele tem sido incompetente
para atuar sozinho.
Antonio Penteado Mendonça, 47, é consultor de seguros e diretor do Centro do Comércio do Estado de São Paulo. E-mail:
pentmend@penteadomendonça.com.br
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