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OPINIÃO ECONÔMICA
China, a quadratura do círculo
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Neste início do último trimestre do ano, os olhos do
mundo econômico e financeiro
voltam-se para a China. Será no
país de Mao, mais que nos EUA,
que será construído o cenário econômico do próximo ano. A continuidade de seu extraordinário
crescimento garantirá a manutenção do cenário benigno deste
ano, quando o PIB mundial crescerá mais de 5%; se ocorrerem
problemas mais sérios, como a explosão da bolha no mercado imobiliário, o resto do mundo vai enfrentar dificuldades para manter
o ritmo atual da atividade econômica.
Não vejo muito risco da ocorrência do segundo cenário ao longo de 2005. A história nos ensina
que a realidade de grandes desastres econômicos é muito menor
do que o número de previsões que
se fazem sobre essas situações extremas. As economias de mercado
têm sido capazes, ao longo do
tempo, de superar situações de
desequilíbrios que são geradas
por sua própria natureza instável. Isso ocorreu, por exemplo, na
década de 80 do século passado,
quando se previa um colapso da
economia americana sob o peso
da produtividade da indústria japonesa. A revolução gerada pela
tecnologia de informação (TI)
resgatou o dinamismo da maior
economia do mundo e deixou os
terroristas em situação delicada.
Hoje, vivemos um desequilíbrio
macroeconômico muito sério no
mundo global em que vivemos.
Os "déficits gêmeos" nos Estados
Unidos, gerados por uma situação estrutural de consumo maior
do que poupança, e sua contrapartida no mundo asiático e na
Europa, excesso de poupança sobre consumo, criaram uma situação grave de instabilidade de longo prazo. Qualquer economista
sensato sabe que a manutenção
desse quadro vai gerar, em algum
momento no futuro, uma crise financeira e econômica de proporções gigantescas.
Mas nos dias de hoje esse confronto com o fundamento econômico vem sendo evitado por um
arranjo de natureza financeira de
grande sofisticação. Os países
com poupança em excesso estão
financiando os países deficitários
via mercados de câmbio e de crédito. Com isso, os juros americanos são mais baixos do que seu
nível de equilíbrio, e o dólar consegue manter sua credibilidade
nos mercados de câmbio. E "la
nave va".
Mas, para que esse arranjo de
curto prazo continue, é necessário
que a economia chinesa continue
em rota de crescimento. E aqui é
que mora o perigo. Os sucessores
de Deng Xiaoping, agora representados por uma nova geração
de burocratas, estão tentando
uma verdadeira quadratura do
círculo, ao manter um câmbio fixo desvalorizado e juros reais negativos. O resultado dessa combinação explosiva tem sido um nível de investimento especulativo
-principalmente no mercado
imobiliário das grandes cidades
da costa- e perigoso, além de um
aumento da inflação.
As medidas administrativas,
para tentar conter o superaquecimento da economia, não estão
funcionando de maneira eficiente
e tendem a perder sua eficiência à
medida que o tempo passa. Existe
uma grande resistência na cúpula
do governo para que as autoridades econômicas usem os instrumentos tradicionais, juros e valorização cambial, a fim de lidar
com essa situação. É possível que,
ao longo de 2005, a situação atual
seja mantida sob controle, mas os
riscos de um colapso não são pequenos.
O crescimento da economia chinesa é um dos grandes responsáveis pela alta continuada dos preços do petróleo. Mantidos os preços atuais, a probabilidade de
uma redução do crescimento econômico nos EUA é real. São mais
de US$ 60 bilhões anuais de gastos extraordinários dos consumidores americanos e que são retirados do consumo. Também os
países da Ásia e Europa estão começando a sentir o peso do petróleo a mais de US$ 50 o barril. No
cenário mais otimista, o qual considero -com os dados de hoje-
o mais provável, o crescimento da
economia mundial, em 2005, deverá ser um ponto percentual menor do que o verificado neste ano.
Sem o "hard landing" chinês, o
Brasil deve ter em 2005 mais um
ano de céu de brigadeiro. As primeiras estimativas para o crescimento de nosso PIB apontam para algo como 3% ou um pouco
mais, consolidando o processo de
recuperação de nossa economia.
Devemos, portanto, rezar para
que os burocratas do Partido Comunista Chinês consigam realizar essa difícil tarefa que é conseguir a quadratura do círculo!
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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