São Paulo, domingo, 8 de novembro de 1998

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ESTRATÉGIA
Temor cria oportunidades
Crise inibe empréstimo dos bancos

da Reportagem Local

O momento em que a maioria dos bancos retrai a oferta de crédito por medo da inadimplência cria o ambiente ideal para uma ofensiva nessa área.
É o que pensa o presidente do Bradesco, que acredita ser possível ganhar mercado oferecendo crédito quando outros não o fazem. "Isso nos permite a construção de uma base maior. Quando a economia começar a crescer novamente estaremos melhor preparados", diz Lázaro Brandão.
O banco procurou expandir sua área de crédito pelas próprias pernas, mas a compra do BCN, em dezembro de 97 -após o crash- foi um passo complementar.
O grupo ampliou em 30% sua carteira de crédito de um ano para outro, atingindo US$ 17,5 bilhões em setembro passado, segundo dados da consultoria financeira Austin Asis.
"Crescemos e teríamos crescido mais em crédito se não fosse o momento da economia, que exige maior cuidado por causa da inadimplência", diz Brandão.
Caminhando no sentido oposto, o Itaú reduziu sua carteira de crédito de US$ 9,8 bilhões para US$ 9,2 bilhões.
"Quando decidimos reduzir o crédito, após a crise asiática de 97, estávamos olhando para a frente. Sempre que os juros sobem, acontecem perdas também lá na frente", diz Roberto Setubal, do Itaú.
A ofensiva do banco das famílias Vilela e Setubal aconteceu em outro campo. A carteira de títulos públicos cresceu muito e a receita vinda dessa área avançou 172% de setembro de 97 a setembro de 98, atingindo US$ 2,45 bilhões.
Essa foi, segundo os executivos do Itaú, a principal razão para que o lucro do banco crescesse 12%.
A maioria dos bancos brasileiros tem seguido essa mesma receita, como imaginava o próprio Bradesco ao traçar seus objetivos.
De acordo com levantamento da Austin com 200 instituições brasileiras, enquanto os ganhos da área de crédito cresceram apenas 2,4% de junho de 97 para junho de 98, atingindo US$ 25,5 bilhões, a receita com títulos públicos saltou 27,6% para US$ 20,8 bilhões.
"A ciranda financeira voltou com força total por causa dos juros altos. Por enquanto, a tendência deve continuar por causa do avanço da inadimplência", diz Erivelto Rodrigues, da Austin Asis.
Ele avalia, no entanto, que a tendência em um prazo maior é de que a chamada ciranda financeira -os ganhos com os juros altos- perca força. "Os bancos de varejo têm de voltar a cumprir o seu papel na economia, o de emprestar. Sem isso o crescimento da economia é retardado", diz o consultor.
A escolha entre aplicar os ativos -dinheiro captado junto aos clientes por meio dos depósitos- em crédito ou títulos públicos não é a única marca da diferença da gestão dos dois maiores bancos.
Outro fator determinante dos resultados publicados na semana passada é o diferente grau de exposição no mercado de ações.
As empresas de seguros, previdência e capitalização do Bradesco têm grande parte de suas reservas técnicas aplicadas em ações.
A queda da Bolsa de Valores nos últimos 12 meses fez com que o grupo registrasse perdas.
"Tivemos nossas reservas muito afetadas, mas são reservas de longo prazo e a Bolsa agora já está tendo uma recuperação", diz Brandão.
As perdas com ações, por enquanto, são apenas contábeis, pois os papéis continuam em poder do grupo. Se a Bolsa subir, a perda é revertida. Só se as ações tivessem sido vendidas após a queda de preços é que haveria prejuízo de fato.
Perdas contábeis ou reais, o Itaú prefere não se arriscar. "Temos muito poucas ações em nossa carteira porque seu resultado é muito volátil", diz Roberto Setubal.

Participação em empresas
É por meio das empresas de seguros e previdência que o Bradesco mantém boa parte de suas participações acionárias em companhias de fora do grupo.
Essas empresas são obrigadas a formar as chamadas reservas técnicas. Na prática, é um dinheiro que tem de ficar separado para fazer frente às obrigações intrínsecas dessas atividades: pagar indenizações e aposentadorias no futuro.
Como são obrigações situadas no futuro, os recursos ficam guardados por um longo período de tempo. Por essa razão, são aplicados em investimentos de longo prazo e integram a chamada poupança privada de qualquer país.
Mais uma vez, nesse campo, os dois bancos se diferenciam. O Itaú não detém participações acionárias expressivas em outras companhias. Já o Bradesco é conhecido por essa atividade.
Mais recentemente, além de empresas privadas, o banco comandado por Brandão passou a investir também nas privatizações, principalmente do setor elétrico e de telecomunicações.
"Se o mesmo dinheiro (colocado nas privatizações) tivesse sido aplicado em títulos de renda fixa, daria um retorno inquestionável no momento", diz Lázaro Brandão. "As privatizações são investimentos que têm maturação de longo prazo, mas são presenças em áreas da economia com muita substância."
Os frutos de cada um dos dois estilos vão aparecer com o tempo. "São estratégias diferentes, que têm resultados diferentes no momento. Pode ser que no longo prazo nem seja tão diferentes", diz Setubal. O tempo dirá.
Por enquanto, o que se pode ver são apenas os ganhos imediatos. Esses são, aliás, os ganhos que têm sido observados por um pequeno grupo de pessoas: os investidores da Bolsa de Valores.
Como não poderia deixar de ser, as ações dos dois bancos têm se comportado de maneira totalmente opostas. Do início do ano até agora, as ações do Bradesco recuaram mais de 30%, enquanto as do Itaú subiram quase 7%. (VA)


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