São Paulo, domingo, 8 de novembro de 1998

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Números mostram mercado mais calmo

GABRIEL J. DE CARVALHO
da Redação

A crise não passou, ainda há muita incerteza no ar e existem sérios obstáculos na travessia imaginada pelo governo. Boa parte do pacote fiscal nem sequer foi aprovada pelo Congresso. Não há como negar, entretanto, que a batalha das expectativas -vital em situações como a atual- começa a ser vencida.
O mercado já não está tão pessimista. Antes mesmo dos fatos novos da primeira semana de novembro -reação nas Bolsas de Valores e volta espontânea de dólares-, movimentos importantes de mercado em outubro indicavam para certa calmaria dos investidores.
A fuga de dólares do país, por exemplo, cedeu bastante já em outubro. O auge foi em setembro -saída de US$ 18,9 bilhões nos segmentos comercial e flutuante-, mesmo porque a crise russa se agravou só na segunda quinzena de agosto. Naquele mês a perda foi de US$ 12,1 bilhões.
Em outubro as remessas para fora não chegaram a US$ 2 bilhões. Mesmo considerando antecipações de entrada de dólares negociadas pelo governo, caso dos espanhóis que compraram a Telesp, o fluxo foi mais favorável.
Com crédito externo suspenso e bônus antigos vencendo, é natural que o saldo tenda a ser negativo.

Fuga de brasileiros
Em setembro, cresceu também o temor de que não só estrangeiros estavam deixando o país, mas também brasileiros, via mercado flutuante, o que abrange o chamado dólar-turismo e contas CC-5 (de não-residentes).
Por serem brasileiros, parte do dinheiro estaria nos FIFs (Fundos de Investimento Financeiro), principalmente nos de 60 dias, que detêm mais de 80% do patrimônio total de R$ 126 bilhões nessas aplicações.
Em setembro, a captação líquida dos FIFs, segundo dados do Banco Central, foi negativa em R$ 6,85 bilhões, contra R$ 858 milhões no mês anterior.
Em outubro, dados disponíveis no Sisbacen indicam que os saques ainda superaram os depósitos, mas num volume menor, de R$ 3,05 bilhões até o dia 29.
E retiradas de fundos, CDBs e mesmo poupança não significam necessariamente compra de dólares, para envio ao exterior ou, por precaução, ficar "debaixo do colchão" aqui dentro.

"Black" recua
Prova da maior calmaria entre investidores locais é o preço do dólar paralelo. O "black" é hoje um mercado restrito, mas não deixa de ser indicador do humor de quem mexe com dinheiro.
Em meados de setembro, chegou a ser vendido a R$ 1,33, com ágio próximo de 13% sobre o oficial. Fechou outubro em R$ 1,255. Na última sexta-feira o ágio estava em 5,20%, nível próximo ao anterior à crise russa.

Bolsa animada
A Bolsa sofreu as maiores quedas no início de setembro, quando o Índice Bovespa, que reflete a oscilação de preços das ações mais negociadas em São Paulo, chegou a bater em 4.760 pontos.
Só para comparar: o recorde foi em julho de 97, com 13.617. Ponta a ponta, daria uma queda de 65%.
Com menor nervosismo nos mercados interno e externo, o Ibovespa fechou outubro em 7.047 pontos. Na última sexta, em 8.214. Dá uma reação de 72,6% sobre o "fundo do poço" de setembro.
O volume diário de negócios, indicador importante, também melhorou: R$ 647,98 milhões.

Só expectativas
Por enquanto, a calmaria vem das expectativas: reforma da Previdência, que finalmente passou; aprovação do pacote fiscal; acerto com o FMI; e megaoperação internacional de apoio às reservas.
Por fim, queda dos juros para controlar o endividamento público e evitar que a recessão dramatize mais a questão social.
Na área cambial, tudo indica que a política de minidesvalorizações do real vai continuar. Daqui para a frente, o ganho real para as exportações deve ser maior, pois a inflação está zerada.
As recomendações de máxi, mesmo que não seja já, com o mercado tenso, dificilmente serão acolhidas pelo governo. Partem de quem não tem a responsabilidade pelas consequências de "apertar o botão". Se der errado, em desastre, a culpa ainda será de FHC e equipe.
O risco da estratégia adotada pelo governo, temem até analistas que a defendem, é a provável volta do financiamento externo levá-lo novamente a se acomodar, adiando um ataque frontal e mais rápido aos desequilíbrios da economia.



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