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ROBERTO RODRIGUES
Agricultura orgânica
Falta-nos uma clara regulamentação sobre os
orgânicos, para que haja
seriedade no seu comércio
QUALIDADE do alimento é hoje
um assunto mais relevante
do que foi a própria questão
da segurança alimentar, grande desafio imposto à agricultura do século
passado. A resposta dada pela ciência
àquele desafio foi espetacular, e a
oferta quantitativa de comida cresceu mais do que a demanda.
Hoje, temas ligados à saúde, à demografia, ao ambiente e às mudanças climáticas, às novas tecnologias e
ao comércio mundial ensejam longas e pertinentes discussões sobre a
segurança do alimento.
Nessas conversas, insere-se a disputa entre os alimentos produzidos
pelo sistema tradicional, os transgênicos e os produtos orgânicos.
Às vezes, a paixão domina as discussões, tirando-lhes a lógica que sinaliza
a coexistência pacífica dos três tipos
de agricultura. Mas essa é a realidade:
há espaço para tudo, e o consumidor
bem informado, o grande vetor do
mercado, determinará o crescimento
desse ou daquele modelo.
De qualquer forma, o Brasil precisa
olhar com mais atenção um importante segmento em evolução planetária: a agricultura orgânica.
Em 2000, o mercado mundial desse setor mal superava a casa dos US$
20 bilhões, o que já era um número
impressionante. Mas, em 2010, a indústria internacional dos orgânicos
deverá chegar bem perto de US$ 60
bilhões, um aumento espetacular em
dez anos. Cerca de 5% do mercado de
alimentos dos países desenvolvidos é
de orgânicos e, tratando-se apenas
dos hortifrutigrangeiros, chega a
quatro vezes mais, em vários países.
Atualmente, a Europa move US$
17 bilhões de orgânicos, e os EUA, 15.
Segundo a Ifoam, 31 milhões de hectares já foram convertidos para orgânicos em todo o mundo e 62 milhões
são reconhecidos como extrativismo
vegetal. No Brasil, ainda é relativamente pequeno o setor: calcula-se
que tenhamos 800 mil hectares cultivados com orgânicos, em geral por
pequenos produtos (seriam 15 mil!),
e 5 milhões de hectares de extrativismo.
O que nos falta é uma clara regulamentação sobre a matéria, especialmente no que diz respeito à certificação dos orgânicos, para que haja seriedade no seu comércio.
Em 23 de dezembro de 2003, o
presidente da República sancionou a
lei 10.831, dispondo sobre a agricultura orgânica. Nesse instrumento legal, as bases gerais foram estabelecidas; caracterizaram claramente a
agricultura orgânica e seus objetivos.
A própria lei estabeleceu a necessidade de um regulamento. Para fazê-lo,
foi criada em 2004 a Câmara Setorial
da Agricultura Orgânica, composta
por representantes da área e do governo, no âmbito do Ministério da
Agricultura. Na reforma estrutural
da pasta, no mesmo ano, foi criado
um setor específico, a Coordenação
de Agroecologia, que montou um vigoroso Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica, com
linhas prioritárias bem definidas:
manejo da biomassa verde e sistemas
agroflorestais; manejo e controle sanitário alternativo; boas práticas de
produção, colheita e industrialização; sistemas reguladores do comércio; planejamento, manejo e adequação ambiental de propriedade orgânica; e produção de material de propagação vegetal, reprodução animal
orgânicos.
Depois de dois anos de discussões,
a Câmara Setorial preparou um decreto, negociado entre as partes todas (inclusive os diferentes órgãos
do governo), que, já assinado pelo
ministro da Agricultura, aguarda assinatura de outros ministros para
publicação. É essencial que isso
ocorra logo. O Brasil não pode ficar
na retaguarda de um mercado tão
promissor e que, ademais, representa excelente alternativa ao pequeno
produtor rural, tão carente de renda
e de políticas adequadas.
ROBERTO RODRIGUES, 65, coordenador do Centro de
Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do
Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.
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