São Paulo, quinta-feira, 09 de março de 2006

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Para Mantega, "sobrará dólar" durante a eleição

DO ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
DE LONDRES


Foi apenas uma tentativa de brincadeira, mas, como estava falando em português, a platéia talvez não tenha entendido.
O fato é que ninguém riu quando Guido Mantega, o presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), disse que, se o processo eleitoral de 2006, provocasse uma desvalorização do real "até seria bom".
O que Mantega queria transmitir ao público que assistia ao seminário sobre as relações econômicas Brasil/Reino Unido era a idéia de que, desta vez, as eleições "não vão perturbar o curso da economia", ao contrário do que aconteceu em momentos anteriores, em especial em 2002.
Quando há perturbações, o normal é que quem pode corre para o dólar para se proteger. "Desta vez, será a primeira eleição com sobra de dólares no Brasil", disse, o que, como é óbvio, impedirá qualquer corrida para a moeda norte-americana.
Por isso, é que seria "até bom" que houvesse alguma corrida e a conseqüente desvalorização do real, já que há certo consenso de que a moeda brasileira está sobrevalorizada.

Câmbio flutuante
Consenso de que participa, por exemplo, o ministro Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), que reclama da frase de seu colega da Fazenda, Antonio Palocci, que sempre diz que o problema com a flutuação da moeda é que "a moeda flutua".
Reage o ministro Furlan: "Só flutua unidirecionalmente", ou seja, para cima.
Tréplica de Palocci: "Não dá para reclamar do câmbio quando as exportações crescem há 38 meses consecutivos".
Para a felicidade das autoridades brasileiras, o debate sobre o câmbio se deu indiretamente, em conversas separadas com os jornalistas.
Para o público, a mensagem de todos, incluído Mantega, foi de um otimismo incontrolável, a ponto de o ministro da Fazenda ter dito que "o Brasil deixou para trás a época de crises".
Lembra um pouco o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, no discurso da segunda posse, quando jurou que não seria "o gerente da crise". Foi.
Sobre o pífio crescimento registrado em 2005 (2,3%), Palocci foge para a frente: "O importante para o Brasil não é ter crescimento só um ano, mas parar de ter crises. Penso que o país já superou essa fase".

Nervosismo
Nem o nervosismo dos últimos dias nos mercados internacionais, por conta da alta de juros nos Estados Unidos, abala o espírito zen e o otimismo de Palocci.
Lembra que, assim que o Fed, o banco central dos EUA, anunciou o início das altas de juros, houve idêntico nervosismo, que, no entanto, "se acomodou logo em seguida".
O ministro só tem um lamento: o fato de o Congresso, no relatório (ainda preliminar) sobre o Orçamento-2006, ter eliminado o espaço previsto pelo governo para eliminar impostos sobre os bens de produção (uma "bondade" de R$ 2,6 bilhões). Mas Palocci ainda acha que pode convencer os parlamentares a voltar atrás.
Mesmo como todo esse otimismo, Palocci evita arriscar previsões sobre o "espetáculo do crescimento" que Lula prometeu em 2003 mas nunca conseguiu levar a cabo. Já Mantega prefere mudar a expressão para "espetáculo do desenvolvimento", que, segundo ele, já está ocorrendo. Mas que ninguém espere algo do tipo China ou Índia.
"Não dá para crescer 10% [como a China] porque a China está em outra etapa do processo de desenvolvimento", diz o presidente do BNDES.
No Brasil, 5% ou 6% seria "um espetáculo", acha Mantega. "Já estamos nessa trajetória virtuosa", aposta. (CR e FV)


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