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OPINIÃO ECONÔMICA
Por que a CPMF é um imposto ruim
MAILSON DA NÓBREGA
Recente estudo do Banco Central citou definição de Alan
Greenspan sobre a estabilidade
de preços: é uma situação que se
caracteriza "quando os agentes
econômicos não mais consideram mudanças futuras no nível
geral de preços para tomar decisões".
Ainda que a definição seja imprecisa, diz o estudo, parece certo que Greenspan, atual presidente do banco central americano, se refere a uma taxa de inflação tão pequena que não há lugar para ela na realização dos
negócios e nas atividades do dia-a-dia.
Pelo mesmo raciocínio, um
bom sistema tributário é aquele
em que os agentes econômicos
não precisam considerá-lo para
tomar decisões sobre negócios,
no país ou no exterior. A tributação não interfere no cálculo
econômico. É completamente
neutra.
A definição de Greenspan pode ser observada atualmente em
seu país. A do bom sistema tributário é o que os bons governos
desejam, mas não conseguem
por razões de natureza política e
econômica. Mesmo assim, buscam atingir algo parecido.
Daí o estudo permanente sobre a influência dos tributos nas
decisões econômicas e suas consequências para o desenvolvimento. Foi assim que se formaram os princípios que regem os
modernos sistemas tributários e
a identificação das três bases de
tributação: a renda, o consumo
e o patrimônio/riqueza.
Entre os princípios de tributação está também o de que no comércio exterior os bens devem
ser tributados no destino. Precisam, assim, ser desonerados de
tributos sobre o consumo no país
de origem.
Assim, não pode haver tributos cumulativos, isto é, em cascata, pois é impossível saber em
quanto eles oneram cada bem
ou serviço, pois incidem em cada
transação ou venda e se impregnam definitivamente nos respectivos custos.
Além de outros efeitos perversos, o tributo em cascata prejudica o produto nacional. Se este
é exportado, paga na origem e
no destino, perdendo competitividade. Se é vendido no mercado
interno, perde para o seu similar
importado, que não paga na origem e recolhe menos no destino.
O tributo em cascata se tornou
mais condenável na nova economia, que está revolucionando
as fronteiras das empresas com a
descentralização, o foco e a terceirização.
A integração vertical, em que
a empresa fazia quase tudo, é
definitivamente coisa do passado. Com a Internet, a terceirização se amplia. Será mais fácil
melhorar o relacionamento com
clientes e fornecedores e cuidar
apenas do que se sabe fazer melhor.
A Dell Computers, da Irlanda,
é um caso de sucesso na venda
de computadores sob encomenda em toda a Europa precisamente porque combina a terceirização com a Internet.
Seus pedidos chegam por meio
de um site na Internet e são
acompanhados em tempo real
pelos fornecedores das correspondentes partes, peças e componentes, permitindo que se organizem para produzi-las e entregá-las de acordo com as necessidades da Dell.
Os caminhões dos fornecedores chegam com os suprimentos
à fábrica da Dell, esperam algumas horas e partem novamente
com os computadores prontos
numa operação perfeita de terceirização e logística. Ganham
todos.
Na mesma linha, a Ford investe mais de US$ 300 milhões nos
EUA para utilizar a Internet
com o objetivo de personalizar
cada vez mais seus produtos. E
está redefinindo-se como uma
empresa da área de consumo em
vez de fabricante de automóveis.
Se a Irlanda e os EUA adotassem uma CPMF, em cascata, a
Dell e a Ford teriam de pensar
de onde viriam os suprimentos
(se do país ou do exterior),
quantas operações ocorreriam
até montar e entregar os computadores e automóveis e assim
por diante. Perderiam competitividade. Seus planos não se viabilizariam. Todos perderiam.
Há quem diga que a Internet e
o comércio eletrônico revolucionarão também as formas de tributação. É o contrário. Dramatizarão a importância dos tributos não cumulativos.
No futuro distante, se poderosos sistemas puderem eliminar
os efeitos da cascata, dá para
pensar nisso. Nos dias de hoje,
estultices como a CPMF, que podem ser toleradas em momentos
de emergência, são uma barreira à revolução em marcha. Torná-la permanente, mesmo devolvendo-a à frente, como se
quer no Brasil, seria um completo disparate.
Por essas e outras, a tributação
não pode ser deixada a cargo exclusivo de especialistas na matéria, que raciocinam somente
com arrecadação e combate à
sonegação. É preciso ir além e
pensar também nos seus efeitos
sociais e econômicos.
Na próxima semana, continuarei essa análise. Abordarei
os males da CPMF para o comércio exterior, o mercado de
capitais e o desenvolvimento do
país.
PS: lamentável a proposta da
Fiesp ao Congresso para perpetuar a CPMF com alíquota de
1% e devolução posterior. É ingênuo pensar que, se devolver,
não tem problema.
Mailson da Nóbrega, 57, ex-ministro da
Fazenda (governo José Sarney), sócio da
Tendências Consultoria Integrada, escreve
às sextas-feiras nesta coluna.
E-mail: mailson@palavra.inf.br
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