|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Exportações, portos e candidatos
WADY JASMIN
Em encontro recentemente
articulado entre um dos presidenciáveis e grupo representativo de diferentes segmentos privados, tive a oportunidade de indagar do postulante quanto a sua
percepção sobre os portos nacionais e quanto ao foco que esses
mereceriam caso viesse a se eleger.
A resposta surpreendeu-me pela demonstração de objetivo conhecimento dos óbices que ainda
afligem a estrutura logística nacional e, no caso dos portos, retardam sua consolidação como centros de excelência logística.
A manifestação, incisiva, associada ao declarado compromisso
de todos os candidatos, independentemente de orientação ideológica, com providências capazes de
alavancar as exportações nacionais, enseja renovada esperança
de que, na quadra governamental
a inaugurar-se em janeiro próximo, os portos brasileiros venham
a receber apoio político mais intenso e direção normativa mais
consistente com as metas que lhes
foram atribuídas no programa
nacional de privatizações portuárias.
É fato incontroverso que, decorridos cerca de cinco anos das privatizações no setor, a expressiva
maioria dos terminais portuários
privatizados alcançou eficácia
operacional já alinhada a padrões
internacionais. No maior complexo portuário brasileiro, o porto de
Santos, por onde transitam 40%
das cargas conteinerizadas de comércio exterior do país, a velocidade operacional foi mais que
quadruplicada no período, os
congestionamentos, eliminados,
e os preços da movimentação de
cargas, reduzidos em cerca de
dois terços!
Lamentavelmente, entretanto,
parece escapar a diferentes níveis
de governo que a influência isolada do operador portuário na promoção de instrumentos logísticos
crescentemente competitivos esgota-se, nítida e naturalmente, na
sua capacidade de agregar eficiência à operação, de modo a transferir ao mercado, em ambiente concorrencial, uma parcela dos ganhos daí decorrentes.
Alcançados limites técnicos de
eficiência -que evoluem à medida da permanente agregação de
novos recursos e tecnologia à operação-, patamares mais elevados de competitividade fogem à
esfera de ação do ente privado para se relacionar com a superestrutura suprida nos portos, com a intrincada teia normativa que governa a atividade, com as tarifas
públicas impostas à operação e
com os custos extraordinários de
um contingente reconhecidamente excessivo da chamada
mão-de-obra avulsa -elementos
essencialmente dependentes de
ações em nível público.
A concepção moderna de logística a define como sendo a "gestão
de estoques em movimento" (Robert Ryan /CI Conference-1999).
À luz do conceito, simples e
abrangente, a eficácia logística
não começa nem se esgota no
porto, ainda que nele se configure
etapa essencial na agregação de
competitividade aos bens de comércio internacional! Em verdade, nas transferências intercontinentais de mercadorias por via
aquaviária, a competitividade
global impõe, em adição a uma
etapa portuária eficaz, a utilização
de transferências locais sinérgicas
com o porto, sempre que possível
em itinerário direto desde o terminal de descarga até o armazém
do cliente e vice-versa.
Se o ingente esforço para alavancar a corrente de comércio exterior do país é um pressuposto
de política pública e tema recorrente nos programas dos quatro
principais candidatos, o caminho
inescapável é dotar os bens e insumos da cadeia produtiva com
competitividade ao nível exigido
por implacável concorrência internacional. O perfil globalizado
dos mercados é hoje condição
inamovível -goste-se ou não dele, aceite-se ou não sua despudorada assimetria!
Nesse contexto, atendido ao
quesito da oferta, o ajuste das variáveis estruturais indutoras de
crescimento exportador impõe
cauteloso gradualismo. No manejo de vetores econômicos ordinariamente conflitantes, não se pode abordar pontualmente a matriz tributária nacional nem sintonizar isoladamente o câmbio ou o
nível de crédito sem contemplar
penoso risco de efeitos indesejáveis ao conjunto da economia. É
consenso, ademais, que a sociedade rejeita vigorosamente um novo convívio com taxas inflacionárias crescentes!
Já o ajuste da competitividade
logística dos bens de comércio exterior é tarefa pontual, exclusivamente dependente da combinação de dois elementos fundamentais, sem consequência insalubre
para a estabilidade econômica:
vontade política e envolvimento
proativo, direto e consequente
dos agentes privados mais importantes na matriz de comércio exterior do país -os importadores
e os exportadores, em última análise, os donos das cargas!
No Brasil, entretanto, ainda prevalecem opções de manejo intermodal em itinerários no mínimo
"heterodoxos", que mais se assemelham a roteiros turísticos que a
caminhos logísticos! Os estágios
intermediários de transferência
pontificam e a soma de ônus e riscos desnecessários dai decorrentes tem sido debitada, até por inclinação cultural, à conta da ineficiência portuária!
Se no ambiente pretérito de ineficácia generalizada o famigerado
"custo Brasil" impunha perdas à
grande maioria, é evidente que
uns poucos com ela ganhavam! É
precisamente para a remoção
desses interesses -legítimos, do
ponto de vista de cada ente privado diretamente envolvido na atividade logística, mas conflitantes
com o interesse nacional- que a
associação supra referida de vontade política com decisão de mercado se faz necessária. Sem essa
combinação, as mudanças ainda
assim haverão de fluir, mas em
ritmo que fatalmente desatende à
urgência nacional por superávit
na conta de comércio internacional!
Do cachorro de dois donos, diz-se que acaba morrendo de fome:
um dos donos sempre transfere
ao outro a tarefa de alimentá-lo! A
formulação de uma política de comércio exterior que enseje acumulação de superávit em moeda
conversível também só pode
atender a um só e único senhor
-o inadiável interesse nacional!
Resta aguardar que o viés exportador presente nos discursos
de campanha enseje, já na alvorada do novo governo, um ciclo de
esforços público e privado em nível capaz de dotar os bens de comércio exterior do Brasil com a
competitividade logística que há
muito reclamam -e que a importância de Santos conduza seu
estratégico endereço ao primeiro
capítulo de todos os planos!
Wady Jasmin é engenheiro e presidente da Santos Brasil S.A. (arrendatária do
Terminal de Contêineres de Santos).
Texto Anterior: Giro europeu: Força-tarefa do governo inicia hoje missão para tentar reabrir crédito Próximo Texto: Dicas/Folhainvest - Ações: Carteira da Santos Asset registra a maior rentabilidade em agosto Índice
|