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ENERGIA
MP muda regra, e revisão de tarifa pode ser antecipada para 2002
Governo já prepara novo socorro para as elétricas
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
Na surdina, o governo está
abrindo as portas para uma operação de salvamento das distribuidoras de energia elétrica mergulhadas em dívidas e prejuízos.
A conta, mais uma vez, será rateada com o consumidor.
O primeiro passo nessa direção,
segundo especialistas do setor ouvidos pela Folha, foi dado pela
medida provisória nº 64, assinada
no dia 26 de agosto pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.
"Essa MP tira poder da agência
reguladora do setor e, no extremo, transfere para o Ministério de
Minas e Energia a revisão tarifária
da energia elétrica", diz o deputado José Carlos Aleluia (PFL/BA).
Essa revisão está prevista nos
contratos de concessão e começará no ano que vem, vigorando por
cinco anos. "A definição de tarifas
não pode ir para a alçada política;
o Congresso deverá barrar isso",
diz Aleluia.
Segundo James Correia, professor da Universidade Federal da
Bahia e autor do plano de racionamento, essa transferência de
poderes, que são da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica),
para o ministério, tem por objetivo viabilizar a antecipação da revisão tarifária do setor para este
ano.
"Há uma articulação do governo e das distribuidoras para fazer
a revisão depois do primeiro turno das eleições. Trata-se de uma
grande armação", alerta Correia.
O consultor Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-estrutura, diz não acreditar que o
governo adote qualquer "medida
radical" antes da conclusão do
processo eleitoral. "Mas, após as
eleições, ele [governo] terá de fazer alguma coisa, pois as empresas estão afundando", diz.
Na sua opinião, para recuperar
o setor elétrico será necessário um
pacote de medidas que inclua aumento de tarifa, redução da carga
tributária e extensão dos contratos iniciais de fornecimento de
energia pelas geradoras.
Esses contratos, firmados na
época da privatização, serão substituídos por leilões de energia, o
que encarecerá o insumo. "Será
preciso um pacote como o Proer
ou o Proar para o setor", acrescenta Pires, referindo-se aos programas de socorro aos bancos e à
aviação comercial.
Segundo Pires, com a MP o governo poderá implementar tal pacote e, inclusive, mudar as regras
estabelecidas na semana passada
pela Aneel para a revisão tarifária
do setor. "Se forem aplicadas as
regras da Aneel, as distribuidoras
quebram ", diz Pires.
De acordo com a resolução nº
493 da Aneel, a base de cálculo para a revisão da remuneração tarifária será o custo de reposição dos
ativos das empresas pelo seu valor
de mercado.
As distribuidoras pleiteavam
que as novas tarifas fossem calculadas de forma a remunerar o investimento feito na privatização,
tomando como base o valor mínimo dos leilões. Segundo estimativas do mercado, isso resultaria
em aumento de 34% nas tarifas.
Desde o Real, a tarifa residencial
subiu 183%, segundo dados da
Eletrobrás. "Agora, as empresas
querem que o consumidor arque
com o impacto do câmbio nos
preços da energia de Itaipu, dos
leilões de energia das geradoras e
do custo de um endividamento
malfeito na época da privatização", diz Maurício Tolmasquim,
coordenador do Centro de Economia Energética e Ambiental da
Coppe-UFRJ .
Nas entrelinhas
A MP nº 64, que está gerando
polêmica entre os especialistas
em energia, passou quase despercebida, pois não deixa explícita a
transferência de atribuições da
Aneel para o ministério.
Segundo Correia, esse é o resultado prático dos artigos 5º e 10 da
medida provisória. "Essa mudança é absurda, pois a Aneel tem
conseguido segurar os aumentos
de tarifas e o ministério é mais
sensível a pressões políticas",
acrescenta.
Segundo Correia, a mesma MP
já dá uma injeção de recursos extras no setor. Ela destina parte da
RGR (Reserva Geral de Reversão)
-uma quantia estimada entre R$
1 bilhão e R$ 1,5 bilhão anuais-
para cobrir eventuais perdas das
distribuidoras com a tarifa social
(com desconto para consumidores de baixa renda).
Os recursos da RGR são destinados a investimentos em energia
alternativa, de acordo com a lei nº
10.438, que regulamentou a reposição das perdas das empresas
com o racionamento. "A MP nº
64, no geral, favorece as distribuidoras com novos recursos, além
de dar uma "esvaziada" no papel
da Aneel no setor", diz Pires.
Para os analistas, essa destinação de recursos não faz sentido, já
que ninguém sabe se haverá perda de receita para as distribuidoras com os novos critérios para
enquadramento dos consumidores de baixa renda na tarifa social.
Até agora, cada distribuidora tinha uma forma de enquadramento. Na maioria dos casos, o critério era apenas o padrão de consumo. Quem consumia até 220 kWh
por mês tinha desconto escalonado por faixa de consumo.
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