São Paulo, segunda-feira, 09 de dezembro de 2002

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TESOURO DO IMPÉRIO

Após a saída dos líderes de sua equipe, é hora de o presidente redirecionar atual política econômica

Dilema de Bush é mudar pouco ou parar

RICHARD W. STEVENSON
DO "THE NEW YORK TIMES"

Depois de triunfar nas eleições de meio de mandato -em larga medida devido ao seu desempenho como chefe das forças armadas- o presidente George W. Bush já sinaliza que nem mesmo um líder popular, em tempos de guerra, pode ignorar ou escapar dos perigos políticos de uma economia fraca.
Ao conduzir os líderes de sua equipe econômica pela porta de saída, Bush estava fazendo uma declaração dramática, orquestrada de maneira confusa, de que pretende agora se concentrar nas questões que mais interessam à maioria dos norte-americanos. Isso enquanto prepara o país para o embate contra o Iraque.
"As notícias econômicas são contraditórias, e o norte-americano está preocupado", disse Frank Luntz, um especialista em pesquisas de opinião pública no Partido Republicano. "Essa é a forma que o governo encontrou para dizer que está ouvindo e pretende fazer alguma coisa a respeito."
Mas as mudanças aparentemente se limitarão ao pessoal. Não se estenderão a uma reconsideração da filosofia de impostos mais baixos, menos regulamentação e mais comércio internacional defendida pelo presidente.

Sem mudanças
As recentes demissões, no alto escalão do governo, têm menos a ver com o desejo de mudar de política -diante de um cenário econômico conturbado- do que com a necessidade de despejar a considerável bagagem que os dois acumularam em seus cargos.
Uma nova equipe, disseram os funcionários do governo, deve se mostrar mais capaz de defender a agenda preexistente do presidente diante do público.
"Trata-se mais de percepção do que de estratégia", disse Thomas D. Gallagher, analista político do ISI Group, um fundo de investimento. "Trata-se de dar uma face melhor à política econômica existente, e não de mudá-la".
Ainda assim, a medida envolve riscos consideráveis para Bush. Os democratas, que não conseguiram encontrar argumentos convincentes na campanha eleitoral para explicar por que o presidente e seu partido deveriam ser considerados responsáveis pela lentidão econômica, retrataram as recentes demissões como uma admissão de fracasso pela Casa Branca.
Também fizeram questão de reforçar a intenção por retratar Bush como inimigo das famílias trabalhadoras.
"Espero que isso represente um reconhecimento pelo presidente de que as políticas de seu governo fracassaram na geração de crescimento econômico e na criação de novos empregos", disse o deputado Charles B. Rangel, democrata de Nova York.
"Bush se define como um conservador compassivo, mas suas ações econômicas se assemelham mais à indiferença do que à compaixão."

Temores
Os republicanos do Congresso estão preocupados com a possibilidade de que as demissões solapem os planos do governo para reformar o código tributário e reconstruir o sistema de seguro social. Para os mercados financeiros, a criação de um vácuo na liderança econômica, se bem que temporário, é mais uma causa de preocupação.
Mas Bush, de certa forma, tinha poucas opções. Com dois anos de mandato transcorridos, e com seu partido conquistando o controle de ambas as casas do Congresso, a responsabilidade política pela economia cabe agora apenas ao presidente.
Desde que assumiu a presidência, quase dois anos atrás, Bush vem, com grau variável de justiça, imputando a culpa pela recessão de 2001 e pela recuperação lenta à bolha econômica dos anos 90. E também ao seu predecessor, aos democratas do Senado e aos ataques terroristas.
Mas ele também conseguiu aprovar todas as suas iniciativas econômicas importantes, incluindo o corte de impostos do ano passado.
É provável que conquiste a aprovação do Congresso para novas medidas neste ano. Tendo receitado e administrado o tratamento econômico, Bush não vai poder atribuir os sinais vitais insatisfatórios a terceiros -como tem feito até o momento.

Popularidade e campanha
Os números explicam essa insatisfação. O desemprego subiu a 6% em novembro, ante 5,7% no mês anterior. O mercado de ações, que subiu depois das demissões, na sexta-feira, continua oscilante.
Funcionários do governo se preocupam com a possibilidade de que uma guerra contra o Iraque, especialmente se for prolongada, perturbe os mercados de petróleo e abale a confiança dos consumidores e empresários.
"A essa altura, o presidente é tão imensamente popular que a única coisa que poderia tirar dos trilhos o expresso George W. Bush seria uma recessão ou algo que saísse catastroficamente errado na guerra", diz Stephen Moore, presidente do Club for Growth, um comitê de ação política conservadora.
Tornou-se quase um clichê político em Washington dizer que o atual presidente aprendeu com os erros de seu pai. O primeiro Bush foi derrotado em sua tentativa de reeleição, uma década atrás, em parte porque permitiu que os democratas o retratassem como um político distante das preocupações econômicas dos trabalhadores americanos.
Nos discursos de campanha ao longo do ano, o atual presidente enfatizou que não irá se sentir satisfeito até que todo norte-americano que queira um emprego o consiga.
Mas ao anunciar as demissões de Paul O'Neill e Larry Lindsey, a Casa Branca negou qualquer sugestão de que a mudança fosse uma admissão de deficiências em sua política econômica.
Ao fazer as mudanças, o presidente não deixou transparecer que favoreça qualquer abordagem econômica de algum dos lados. O'Neill e Lindsey, de fato, muitas vezes se posicionaram em campos opostos. Para O'Neill, a economia estava basicamente em boa forma. Para Lindsey, era preciso considerar cortes agressivos de impostos.

Agenda para Bush
Depois de meses de debate, Lindsey e O'Neill deixaram na escrivaninha de Bush um conjunto de opções para a agenda econômica de curto prazo que a Casa Branca talvez decida revelar nas próximas semanas.
Além do já antigo pedido de Bush para que o corte decenal de impostos do ano passado seja tornado permanente, os dois principais componentes da proposta são: 1) redução no imposto sobre os dividendos de ações pagos pelas pessoas físicas; 2) isenção fiscal para as empresas na forma como podem deduzir os investimentos feitos em equipamentos novos para fábricas.

Futuro
O pacote poderia incluir também uma aceleração nos cortes do imposto de renda pessoa física, que devem ser adotados gradativamente ao longo dos próximos anos. Isso ocorrerá de acordo com o projeto de lei tributária do ano passado.
Bush ainda não aprovou o pacote, e muitos detalhes continuam incertos. Mas assessores externos do governo dizem que não é provável que mude muita coisa no pacote básico.
Isso, independentemente de quem venha substituir O'Neill e Lindsey no governo.
"Não quero soar insensível, mas de um ponto de vista estratégico, não me incomodo com a saída de Larry Lindsey ou do secretário O'Neill", disse Grover Norquist, presidente do Americans for Tax Reform, um grupo de defesa de interesses conservadores.
"Isso não importa em termos de direcionamento da política econômica. Existe unanimidade entre os republicanos quanto à política tributária".


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