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São Paulo, terça-feira, 09 de dezembro de 2003

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COMÉRCIO MUNDIAL

Proposta, que será levada a Puebla, em fevereiro, prevê derrubada total das tarifas de importação

Brasil já tem pronto plano para Alca "light"

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O governo brasileiro já preparou sua proposta para a próxima reunião da Alca (Área de Livre Comércio das Américas): contém o máximo de ambição em matéria de derrubada de tarifas de importação e o máximo de cautela em temas que não são exatamente relacionados ao comércio de bens, como investimentos e serviços.
O documento brasileiro estava sendo discutido ontem em Montevidéu (Uruguai) com os demais sócios do Mercosul, na medida em que a expectativa do Itamaraty é que seja adotado por todos.
O texto será levado à reunião do CNC (Comitê de Negociação Comercial), principal órgão técnico da Alca, já marcada para o período de 2 a 6 de fevereiro, na cidade mexicana de Puebla.
Esse encontro será a primeira tentativa dos 34 países que negociam a Alca de definir um roteiro de negociações após a conferência ministerial de Miami (EUA), em novembro, que simplesmente adiou as principais decisões, com o que o encontro de Puebla tornou-se politicamente relevante.
Miami decidiu por uma Alca "light", como queria o governo brasileiro, na qual haverá "um conjunto comum e equilibrado de direitos e obrigações que sejam aplicáveis a todos os países".

Abertura total
Acima do mínimo, cada país é livre para fazer acordos com "benefícios e obrigações adicionais", que, porém, não serão obrigatórios para os demais sócios.
É justamente o formato concreto do "conjunto comum e equilibrado" que deverá ser discutido em Puebla, em todas as nove áreas de negociação, a saber: acesso a mercados; agricultura; serviços; investimentos; compras do setor público; propriedade intelectual; política de concorrência; subsídios, antidumping e direitos compensatórios; e solução de controvérsias.
O primeiro ponto (acesso a mercados) é o jargão para reduzir ou eliminar as tarifas de importação, o item mais clássico em acordos comerciais.
A proposta brasileira prevê cobertura total tanto em bens agrícolas como não-agrícolas, o que significa que a abertura deverá contemplar todos os produtos, sem exclusões.
A defesa dos setores que o governo quiser proteger se dará no prazo: os mais sensíveis poderão começar a ter as tarifas de importação reduzidas 15 anos após a assinatura do acordo. Os ainda mais sensíveis podem ficar numa lista dos protegidos indefinidamente.
Na área agrícola, além de defender a derrubada das tarifas, a proposta brasileira quer a eliminação dos subsídios à exportação e o disciplinamento de todas as medidas que distorcem o comércio. Entre elas, os créditos à exportação que o governo dos EUA concede e fazem o mesmo efeito que os subsídios, mas não são punidos pelas regras da OMC (Organização Mundial do Comércio).
Ao ser agressivo nessas duas áreas, o Brasil já está atuando preventivamente contra a perspectiva de que os EUA exibam idêntica agressividade nas áreas em que o Brasil não quer ceder muito.
Exemplos: em investimentos, a proposta brasileira prevê que a Alca não irá além do que já fixa a OMC (e é pouco, em matéria de regras para investimentos).

"Positivas" e "negativas"
Em serviços, o Brasil também usa o escudo das regras internacionais, no caso o Gats (sigla em inglês para Acordo Geral sobre Comércio de Serviços).
Além disso, o texto prevê o estabelecimento das chamadas "listas positivas" para abrir o setor de serviços. Significa que o governo fará uma listagem cuidadosa dos setores que oferece para a abertura, preservando por extensão todos os não-listados.
O modelo de "lista negativa" prevê o inverso: todo setor que não constar da lista negativa estará aberto quando o acordo for concluído. Com isso, o governo fica impossibilitado de proteger um eventual setor novo que surja depois da lista "negativa".
Também em propriedade intelectual, a proposta remete para os textos da OMC, em vez de citar apenas o acordo básico nessa área, que é o Trips (Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, na sigla em inglês). Com isso, incorpora uma declaração sobre "Trips e Saúde Pública", aprovada na Conferência Ministerial de Doha (2001), que privilegia o direito à saúde sobre o direito às patentes.
Por fim, em compras governamentais, a proposta brasileira trata apenas de transparência, não do direito de estrangeiros se apresentarem em concorrências para, por exemplo, o fornecimento da merenda escolar.


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