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ALCA
Americanos querem negociar com 13 países a fim de forçar concessões do Mercosul
EUA ameaçam Mercosul com acordos
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Os EUA estão prontos para iniciar negociações com um grupo
de 13 países das Américas, para fechar acordos plurilaterais ambiciosos nas áreas de serviços, compras governamentais, propriedade intelectual e investimentos. O
anúncio foi feito sábado, em conferência telefônica com jornalistas, por um graduado funcionário
do setor de comércio dos Estados
Unidos, com o compromisso de
que seu nome não fosse revelado.
O recado tem um objetivo claro:
pôr pressão sobre o Brasil e o
Mercosul, a fim de forçá-los a fazer concessões nas estancadas negociações da Área de Livre Comércio das Américas. "Penso que
[os acordos plurilaterais] poderiam ser um estímulo útil para todos", disse o funcionário.
Os delegados brasileiros que
participaram da frustrada reunião de negociações em Puebla,
na semana passada, não se assustaram com a informação, ao lembrar que os EUA já têm acordos
com a maioria dos 13 países.
De fato, Canadá e México já formam com os EUA o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América
do Norte), que cobre todas as
áreas mencionadas como objeto
de desejo dos norte-americanos.
Os países centro-americanos
acabam de assinar idêntico acordo com Washington, o que já
aconteceu com o Chile. Só não
têm acordos, mas estão negociando, os países andinos (Colômbia,
Peru e Equador), além da República Dominicana e do Panamá,
que fecham o grupo de 13 países
mencionado pelo funcionário.
A expectativa dos EUA é dar a
partida nas negociações plurilaterais após a próxima reunião do
CNC (Comitê de Negociações Comerciais), que entrou em recesso
na sexta-feira, para ser reiniciada
em princípio na primeira semana
de março, sempre em Puebla.
Acordos plurilaterais ambiciosos compõem o segundo trilho da
nova Alca, desenhada na Conferência Ministerial de Miami, em
novembro. O primeiro trilho é
um "conjunto comum de direitos
e obrigações" válido para os 34
países das Américas (excluindo
Cuba). O segundo (o dos acordos
plurilaterais) não é obrigatório.
O Mercosul quer um primeiro
trilho ambicioso em matéria de
acesso a mercados, o jargão diplomático para a redução e/ou eliminação das tarifas de importação,
tanto para bens agrícolas como
não-agrícolas. Mas não tem a menor ambição nas outras áreas, como serviços, compras governamentais e investimentos.
Na interpretação dos EUA, foi
essa a causa do impasse da reunião de Puebla.
"Eles [o Mercosul] querem um
alto nível [de ambição] em agricultura, em que querem disciplinas sobre apoio doméstico e eliminação de subsídios à exportação. E, em acesso a mercado para
bens industriais e de consumo,
eles querem cobrir todos os itens
da lista. Sempre dissemos que estávamos prontos para negociar
todos os itens, mas, francamente,
se eles não oferecerem significativa melhora em acesso a mercado
para serviços, por que deveriam
esperar conseguir tudo em
bens?", perguntou o funcionário.
A visão americana dos acordos
plurilaterais é mais que ambiciosa: querem o OMC-plus.
Ou seja, ir além dos acordos na
Organização Mundial do Comércio, em áreas como serviços, investimento e propriedade intelectual, hipótese que o Brasil rejeita.
Na área de propriedade intelectual, por exemplo, o funcionário
dos EUA diz que os acordos deveriam levar em consideração "todos os avanços em tecnologia digital dos últimos dez anos".
O Brasil, ao contrário, quer que
seja respeitado o acordo sobre
propriedade intelectual firmado
na Rodada Uruguai, encerrada há
dez anos, antes, portanto, dos
avanços citados pelo funcionário.
A declaração de Miami diz que
as negociações do conjunto comum de obrigações e dos acordos
plurilaterais devem ser simultâneas, mas o negociador ressalva:
"Sentimos que eles não precisam
começar ao mesmo tempo".
"Se pudermos avançar nos plurilaterais antes de termos completado tudo no conjunto comum,
não há o que nos impeça de fazê-lo, e penso que seria um estímulo
útil para todos" é o recado dos
EUA, que torna mais complicada
a tarefa de evitar que o que foi
chamado de "recesso" se transforme de vez em "fracasso".
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