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ENTREVISTA
Indicado para presidir comissão defende rapidez a casos mais relevantes e diz ser difícil punir "informação privilegiada"
CVM deve ter agilidade seletiva, diz Trindade
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O advogado Marcelo Fernandez
Trindade, 39, indicado para presidir a CVM (Comissão de Valores
Mobiliários), quer que a instituição seja mais ágil nos casos com
maior repercussão no mercado,
que envolvam um maior número
de investidores, e tenha um empenho "normal" naqueles que sejam apenas disputa de acionistas.
Trindade não citou exemplos,
mas sinalizou que um dos casos
relevantes, em análise na CVM
desde junho de 2002, poderia ser
o das perdas dos investidores em
seis fundos administrados pelo
Bank of America. Já em relação ao
inquérito que corre na CVM desde 2001 de denúncia de remessas
ilegais de recursos pelo Opportunity, Trindade diz que não sabe
até que ponto se trata só de disputa entre acionistas.
Nessa entrevista à Folha, o futuro "xerife" do mercado, cujo nome ainda precisa ser aprovado em
sabatina no Senado, fez uma defesa enfática da manutenção das
ações preferenciais e diz que é
muito difícil julgar os casos de
"informação privilegiada".
Folha - Uma das maiores críticas
que a CVM sofre é em relação à demora nas decisões. Como o sr. pretende dar mais agilidade à CVM?
Marcelo Trindade - Não sei se há
realmente lentidão. Às vezes, as
pessoas acham que os casos não
estão andando por não terem sido
resolvidos. Isso não significa que
eles não estejam andando. A demora dos processos muitas vezes
tem a ver com a complexidade deles. A CVM precisa muitas vezes
buscar informações de autoridades externas ou ainda analisar
centenas de milhares de operações e, por isso, a prova demanda
muito tempo. O que posso dizer é
que acho, sim, que a gente tem de
ser ágil nas respostas das questões
que forem apresentadas. Essa agilidade não pode justificar nem superficialidade nem irresponsabilidade nas decisões. Por isso, a
CVM tem de ser focada. Focar em
alguns processos resultará em
maior agilidade sem perda de
qualidade. Agora, agilidade nem
sempre significa condenação. É
um outro clamor muito comum
na opinião pública. Só que, muitas vezes, a agilidade da CVM será
para dizer que não há nada de errado com a operação. O pior é ter
um vácuo de informação.
Folha - Com o sr. classifica os casos em análise na CVM do Bank of
America e do Opportunity?
Trindade - No primeiro caso, há
investidores reclamando que teriam sido lesados. Já no outro caso, quem teria sido lesado? Quando eu falo em foco, o importante é
focar no caso que for mais importante para o mercado. Ou seja, para os investidores. Não sei se a
CVM já está fazendo isso. Se um
determinado caso dá mais notícia
de jornal ou envolve pessoas mais
importantes, não quer dizer que
será ele a ser focado pela CVM.
Será se tiver relevância para o
mercado. Não sei se o caso do
Bank of America seria o melhor
exemplo. Não quero emitir opinião sobre nenhum caso. Pelo que
sei do caso do Bank of America,
por meio de leitura dos jornais,
trata-se de um caso no qual investidores estão dizendo que foram
lesados. O administrador não teria agido de acordo com o que
disse que ia agir. Já o outro caso
[do Opportunity], não sei até que
ponto é o mesmo caso ou é um caso que tem grupos importantes
brigando um com outro. A CVM
vai ter que ser ágil nos casos mais
importantes e normal nos outros.
Folha - Como o sr. enxerga as denúncias de informação privilegiada ("insider information")?
Trindade - Trata-se de uma matéria muito difícil de ser provada
tanto no Brasil como no exterior.
A CVM tem todos os mecanismos, todos os meios à disposição
para provar "insider information", mas é muito difícil de provar. Muitas pessoas não atuam
com o próprio nome. Por isso,
muitas vezes não se consegue
provar se houve a informação privilegiada, apesar de ter havido um
movimento suspeito no mercado.
Folha - O sr. acha que as ações
preferenciais deveriam acabar?
Trindade - Eu, particularmente,
não sou a favor de acabar com a
ação preferencial. Esse mecanismo que o Brasil tem hoje é um sistema muito bom para o futuro.
Em muitos casos, o investidor não
quer comprar ação ordinária. Ao
mesmo tempo, há também o Novo Mercado da Bovespa, que abre
a possibilidade de as companhias
só serem negociadas com ações
ordinárias. Se a lei proibir a emissão de ações preferenciais, estará
evitando inúmeros negócios, inúmeros empreendedores, inúmeros investidores. Estará se matando o emprego, o crescimento.
Folha - O sr. acha a CVM omissa?
Trindade - Ela julgou Bombril,
julgou Boi Gordo. Ela aplicou as
maiores multas no Brasil. A CVM
tem um histórico de atuação ativa
no mercado. Eu não concordo
com a afirmação genérica de que
a CVM é omissa, de que ela não
atua ativamente. Eu, como advogado, sempre tive e continuo tendo muito medo da CVM. Nunca
um cliente meu disse que estava
tranqüilo porque sabe que a CVM
não pune ninguém. O sentimento
do mercado, das empresas, dos
bancos é de muito respeito pela
CVM, muito mais do que há alguns anos. Ninguém hoje peita a
CVM. Ninguém faz uma operação sabendo que a CVM é contra.
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