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OPINIÃO ECONÔMICA
Seis reais
JOÃO SAYAD
O que aconteceria se o governo
parasse de comprar e vender dólares no mercado e fixasse a taxa de câmbio, por meio de lei,
em R$ 1 por dólar?
A lei se transformaria em letra
morta, a taxa de câmbio subiria
muito além de R$ 1 por dólar.
O que aconteceria se o governo
fixasse a taxa de juros em 32%
ao ano e o Banco Central não tomasse dinheiro emprestado a esta taxa?
Provavelmente nada. A taxa
de juros cairia.
O que acontece quando o governo fixa o salário mínimo em
R$ 136 por mês?
O governo não tem "reserva"
de operários nem vende horas
trabalhadas como faz com o dólar. Também não garante para o
trabalhador brasileiro o pagamento de R$ 136 por meio de seguro-desemprego eficaz e suficiente para que o trabalhador
consiga fazer valer a lei do salário mínimo.
Os liberais do século passado e
os neoliberais do momento afirmam que preferem a "liberdade" dos mercados à demagogia e
ao intervencionismo da política.
Mas os preços mais importantes da economia -salário, juros
e câmbio- são preços políticos.
É fácil entender a injustiça política cometida contra o salário.
Se os juros forem baixos, o dinheiro foge para bens ou para
dólares; por isso o governo garante os juros altos.
Se o câmbio for baixo, o dinheiro compra dólares e foge para o exterior, por isso o governo
compra e vende dólares.
Se o salário for baixo, o trabalhador não tem para onde fugir,
reclamar ou apelar. O governo
não precisa garantir nada.
Governos neoliberais e conservadores, que falam tanto em
mercado, se intrometem no
mercado de câmbio e de juros.
Só não gostam de se meter com o
mercado de trabalho, onde preferem as soluções de "mercado",
quando há desemprego. Em pleno emprego são estabelecidas as
leis salariais para evitar greves e
pressões inflacionárias.
Na época da inflação, de 1964
a 1994, a indexação, por exemplo, era proteção quase que perfeita para os juros e muito perfeita para o câmbio.
Os salários eram corrigidos
com atraso de um ano ou seis
meses, às vezes por índices de
preços que refletiam a inflação
esperada, sempre menor do que
a real.
Há mais de 30 anos se discutem essas coisas. O ministro
Paulo Renato, quando estava na
universidade, polemizava com o
professor Roberto Macedo sobre
o assunto. Macedo afirmava que
o salário mínimo não servia para muita coisa, pois o mercado
não obedecia. Paulo Renato
afirmava que os demais salários
acabavam sendo influenciados
pelo salário mínimo.
A história dá exemplos a favor
de Paulo Renato.
Perón começou a ser Perón
quando decretou aumento substancial do salário mínimo na
Argentina. Getúlio Vargas estabeleceu e aumentou o salário
mínimo. Jango Goulart caiu por
várias razões, uma delas pelo
aumento do salário mínimo
prometido para o dia 1º de maio
de 1964.
Em economia, as discussões
nunca acabam. Apenas saem de
moda, ou se repetem indefinidamente sem conclusão alguma.
Afinal de contas, fixar o salário mínimo faz diferença ou
não?
O salário mínimo é obedecido
no setor público em todos os níveis e pelas empresas juridicamente organizadas que pagam
impostos e obedecem a lei. Na
economia informal, o impacto é
menor e apenas indireto.
Em maio de 1999, o governo
deu um aumento de apenas R$ 6
para o salário mínimo. Por quê?
Será por causa da inflação? Será que câmbio não causa inflação e salário mínimo causa?
Será por causa do déficit público? Será que aumento de salários do setor público aumenta o
déficit público e juros altos não?
Será que salários maiores aumentam o desemprego? Mas salário é custo para quem paga e
receita para quem vende. O aumento de salário mínimo poderia aumentar a demanda e o
emprego.
Será que os famosos ganhos de
produtividade que justificavam
o câmbio fixo e sobrevalorizado
não serviriam para argumentar
que o aumento de salário mínimo pode ser absorvido pelas empresas?
Seria apenas uma decisão política desastrada?
João Sayad, 51, economista, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP
e ex-ministro do Planejamento (governo José
Sarney), escreve às segundas-feiras nesta coluna.
E-mail: jsayad@ibm.net
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