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OPINIÃO ECONÔMICA
Autoproteção
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Ao longo da década de 90, a
ocorrência de uma série de crises
financeiras, de surpreendente virulência, foi mostrando o quanto
é frágil e perigosa a situação econômica internacional. Países em
desenvolvimento foram mais
fortemente atingidos durante os
períodos de turbulência e têm
motivos de sobra para estar
preocupados.
Evidentemente, ninguém sabe
quando, onde e como acontecerão as próximas crises financeiras internacionais. Mas há um
certo consenso de que novas crises virão.
Qual tem sido a posição do governo brasileiro? De uma forma
geral, prevalece uma atitude escapista e passiva. Um exemplo
disso são os constantes apelos do
presidente da República aos governos do G-7 para que acelerem
a reforma do sistema financeiro
internacional e estabeleçam mecanismos de controle dos capitais
voláteis.
É uma tática conveniente. Ajuda a dar uma impressão de substância às frequentes viagens do
presidente ao exterior. E ainda
passa à opinião pública nacional
a sensação de que o Brasil está
participando ativamente da discussão dos grandes temas internacionais.
Nesta semana, tivemos uma
variante dessa abordagem escapista. Fernando Henrique Cardoso e Carlos Menem anunciaram que o aprofundamento do
Mercosul será um instrumento
de proteção contra futuros ataques especulativos. Esse aprofundamento envolveria a coordenação de políticas macroeconômicas -"um pequeno Maastricht"- com o intuito de criar,
no médio ou longo prazo, uma
moeda comum.
Não valeria a pena nem perder
tempo com esses "factóides" diplomáticos, não fosse o fato de
que eles acabam desviando a
atenção de algo fundamental: a
necessidade de o Brasil adotar,
no âmbito nacional e sem grande
demora, as medidas de autoproteção que estão a seu alcance.
A desvalorização real do câmbio e a passagem para um regime
de flutuação administrada já
melhoraram bastante a nossa
posição. Mas ainda há muito o
que fazer para tirar o país da zona de risco e criar condições para
a retomada do desenvolvimento.
Essa última depende, em larga
medida, da possibilidade de reduzir as taxas de juro internas e
estimular a expansão do crédito
em moeda nacional. Ora, enquanto a economia estiver vulnerável a saídas abruptas de capitais estrangeiros voláteis ou à
fuga de capitais de residentes, o
Banco Central poderá se defrontar com excessiva volatilidade da
taxa de câmbio. Terá dificuldade
de trazer as taxas de juro internas para nível civilizado e mantê-las nesse nível. E a economia
brasileira continuará crescendo
abaixo do seu potencial.
O que fazer? O tema é complexo, mas vale a pena mencionar,
mesmo que brevemente, algumas das áreas em que o Brasil
pode e deve atuar para diminuir
sua vulnerabilidade.
É preciso, em primeiro lugar,
conduzir as políticas cambial, de
comércio exterior e tributária
com a preocupação permanente
de favorecer a competitividade
internacional das empresas brasileiras. Só isso permitirá conciliar a diminuição do déficit de
balanço de pagamentos em conta corrente com a expansão da
demanda interna a taxas significativas nos próximos anos.
Em segundo lugar, é necessário
controlar rigorosamente a estrutura temporal dos passivos internacionais do país, reduzindo a
participação de obrigações voláteis ou de curto prazo e administrando cuidadosamente o perfil
da dívida externa de médio e
longo prazos.
Cabe, em terceiro lugar, manter em nível elevado as reservas
internacionais no Banco Central, proporcionando ao país
uma primeira linha de defesa em
momentos de instabilidade.
Quarto, é preciso fortalecer os
mecanismos de controle da conta
de capitais do balanço de pagamentos, devolvendo ao Banco
Central a possibilidade de regular de modo seletivo e criterioso a
entrada e saída de capitais.
Finalmente, no campo das finanças e da administração públicas há duas tarefas fundamentais por realizar: o controle
do déficit público e do crescimento da dívida pública interna de
curto prazo e, menos comentado,
mas não menos relevante, a recuperação das condições de funcionamento de órgãos vitais do
governo federal, como o Banco
Central e a Receita Federal.
Evidentemente, nada disso sai
de graça. Algumas dessas medidas têm custos financeiros significativos. E a sua implementação
requer determinação e vontade
política.
No entanto o Brasil não pode
continuar vulnerável a surtos de
instabilidade financeira. Afinal,
já estamos há quase 20 anos sem
crescer de forma sustentada.
Não se deve perder de vista que
essa estagnação prolongada, que
contrasta de modo marcante
com o dinamismo da economia
brasileira até 1980, resultou em
grande medida da nossa vulnerabilidade a choques financeiros.
Está mais do que na hora de mudar o nosso modelo de inserção
externa e tomar cuidadosa distância dos turbulentos mercados
financeiros internacionais.
Paulo Nogueira Batista Jr., 44, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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