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OPINIÃO ECONÔMICA
"A maldição de Coase" e as promoções de carros
HUGO MAIA
Nos últimos tempos, e mais
especialmente em 2001, todos os jornalistas que cobrem a
área automotiva queriam encontrar uma lógica para o excesso de
promoções de veículos novos no
mercado. Essa passou a ser a tônica da maioria das entrevistas solicitadas à Fenabrave (Federação
Nacional da Distribuição de Veículos Automotores no Brasil). O
departamento econômico da entidade resolveu, então, fazer uma
pesquisa sobre o assunto, e o resultado é o que chamamos de "A
maldição de Coase".
A conjectura de Coase, ou teorema de Coase (Coase, Ronald
Harry, economista nascido em
1910, em Middlesex, na Inglaterra), analisa os impactos dos aumentos de preços do monopolista/oligopolista do bem durável.
A conjectura mostra que, a
exemplo do monopolista/oligopolista do bem durável, a possibilidade de alterar o preço no futuro, aparentemente benéfica para
o monopolista/oligopolista, acaba
por prejudicá-lo. Isso ocorre porque, na expectativa de um preço
mais baixo no segundo período,
muitos consumidores racionalmente adiam a sua decisão de
comprar o bem. O poder do monopolista/oligopolista sobre os
potenciais consumidores no primeiro período diminui drasticamente com a possibilidade de variar o preço no futuro: a sua flexibilidade é a sua maldição!
Em linhas gerais, o argumento
principal pode ser explicado do
seguinte modo: em equilíbrio, as
vendas do monopolista/oligopolista serão distribuídas ao longo
do período de vida útil do bem
durável. Como o período de variação dos preços é muito curto,
os preços entre dois períodos consecutivos deverão ser essencialmente iguais.
Como os preços praticados pelas montadoras estão bem acima
do suportável pelos consumidores, os fabricantes praticaram, nos
últimos dois anos, o ato de conceder descontos e promoções sobre
os preços de tabela. Com isso, acabaram caindo na chamada "maldição de Coase" e entraram num
círculo vicioso que está trazendo
enormes consequências tanto para as montadoras como para suas
redes de distribuição.
Do lado das montadoras, as
quatro principais marcas (Fiat,
Volkswagen, Chevrolet e Ford)
vêm gradativamente perdendo o
seu "market share" para as novas
marcas. Já a Fiat, que dentre as
quatro foi a que praticou o aumento médio "menos" abusivo,
teve como recompensa a conquista da liderança do mercado, mas
com uma demanda inibida. As
montadoras possuem hoje um alto índice de ociosidade nas suas
fábricas, o que representa um custo de oportunidade perdido por
elas.
Do ponto de vista das concessionárias, o lado financeiro foi o
mais sentido. Como todo setor
monopolizado/oligopolizado, geralmente medidas como a de promoções e/ou descontos tendem a
estourar no lado mais fraco
-que, nesse caso, é o lado das
concessionárias. As distribuidoras viram suas margens operacionais encolher e passaram a viver,
geralmente, de bônus das vendas
dos veículos novos. Como consequência, o setor de novos, que na
teoria seria o que geraria o maior
ganho, não é o que dá resultados.
Mas o pior é que as atuais propagandas vinculadas em TV, jornais e rádios convocam o consumidor a ir às concessionárias apenas nos finais de semana, quando
são divulgados os valores promocionais dos carros. As atuais promoções estão, portanto, deslocando todos os potenciais consumidores para comparecer à concessionária em apenas dois dias
da semana, sendo que os outros
cinco (geralmente de baixo movimento) ficam ao custo do concessionário. E, como em toda promoção, os consumidores mais racionais tardarão o máximo possível a sua compra em busca de
uma melhor promoção.
A "maldição de Coase", no entanto, tem várias soluções. Como
exemplo, temos o caso de montadoras nos EUA que adotaram a
estratégia do "consumidor mais
favorecido". Ao anunciar os preços dos novos modelos de automóveis, esses fabricantes comprometeram-se a pagar, aos primeiros compradores, a diferença
entre o preço inicial e preços futuros mais baixos. Desse modo,
conseguiram reforçar a credibilidade da política da manutenção
do preço. Embora com a aparência de proteção dos interesses dos
consumidores, essa política acaba
por redundar em proveito próprio, como seria de esperar.
Aqui no Brasil existem concessionárias que já praticaram tais
medidas. Uma delas consistia em
trocar o veículo vendido hoje
dentro de um período de um ano
por outro modelo de preço igual
sem qualquer ônus, bastando
apenas ao comprador seguir um
determinado número de requisitos na manutenção do veículo. Essa medida demonstra similaridade com o fato ocorrido nos EUA,
com resultados igualmente positivos para fugir dessa maldição.
Mas a melhor forma de evitar a
chamada "maldição de Coase" é a
adoção de uma política correta de
preços. Se no Brasil tivesse ocorrido uma elevação de preços racional por parte das montadoras,
não teria havido tamanha necessidade de promoções e descontos.
Ao contrário, as montadoras, certamente, teriam vendido 1,15 milhão de unidades a mais de automóveis e comerciais leves, diluídos num período de sete anos.
Além disso, teriam tornado as
vendas de automóveis, tanto para
o consumidor como para o concessionário, muito mais interessantes, já que um não precisaria
postergar compras e teria o valor
do seu patrimônio protegido e o
outro não iria mais viver de bônus, e sim de sua margem operacional, própria de qualquer negócio.
Finalmente, embora a "maldição de Coase" implique problemas que, em teoria, podem levar à
perda completa do poder de mercado, um monopólio/oligopólio é
sempre um monopólio/oligopólio!
Concentração de poder de mercado, o futuro mostrará.
Hugo Maia é presidente da Fenabrave
(Federação Nacional da Distribuição de
Veículos Automotores no Brasil) e da
Aladda (Associação Latino-Americana de
Distribuidores de Automotores da América Latina).
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