São Paulo, domingo, 11 de maio de 2008

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Nova lei dá direitos a operário chinês e encarece trabalho

Legislação permite que trabalhador receba indenizações e pagamentos atrasados de finais de semana e horas extras

Lei está em vigor desde 1º de janeiro deste ano; para empresários, "custo China" está crescendo, e contratar ficará mais difícil agora


RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

Apenas um mês depois de começar a trabalhar em uma empresa de construção, o operário Huang Yugang, 40, quebrou o braço ao cair com um tronco que carregava em um jardim do bairro mais caro de Pequim.
"O patrão disse que meu contrato de trabalho não previa nenhuma compensação por acidente de trabalho e fiquei desempregado", disse Huang à Folha. Mas, apenas um mês depois, a central sindical estatal chinesa pressionou a empresa e conseguiu uma indenização de US$ 200 e o pagamento do tratamento de Huang.
Tal feito é novidade na China. Diversos trabalhadores estão conseguindo indenizações e pagamentos atrasados de finais de semana e horas extras nunca pagos. Uma nova legislação trabalhista, que entrou em vigor em 1º de janeiro, é considerada revolucionária no relacionamento entre patrões e empregados.
Mas a nova lei, que também determina estabilidade no emprego, depois de dois contratos temporários, foi criticada pelas câmaras de comércio da União Européia e dos Estados Unidos em Xangai. Os empresários dizem que o "custo China" está crescendo e que fazer contratações ficará mais difícil a partir de agora (leia as principais regras da nova lei no quadro).
A China precisa criar 10 milhões de empregos por ano para saciar sua população de 1,4 bilhão de habitantes. Nas últimas duas décadas, o governo chinês adotou uma permissividade quase irrestrita para atrair investimentos e empregar uma enorme massa de trabalhadores com pouca qualificação.
"A nova lei tem procedimentos que preenchem antigas brechas legais. A maioria das ações trata de ausência de contratos, pagamento por horas extras ou seguros e compensações por acidentes de trabalho", diz o advogado chinês Jeff Ren, do escritório Deheng. "Em 90% dos casos, os empregados vencem as ações trabalhistas."

Jornada de 70 horas
Há milhões de trabalhadores sem contrato no país. Não há férias remuneradas, greves são reprimidas e os sindicatos pertencem ao governo. Há salários mínimos regionais, comumente desrespeitados. As jornadas de trabalho podem chegar a 70 horas semanais.
Em Pequim, onde a situação é bem melhor do que no interior do país, 44% da mão-de-obra trabalha 6,9 dias por semana, em média 56 horas. Em Guangzhou, capital da mais rica província chinesa, o antigo Cantão, é comum achar funcionárias que trabalham 80 horas por semana, em turnos de até 12 horas.
Há 210 milhões de chineses nascidos no campo, mas que trabalham como migrantes nas grandes cidades chinesas, principalmente na construção e nas fábricas.
Com tamanha mão-de-obra querendo escapar da pobreza, os abusos são generalizados.
Milhares moram em alojamentos precários ao lado das obras e fábricas em que trabalham, com apenas algumas horas livres para dormir. A legislação, aprovada no ano passado, depois de dois anos de discussões, revela a preocupação do governo sobre as crescentes disparidades sociais na China.

Custos em alta
"Na teoria, as regras de mercado são as melhores, mas na China há um enorme desequilíbrio entre a força dos empregadores e a dos empregados. O governo precisava tomar responsabilidade", diz Ren.
As queixas do empresariado contra a nova legislação coincidem com um momento considerado crítico pela indústria exportadora do país. Além da queda da demanda dos Estados Unidos, principal importador, a moeda chinesa não pára de se valorizar diante do dólar, encarecendo os custos chineses. O yuan se valorizou em 20% em apenas dois anos.
Cerca de 80 empresas coreanas mudaram parte de suas linhas de montagem no último ano para países como Vietnã e Camboja, atrás de custos de produção menores.
"A nova lei não aumenta custos trabalhistas, mas provocou uma onda de maior fiscalização das autoridades. Como muitas fábricas e construtoras não pagavam horas extras ou finais de semana, agora esse custo terá de ser acrescentado", diz à Folha o advogado americano Steve Dickinson, de Xangai.
"Antes, sem demanda, você demitia. A nova lei dificulta isso e complica a vida de quem tem necessidades sazonais, da agricultura à construção. Depois do prédio pronto, o que se faz com o funcionário? Há regras um tanto inapropriadas para um país que muda todo dia."


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