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LUÍS NASSIF
Marketing das eleições
Os grandes matemáticos e estatísticos talvez consigam, algum dia, quantificar e
estabelecer um padrão para as grandes ondas da opinião pública, caminhando em uma ou outra direção. Mas o princípio que leva presidentes a experimentar
essa montanha-russa de um período de popularidade, seguido de outro de desgaste, é o mesmo dos mercados de ativos, especialmente de ações ou papéis de
países.
No mercado não se considera nenhum papel bom em si. Ele é
caro ou barato. Um papel barato -aquele cujo preço é inferior
ao da percepção do mercado-
tende a ser valorizado, bem visto, entrando em uma espiral de
alta que quase sempre leva ao
"overshooting" -uma valorização maior do que a que o
mercado comportava.
A partir daí, o mesmo papel
passa a ser visto como caro e a
sofrer um processo de depreciação. Qualquer evento impacta
negativamente o papel, ocorrendo uma desvalorização maior
do que o mercado esperava e
provocando, no momento seguinte, um novo movimento de
valorização.
Obviamente não são todos os
papéis nem todos os políticos
que passam por esse processo.
Há um tipo específico de ativo e
de político de maior volatilidade. Assim como existem aqueles
políticos alçados à condição de
"blue chips" ou de "lixo", que ficam imunes a oscilações.
A campanha eleitoral tem sido típica desse processo. Tome-se FHC. Em um certo momento,
estava "barato". Quando ocorreu o caso Lunus, caiu a ficha da
opinião pública sobre o fim dos
coronéis, e ele foi revalorizado.
O evento deflagrou um processo
de reavaliação que tornou FHC
"caro". Provocou um "overshooting", como diriam os analistas financeiros. O aumento da
crise econômica, da inadimplência e do desemprego fez o
pêndulo voltar rapidamente.
Essa mesma curva, mais cedo
ou mais tarde, vai afetar todos
os candidatos. Até o momento
apenas Lula tem se mantido estável, porque o jogo se dá em
torno da segunda alternativa à
Presidência. Mas também não
escapará desse processo quando
a campanha começar.
Os movimentos da candidatura Serra são típicos dessas ondas. A candidatura começou pequena, deu um salto. Aí, em razão do caso Lunus e um conjunto de denúncias, entrou em baixa, e retomou o movimento de
alta na última semana. Agora
está em maré alta, com vento a
favor. Mas haverá novas ondas
até as eleições.
Nem se pode dizer que é uma
denúncia ou outra que inverte o
movimento do pêndulo. Talvez
as denúncias surjam em razão
desse processo, já que os fatos e
boatos envolvendo todos os candidatos estão aí, ao alcance de
todos. A mídia molha o dedo,
coloca ao vento, percebe que é
hora e solta o dossiê contra o
candidato A ou B. Outros vão
atrás, aí se percebe que se avançou muito, começam as reações
de leitores, e o pêndulo retorna
para a outra ponta.
Ninguém tem a fórmula nem
o compasso para avaliar o tempo de cada movimento. Se tivesse, cada marqueteiro trataria de
trabalhar cientificamente seu
candidato para que o "overshooting" para cima ocorresse no
dia das eleições.
Mas é inegável que a falta de
sensibilidade para esses movimentos já matou muitas candidaturas. Lembro-me bem da candidatura Erundina (então no PT) para a Prefeitura de São
Paulo. Até poucos dias antes
praticamente não existia. No
dia das eleições, fui com minhas
filhas votar, elas com pouco
mais de dez anos, e só falavam
em Erundina para cá e para lá.
O resultado das eleições pegou
quase todos os institutos de surpresa. Talvez, se a eleição demorasse um pouco mais, o pêndulo tivesse invertido.
De qualquer modo, como não existem ainda fórmulas matemáticas precisas para prever esses movimentos, mais do que
nunca o marketing das campanhas dependerá da intuição e
da arte dos estrategistas.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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