São Paulo, terça-feira, 11 de junho de 2002

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LUÍS NASSIF

Marketing das eleições

Os grandes matemáticos e estatísticos talvez consigam, algum dia, quantificar e estabelecer um padrão para as grandes ondas da opinião pública, caminhando em uma ou outra direção. Mas o princípio que leva presidentes a experimentar essa montanha-russa de um período de popularidade, seguido de outro de desgaste, é o mesmo dos mercados de ativos, especialmente de ações ou papéis de países.
No mercado não se considera nenhum papel bom em si. Ele é caro ou barato. Um papel barato -aquele cujo preço é inferior ao da percepção do mercado- tende a ser valorizado, bem visto, entrando em uma espiral de alta que quase sempre leva ao "overshooting" -uma valorização maior do que a que o mercado comportava.
A partir daí, o mesmo papel passa a ser visto como caro e a sofrer um processo de depreciação. Qualquer evento impacta negativamente o papel, ocorrendo uma desvalorização maior do que o mercado esperava e provocando, no momento seguinte, um novo movimento de valorização.
Obviamente não são todos os papéis nem todos os políticos que passam por esse processo. Há um tipo específico de ativo e de político de maior volatilidade. Assim como existem aqueles políticos alçados à condição de "blue chips" ou de "lixo", que ficam imunes a oscilações.
A campanha eleitoral tem sido típica desse processo. Tome-se FHC. Em um certo momento, estava "barato". Quando ocorreu o caso Lunus, caiu a ficha da opinião pública sobre o fim dos coronéis, e ele foi revalorizado. O evento deflagrou um processo de reavaliação que tornou FHC "caro". Provocou um "overshooting", como diriam os analistas financeiros. O aumento da crise econômica, da inadimplência e do desemprego fez o pêndulo voltar rapidamente.
Essa mesma curva, mais cedo ou mais tarde, vai afetar todos os candidatos. Até o momento apenas Lula tem se mantido estável, porque o jogo se dá em torno da segunda alternativa à Presidência. Mas também não escapará desse processo quando a campanha começar.
Os movimentos da candidatura Serra são típicos dessas ondas. A candidatura começou pequena, deu um salto. Aí, em razão do caso Lunus e um conjunto de denúncias, entrou em baixa, e retomou o movimento de alta na última semana. Agora está em maré alta, com vento a favor. Mas haverá novas ondas até as eleições.
Nem se pode dizer que é uma denúncia ou outra que inverte o movimento do pêndulo. Talvez as denúncias surjam em razão desse processo, já que os fatos e boatos envolvendo todos os candidatos estão aí, ao alcance de todos. A mídia molha o dedo, coloca ao vento, percebe que é hora e solta o dossiê contra o candidato A ou B. Outros vão atrás, aí se percebe que se avançou muito, começam as reações de leitores, e o pêndulo retorna para a outra ponta.
Ninguém tem a fórmula nem o compasso para avaliar o tempo de cada movimento. Se tivesse, cada marqueteiro trataria de trabalhar cientificamente seu candidato para que o "overshooting" para cima ocorresse no dia das eleições.
Mas é inegável que a falta de sensibilidade para esses movimentos já matou muitas candidaturas. Lembro-me bem da candidatura Erundina (então no PT) para a Prefeitura de São Paulo. Até poucos dias antes praticamente não existia. No dia das eleições, fui com minhas filhas votar, elas com pouco mais de dez anos, e só falavam em Erundina para cá e para lá. O resultado das eleições pegou quase todos os institutos de surpresa. Talvez, se a eleição demorasse um pouco mais, o pêndulo tivesse invertido.
De qualquer modo, como não existem ainda fórmulas matemáticas precisas para prever esses movimentos, mais do que nunca o marketing das campanhas dependerá da intuição e da arte dos estrategistas.

E-mail - lnassif@uol.com.br



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