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COMÉRCIO MUNDIAL
Antigo G20plus passa agora a ser G-X ou G-variável
Amorim critica postura dos
EUA durante negociação
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA A BUENOS AIRES
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
O grupo de países pobres que já
foi chamado de G20plus passou
ontem a ser o G-X ou o G-variável,
segundo o chanceler Celso Amorim, ao desafiar os Estados Unidos, considerados os principais
responsáveis pela desistência de
países do grupo: "Se quisermos
atazanar a vida dos Estados Unidos, basta botar dois ou três parágrafos de antidumping [em acordos de comércio], mas não faremos isso".
Em novas e agora indiretas referências aos EUA, disse: "Se algum
país achar que pode encurralar o
Mercosul, que tente. Que sentido
fará uma Alca [Área de Livre Comércio das Américas] sem o Mercosul?", disse Amorim, acrescentando que o próprio bloco do Sul
"não é uma camisa-de-força".
O Uruguai, um dos quatro participantes do Mercosul (os outros
são Argentina, Brasil e Uruguai),
foi um dos três países que constavam da lista de presentes na reunião de ontem do agora G-X, em
Buenos Aires, mas acabou excluído do comunicado final sem nenhuma explicação. Os dois outros
foram Peru e Guatemala, já considerados fora do grupo.
Desde a fracassada reunião da
OMC (Organização Mundial do
Comércio), em Cancún, no mês
passado, os EUA passaram a jogar
duro para enfraquecer o novo
grupo de países pobres criado para forçar uma revisão na política
de subsídios agrícolas dos países
ricos, tão prejudicial aos países
pobres.
As armas norte-americanas são
principalmente assistência financeira e acordos bilaterais de livre
comércio, poderosas o suficiente
para, por exemplo, retirar a Colômbia do agora G-X. Apesar de
um telefonema do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva pedindo
a presença colombiana no encontro de ontem, o presidente Álvaro
Uribe não mandou representante.
"Não queremos encurralar ninguém nem ser encurralados por
ninguém", disse Celso Amorim a
jornalistas, numa tumultuada entrevista entre a saída do Palácio
San Martín, onde se realizou o encontro, e o carro que o levaria até
a Embaixada do Brasil.
Amorim, principal articulador
do G-X, não gostou quando os
jornalistas lhe perguntaram se o
grupo estava "em baixa". Em linguagem de mercado de ações, sugeriu: "Se fosse eu, comprava na
baixa". Na sua opinião, o grupo
tende a voltar a crescer nas novas
rodadas de negociações da OMC.
A próxima é até 15 de dezembro,
em Genebra (Suíça).
Ele também disse que "nem todos os participantes do G20 original foram convidados para a reunião de ontem -algo que o chanceler argentino, Rafael Bielsa,
confirmou. E completou afirmando que o grupo é informal, daí a
variação na presença: "Não existe
uma carteirinha para assinar".
O tema de união desses países é
a agricultura. Eles se uniram para
tentar enfrentar uma proposta
conjunta de EUA e União Européia, que mantém uma política de
subsídios agrícolas, durante a reunião da OMC em Cancún.
A reunião terminou em fracasso
devido a um impasse na hora em
que eram discutidos os chamados
"temas de Cingapura", que são facilitação de negócios, regras para
investimentos, política de concorrência e compras governamentais. A União Européia insistia em
incluir na declaração final pelo
menos dois desses temas, ao que
se opuseram países em desenvolvimento e países muito pobres.
Ao citar os verbos "encurralar"
e "atazanar" ao se referir aos EUA,
o chanceler brasileiro não reagia
apenas à ação da maior potência
do mundo para esvaziar o grupo
de países pobres na OMC, mas
também às pressões que o país faz
na discussão da Alca, especialmente sobre o Mercosul.
Amorim, porém, justificou a
atitude dos norte-americanos como algo normal: "Ninguém é santo em negociação".
Ele se reuniu com empresários
em sua passagem por São Paulo
na quinta-feira, a caminho de
Buenos Aires. Disse que a intenção foi explicar as negociações do
Mercosul na Alca e avisou que
"haverá perdas".
"Nós queremos uma Alca muito ambiciosa, com tarifas zero para todos os produtos. É evidente
que, num processo assim, alguns
vão perder", disse ele, deixando
claro que já vem preparando o espírito dos setores empresariais.
Aborrecido com as críticas de
que o Itamaraty estaria se conduzindo "ideologicamente" nas suas
relações com os EUA e nas negociações comerciais, o chanceler
disse que não é verdade, mas admitiu em seguida: "Tudo na vida é
ideológico". Depois, ressalvou:
"Mas sem fundamentalismo".
Amorim volta hoje a Brasília.
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