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Inimigos da globalização mudam tática
Evelson de Freitas/Folha Imagem
![](../images/b1111012001.jpg) |
Protesto antiglobalização em São Paulo, que foi da praça da Sé até o consulado dos Estados Unidos |
ALAN BEATTIE
DO "FINANCIAL TIMES"
Desde 11 de setembro, o apetite por manifestações anticapitalistas parece ter-se reduzido: nem a reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio), em Doha, Qatar, nem a reunião do G-20 em Ottawa nesta semana devem atrair protestos na
escala originalmente planejada.
Mas, para os dispostos a reformular suas críticas e dirigi-las para
outros alvos, o potencial de mudança pode ser o mais elevado em
uma década.
Tom Spencer, diretor do Centro
Europeu para Assuntos Públicos,
uma organização de pesquisa, resume o desafio que as pessoas que
continuam a buscar reformas radicais precisam enfrentar: "Estamos falando sobre anticapitalismo, antiglobalização ou anti-americanismo? Antes de 11 de setembro, isso não fazia diferença.
Agora, faz".
George Soros
Ele discursou em recente conferência sobre a globalização, em
Budapeste, patrocinada pelo investidor bilionário George Soros,
que teve a presença de acadêmicos, militantes e políticos.
O que emergiu da conferência
foi o fato de que continuar integrando as três críticas de Spencer
acarretava o risco de gerar forte
oposição. Tanto os palestrantes
favoráveis à liberalização quanto
os adversários atraíram opróbrio
generalizado por aparentemente
terem agido assim.
Walden Bello, diretor do Foco
no Sul Global, um grupo ativista
sediado em Bancoc e que se opõe
à liberalização comercial e econômica generalizada, atraiu fortes
críticas ao alegar que acusações
semelhantes poderiam ser feitas
ao modelo econômico de liberalização definido por Washington e
à inconstante política externa dos
Estados Unidos.
Ele insistiu em que o público
nos países pobres rotineiramente
aproxima anti-americanismo e
antiglobalização. "No Terceiro
Mundo, sente-se uma real ambivalência sobre os atos de 11 de setembro", disse ele.
Osama bin Laden
"Em toda a Ásia, um dos produtos mais vendidos são camisetas
com a imagem de Osama bin Laden. Ele agora está surgindo como uma espécie de figura rebelde
correndo em círculos para escapar ao valentão."
David Hartridge, assessor especial de Mike Moore, o diretor-geral da OMC, usou a carta do 11 de
setembro pelo ponto de vista
oposto. "Deveríamos tomar cuidado para não transformar uma
atrocidade em argumento", disse
ele. "A raiva não valida nada."
Comentários como esses atraíram fortes reações de diversos
participantes, os quais alegaram
que ser inimigo da liberalização
não equivale a ser anti-americano.
Paraísos fiscais
Um deles foi Susan George, nascida nos Estados Unidos, mas naturalizada francesa e membro da
organização ativista Attac, sediada em Paris. George disse que a
agenda relativamente específica
de controles e impostos que a Attac propõe para o livre movimento de capitais se tornara ainda
mais relevante depois dos ataques.
"Uma das exigências da Attac
era uma repressão aos chamados
paraísos fiscais", disse ela. "Até 11
de setembro, todos afirmavam
que isso era impossível. Então,
George Bush subitamente passou
a alegar que os paraísos fiscais estavam abrigando terroristas e reprimi-los se tornou perfeitamente
possível."
George não acredita que o governo dos Estados Unidos se tenha convertido à análise que ela
defende quanto às causas implícitas do terrorismo.
Ainda que se esteja distanciando da compreensão demonstrada
por Bello quanto a uma posição
simpática sobre os ataques terroristas, ela ainda assim encara com
horror a resposta americana.
"Como diz o ditado: não faça
aquilo que você quer fazer, mas
aquilo que seu inimigo menos
gostaria que você fizesse."
"E isso seria dar início a um plano genuíno de combate às crises
de pobreza e ambiental que afligem o planeta. O que eles mais desejam que façamos é mais ou menos o que estamos fazendo: bombardear civis e criar uma reação
no mundo muçulmano."
Pelo menos uma chance
Ela disse que duvidava de que os
governos tenham decidido abandonar sua complacência em função do choque, pelo menos não
em escala semelhante ao que
aconteceu na Segunda Guerra
Mundial, depois da qual as Nações Unidas foram criadas e os
Estados Unidos ajudaram a reconstruir a Europa com o Plano
Marshall. Mas existe, alega ela, pelo menos uma chance.
De fato, a possibilidade de uma
mudança genuína na disposição
de contemplar novas idéias se tornou evidente.
Idéias otimistas, como um imposto mundial sobre a emissão de
dióxido de carbono a fim de levantar bilhões para projetos de
desenvolvimento, proposta recentemente por uma comissão de
especialistas presidida por outro
participante da conferência de
Budapeste, o ex-presidente mexicano Ernesto Zedillo, parecem
agora um pouco menos fantasiosas e um pouco mais próximas de
servir de base a debates sérios.
Aliança frouxa
Mas não está claro se a aliança
frouxa de organizações radicais
anticapitalistas, que ganhou importância mundial pela primeira
vez na conferência da OMC em
Seattle, em 1999, está bem preparada para defender os argumentos em favor da mudança.
A ironia da situação é que muito
do que seus membros mais defendem é maior regulamentação dos
movimentos de capital, das grandes empresas e dos mercados de
trabalho. Assim, os instintos intervencionistas que em geral
acompanham conflitos militares
em larga escala, bem como as respostas dos ativistas à desaceleração econômica mundial, podem
servi-las bem.
Mas alguns dos ativistas reconhecem que suas táticas talvez
não sejam apropriadas. As mudanças de política estatal exigem
um envolvimento mais sistemático com o Estado. Os agentes de
mudança mais prováveis seriam
as Organizações Não-Governamentais estabelecidas, como as
agências assistenciais que, com o
tempo, desenvolveram fortes departamentos de lobby e de defesa
de interesses específicos.
G. M. Tamas, um professor de
filosofia húngaro, disse aos participantes da conferência que "o
movimento de Seattle é um teatro
revolucionário com objetivos reformistas. Não quer se transformar em um grupo de políticos
eleitos. Mas estamos tendo uma
guerra na qual o voluntarismo
não está em voga".
Tradução de Paulo Migliacci
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