São Paulo, terça-feira, 11 de dezembro de 2001

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A AGONIA DO CALOTE

Correntistas correm para transferir depósitos em pesos para contas em dólares, além de fugir para o Uruguai

Argentinos gastam para se livrar de pesos

Associated Press
Desempregados carregam bandeira argentina em Buenos Aires; semana terá greve e manifestações contra a política econômica


FABRICIO VIEIRA
DE BUENOS AIRES

Fugir do peso é a maior preocupação dos argentinos neste momento. Ninguém quer ficar com a moeda do país na carteira devido ao crescente temor de que o governo promova uma desvalorização a qualquer momento.
Se comprar dólares se tornou uma batalha, os argentinos tentam descobrir outros caminhos para proteger suas economias. As concessionárias de automóveis foram as mais beneficiadas. Estimativa da Câmara de Comércio Automotivo aponta que na semana passada o crescimento na venda de automóveis usados chegou a 15%. A venda de carros novos aumentou 10%.
Apartamentos e casas também estão na mira dos assustados argentinos. As consultas para negócios nas imobiliárias cresceram 30%, e o número de reservas para compra de imóveis, 8%.
O dólar é artigo cada vez mais raro. Na sexta-feira, os bancos não vendiam a moeda norte-americana. Ontem não foi diferente. E a maioria das casas de câmbio não tem mais dólares para vender.
De 12 casas consultadas pela Folha, apenas 2 ainda vendiam dólares, nunca a uma taxa inferior a 1,27 peso por US$ 1. Não é difícil ouvir histórias de pessoas que chegaram a pagar 1,80 ou mesmo 1,90 peso para comprar US$ 1.
A migração dos recursos que ficaram retidos nas contas bancárias pelo limite de saques tem crescido. Somente na última quarta-feira, os argentinos transferiram mais de US$ 200 milhões dos depósitos em pesos para depósitos em dólares.

Desvalorização real
"A desvalorização que o mercado produz atualmente é irreversível. A Argentina precisa de que o governo assuma um câmbio realista. Tem de desvalorizar", diz o economista José Luis Espert, da consultoria Espert & Associados.
A impossibilidade de os argentinos sacarem mais de US$ 250 por semana pelas novas regras impostas pelo governo se refletiu diferentemente nos diversos setores da economia. O pequeno comércio amargou queda de até 80% nas vendas na última semana.
Nas casas de câmbio do Uruguai, a desvalorização do peso é bastante acentuada -a moeda era vendida ontem por US$ 0,50.
Quem tentou sacar dólares nos caixas eletrônicos de suas contas atreladas à moeda norte-americana teve uma desagradável surpresa. Quem digitava a senha de sua conta corrente ou caderneta de poupança em dólares, e solicitava uma retirada de US$ 250 a que tem direito, recebia pesos.
Na Bolsa de Valores houve uma explosão de negócios. O volume subiu de US$ 4,4 milhões na segunda passada para US$ 36,6 milhões na sexta, ou seja, um aumento de mais de 730%.
A queda de ontem do Merval, de 7,58%, reflete a busca de lucros de investidores que viram os papéis subirem muito na última semana. O risco-país voltou a subir e fechou em 4.191 pontos básicos.
Os fundos de pensão já estão protegidos contra uma eventual desvalorização. Segundo Francisco Astelarra, superintendente geral da AFJP (a administradora dos fundos de pensão), mais de 85% dos recursos dos fundos de pensão estão em depósitos em dólares ou títulos públicos.
O Banco Central preparou mais uma medida para controlar os depósitos dos bancos. Agora, 75% dos recursos que ingressarem nas contas neste mês e em janeiro terão de ser transferidos para o BC.



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