São Paulo, quarta-feira, 11 de dezembro de 2002

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LUÍS NASSIF

O desenvolvimentismo e a estabilidade

Para entender o futuro governo Lula, é importante, primeiro, avaliar corretamente o papel das equipes de transição, que é o de apenas levantar números, auditar, e não formular políticas. As políticas serão definidas em duas frentes. No momento, há um conjunto de especialistas, gente de confiança dos futuros ministeriáveis do PT, trabalhando em formulações, individualmente ou em grupo, mas sem representar oficialmente o partido.
No segundo tempo, essas idéias serão apresentadas de maneira mastigada aos futuros ministros -alguns dos quais já definidos-, podendo vir a ser a espinha dorsal das futuras estratégias econômicas.
De um desses centros, ligado ao futuro ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, foi possível levantar a seguinte visão de futuro. Saliente-se que, por enquanto, se trata de posição individual, podendo vir ou não a ser adotada pelo PT.
Há consciência clara sobre a gravidade do momento atual. Considera-se a crise externa atual mais grave do que a de 1982. Na época não houve corte das linhas de comércio nem uma fuga tão espetacular de recursos como neste segundo semestre. Considera-se um avanço a melhoria das contas externas neste ano, mas não a ponto de contornar a iliquidez internacional do próximo ano.
No campo da inflação, as avaliações são menos pessimistas. A avaliação desses setores é que as projeções do mercado para 2003 são pavlovianas: o mercado projeta para 2003 as mesmas taxas de inflação de 2002. De forma bastante curiosa, aliás, já que, para haver a mesma inflação, teriam que ocorrer os mesmos eventos com os mesmos impactos deste ano. Além disso, há uma curiosidade extravagante nessas projeções. Neste ano o IGP-M será quase o dobro do IPCA. Os índices tendem a convergir no tempo. Mas o mercado continua projetando o mesmo diferencial entre os dois índices para o próximo ano.
Sua visão é que, por razões metodológicas e pela entrada da safra, em março será possível que ocorra até uma deflação, e esse será o melhor momento para Lula começar a brandir novas bandeiras.
Em sua opinião, o governo não poderá "malanizar", isto é, comportar-se de forma passiva diante dos problemas conjunturais. Por outro lado, não pode ir contra os fundamentos de mercado, para não precipitar a crise. Com criatividade, será possível compatibilizar as duas frentes.
O projeto de desenvolvimento passa por quatro pernas, algumas cujo processo já foi iniciado, mas ainda de forma pouco perceptível à opinião pública.
A primeira é o desenvolvimento do mercado de capitais, objeto de um pacto firmado ainda no período eleitoral com a Bovespa e a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Esses setores chamam a atenção de que, pela primeira vez na história recente, a Fiesp avalizou pactos dessa natureza.
A segunda perna será a expansão do crédito. Na opinião desses setores -coincidentes com a do Banco Central-, o principal fator de encarecimento e de restrição de crédito é a insegurança jurídica. As taxas são definidas em função da demora estimada na recuperação de crédito, razão para o PT tentar aprofundar o processo de desburocratização das execuções judiciais, melhorar cadastro de clientes e outras ferramentas de garantia de crédito.
A terceira perna será o desenvolvimento regional descentralizado, com ênfase no adensamento das cadeias produtivas regionais, agregando valor, mas evitando estruturas centralizadas. A idéia é avançar no formato de redes, experiência iniciada há algum tempo pelo BNDES, em parceria com federações de indústrias.
A quarta perna será a de uma política industrial explicitando os setores a serem estimulados, de acordo com critérios de tecnologia e de exportação.
Essas fontes fazem questão de lembrar que não estão autorizadas a falar em nome do PT.

E-mail - LNassif@uol.com.br


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