São Paulo, terça-feira, 12 de fevereiro de 2002

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COLAPSO DA ARGENTINA

Cotação fecha no mesmo valor de antes do feriado do dia 1º; argentinos procuram pesos para pagar contas

Câmbio livre mantém dólar a 2,10 pesos

France Presse
Filas tomaram a rua San Martin, centro financeiro de Buenos Aires, na abertura do mercado cambial


JOSÉ ALAN DIAS
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

FABRICIO VIEIRA
DE BUENOS AIRES

O governo argentino obteve um alento no primeiro dia de câmbio livre, após quase 11 anos de um regime de câmbio fixo.
Depois de uma semana de feriado cambial e ao final de uma jornada marcada por enormes oscilações, a cotação do dólar fechou estável, a 2,10 pesos -mesma cotação do dia 1º deste mês. Mais: o Banco Central não precisou intervir para segurar a escalada da moeda norte-americana.
Diferentemente do que o governo temia, a demanda por dólares não foi suficiente para fazer a cotação da moeda disparar. Pelo contrário, durante a tarde, casas de câmbios chegaram a interromper atividades porque não tinham mais pesos para trocar com as pessoas interessadas em vender dólares.
No mercado de grandes negociadores, apesar da mínima quantidade de transações fechadas, a maioria se concentrou com exportadores (como produtores de grãos), que liquidaram parte de seus contratos em dólares, atrasados desde o final de dezembro do ano passado.
Com a liberação das contas-salário, havia o temor de que as pessoas aumentassem a procura por dólares. Mas o que se viu foi pessoas vendendo dólares que tinham em casa para conseguir pesos para pagar suas contas.
O presidente Eduardo Duhalde havia avisado no fim de semana que o governo não ficaria de braços cruzados se o dólar começasse a disparar. Mas Duhalde sabe que o eventual êxito de sua política econômica está atrelado à disposição do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do governo dos EUA em oferecer um socorro financeiro que permita fechar as contas deste ano. Ontem, Duhalde recebeu um telefonema do diretor-gerente do FMI, Horst Köhler. Ele afirmou que o órgão está disposto a negociar com a Argentina. Na noite de ontem, o ministro Jorge Remes Lenicov viajaria para Washington para negociar um novo socorro financeiro. A Argentina tenta arrancar um pacote de US$ 25 bilhões.

Parto
Não deixou de ser um dia nervoso (ou um parto nervoso, como definiu o secretário da Fazenda, Oscar Lamberto.) Quando as operações no mercado foram abertas, às 10h, cada dólar era negociado a 2,30 pesos. Antes do meio dia, a cotação chegava a 2,50 peso -em algumas casas de câmbio, foi vendido a 2,60 pesos.
""Foram poucas operações no mercado dos grandes negociadores. Há muita especulação, muitos esperando um panorama mais claro para voltar ao mercado. Nos próximos dias a cotação deve oscilar muito, com muita volatilidade, até subir e sem intervenção do BC", disse o economista Nicolás Caruso, do Scotibank Quilmes. ""Creio que BC pode até esperar que suba para intervir fortemente e derrubar o dólar para provocar um efeito psicológico."
Em um dia tenso, a Bolsa de Buenos Aires despencou 10,68%.
O chamado microcentro, no quadrilátero que aglutina mais de uma dezena de casas de câmbio, se converteu em um tumultuado mercado aberto de dólares. Dezenas de pessoas se aglomeravam em filas de mais de 100 metros. O trânsito se tornara impraticável no local. Os valores apresentavam discrepâncias de até 20 centavos. Em um casa era possível encontrar dólares à venda por 2,25 pesos enquanto a vizinha, emparelhada, o vendia por 2,30 pesos.
Transações se fechavam nas próprios filas. Eram nelas que os "arbolitos" (como são conhecidos os doleiros) buscavam cooptar interessados, oferecendo a moeda americana por valores até 0,50 centavo mais baixos que nas casas de câmbio para a venda. ""Câmbio, câmbio. Vendo e compro pelo melhor preço", era dessa forma que buscavam atrair clientes para o interior das pequenas lojas, em que os próprios donos comercializavam o dólar ou apenas cediam o espaço para um negociador. Com os "arbolitos", as transações se completavam na rua, a despeito de ser uma operação ilegal -sob a vista do contingente de policiamento reforçado. Quinze deles foram presos. Tampouco era desprezível o número de pessoas que se prostrava à frente das casas de câmbio apenas para acompanhar a cotação. Parte à espera da cotação mais favorável para se atrever a comprar ou vender.


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