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OPINIÃO ECONÔMICA
No fio da navalha
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Nas últimas semanas, tivemos
sinais de melhora no cenário
mundial, em especial no leste
da Ásia. Mesmo economias notoriamente problemáticas, como a brasileira, voltaram a ter
algum acesso aos mercados financeiros internacionais.
Foi o que bastou para que começasse a se instalar, outra vez,
um certo clima de oba oba no
Brasil. Economistas ligados a
bancos e outros porta-vozes dos
interesses financeiros e governamentais asseguram que o
pior já passou e que o país vai
atravessar o ano sem dramas
cambiais. (Até um certo alto
funcionário do Banco Central,
que andava bastante recolhido
nos últimos meses, saiu da toca
para queixar-se novamente das
críticas à política cambial, em
carta à Folha.)
É possível que o pior já tenha
passado. Mas, a rigor, ninguém
sabe. Os sintomas de melhora
são frágeis e muito recentes.
Persistem dúvidas sobre a solidez do processo de ajustamento
e reestruturação das economias
asiáticas em crise. Países de outras regiões, notadamente a
Rússia e o Brasil, continuam
"sub judice".
No que diz respeito ao Brasil,
a única coisa certa é que permanece o quadro de vulnerabilidade. As medidas que o governo tomou, desde fins de 1997,
não modificaram substancialmente esse quadro. E nem seria
de se esperar que o tivessem feito.
A reação brasileira ao choque
asiático consistiu, essencialmente, de um aumento brutal
das taxas de juros. As demais
medidas anunciadas -de ajuste fiscal, de estímulo às exportações e de controle das importações- foram menos importantes. Algumas nem chegaram a
ser implementadas.
Ora, não passa pela cabeça de
ninguém que uma situação de
vulnerabilidade externa possa
ser superada pela prática de juros elevados. Trata-se, como se
sabe, de um instrumento de
emergência, que produz efeitos
basicamente transitórios sobre
a conta corrente e a conta de
capitais do balanço de pagamentos.
De qualquer maneira, o grau
de dependência financeira externa, acumulado irresponsavelmente desde 1993-94, era alto demais para que pudesse ser
eliminado ou mesmo fortemente reduzido em poucos meses,
em meio à turbulência internacional.
A dependência financeira está associada, em parte, ao endividamento externo de curto
prazo. Os dados do BIS (Bank
for International Settlements),
ainda que incompletos, dão
uma idéia da posição relativa
do Brasil nesse particular.
Em fins de junho de 1997, alguns dias antes da eclosão da
crise na Tailândia, esses dados
indicavam que a posição brasileira não era nada invejável.
Entre os principais países latino-americanos, o Peru e o Brasil eram os únicos que apresentavam uma proporção de endividamento bancário de curto
prazo comparável à dos países
asiáticos que estariam, pouco
tempo depois, no epicentro do
furacão financeiro.
No caso do Brasil, a dívida
bancária com vencimento nos
12 meses seguintes correspondia, em junho de 1997, a 62%
da dívida bancária total. Os
dados correspondentes para a
Coréia do Sul, a Tailândia e a
Indonésia eram, respectivamente, 68%, 66% e 59% na
mesma data. Desde então, a dependência do Brasil em relação
a "hot money" aumentou e os
prazos dos empréstimos diminuíram, o que deve ter levado a
uma deterioração adicional do
perfil da dívida brasileira.
Não é por acaso que o Brasil
tem sido tão citado, nos meios
financeiros internacionais, como candidato a mercado "submergente". De acordo com as
estatísticas do Banco Central e
da Comissão de Valores Mobiliários, os passivos externos
brutos de curto prazo do país
(incluindo não só dívidas bancárias, mas também outras linhas de crédito, investimentos
em Bolsas de Valores brasileiras
e outros ativos de investidores
institucionais estrangeiros)
eram da ordem US$ 60 bilhões
em fins de 1997.
A isso deve-se acrescentar as
amortizações da dívida externa
de médio e longo prazos, com
vencimento em 1988 -estimadas em cerca de US$ 17 bilhões-, e o déficit em conta
corrente, que deve ficar por volta de US$ 30 bilhões.
Por esses e outros motivos, é
um pouco cedo para baixar a
guarda. O governo deveria, ao
contrário, intensificar os esforços de ajustamento das contas
externas, apoiando a redução
do desequilíbrio em medidas
mais duradouras, que trouxessem um reforço real à combalida competitividade internacional da economia brasileira.
Paulo Nogueira Batista Jr., 42, professor da
Fundação Getúlio Vargas e pesquisador-visitante do Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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