São Paulo, domingo, 12 de março de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

AÇÕES
Baixa poderá ser provocada pela realização de lucros ou porque as ações estão superavaliadas, afirma Jon Weber, diretor do banco
Chase prevê queda nos papéis da Internet

ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio

O diretor-executivo do banco Chase Manhattan, Jon Weber, diz que há risco de queda das ações das empresas de Internet no índice Nasdaq (EUA) ainda neste ano. O Nasdaq concentra os negócios das ações de empresas de alta tecnologia.
A queda, diz ele, poderá ser provocada pela realização de lucros dos investidores (venda de ações na alta) ou pela percepção do mercado de que os papéis estão superavaliados. Em ambas as hipóteses, ele acredita que a queda provocará fusões e aquisições de empresas no Brasil.
Apesar do prognóstico de queda do Nasdaq, o executivo diz que o futuro da Internet no Brasil é mais promissor do que nos países desenvolvidos e que o comércio eletrônico vai provocar deflação (queda nos preços) no prazo de dois anos.
A seguir, os principais trechos da entrevista.

 

Folha - De dois meses para cá, oito empresas passaram a oferecer acesso gratuito à Internet. Como o senhor vê essa corrida?
Jon Weber -
A oferta de acesso gratuito foi desencadeada pelos bancos porque uma operação pela Internet custa um décimo da mesma operação feita na agência bancária. É muito interessante para eles ter o cliente on line. Todos no setor enxergam grandes oportunidades de crescimento do e-commerce (comércio eletrônico pela Internet), e isso está motivando a corrida.
O negócio Internet tem três fontes de receita: a taxa mensal de acesso, o comércio eletrônico e a publicidade. O primeiro já está deixando de existir no Brasil. Dificilmente uma empresa terá receita com base no acesso à Internet pela banda estreita (convencional, de baixa velocidade).
Trabalhamos com a estimativa de que 80% da receita de comércio eletrônico da América Latina está no Brasil. Isso vai cair para cerca de 70% quando os outros países começarem a operar.
O bolo publicitário via Internet na América Latina deve representar US$ 120 milhões neste ano, US$ 260 milhões em 2001 e US$ 517 milhões em 2002.

Folha - Têm sido anunciadas aquisições de empresas a preços astronômicos, pagos com a troca de ações entre o comprador e o vendedor. As cifras não parecem um tanto irreais?
Weber -
Há uma pergunta que me faço todos os dias: se o valor das empresas é sustentado com base em um prognóstico da receita futura das companhias, quando a receita irá justificar o valor das empresas, já que elas não podem cobrar muito em função da forte concorrência entre os portais?

Folha - Como se calcula o valor de uma companhia na Internet? Como se avalia um portal ou um site de vendas?
Weber -
As companhias vêm sendo avaliadas com base nas vendas esperadas para o ano, mas já existem casos de avaliação com base na renda esperada para daqui a dois anos, porque as empresas são muito incipientes.
O valor de mercado de uma empresa de software para Internet equivale a 61,8 vezes o seu faturamento anual. Em uma empresa de comércio eletrônico B2B ("business to business") a relação é de 53,5 vezes. O valor de mercado dos portais equivale a 28,6 vezes o faturamento anual. Já o provedor de acesso em alta velocidade valeria 20,6 vezes o seu faturamento.

Folha - Os analistas, inclusive o senhor, dizem que a Internet precisa crescer, crescer e crescer para justificar o valor das empresas em Bolsa. Ela vai criar um novo mercado ou apenas substituir parte do comércio tradicional?
Weber
- Sou otimista em relação ao futuro da Internet no Brasil, porque o consumidor é mal-atendido pelo comércio varejista. A classe rica é proporcionalmente pequena, mas tem alto poder de compra. Os que compravam no exterior -porque não tinham no Brasil todas as cores, marcas e tamanhos desejados- vão comprar pela Internet.

Folha - Qual é a real dimensão do mercado brasileiro para a Internet? Quando o investidor estrangeiro investe em empresas brasileiras nesse setor, que país ele está vendo?
Weber -
O mercado de banda estreita (acesso em baixa velocidade, em que já existem várias opções de serviço gratuito) pode chegar a 10 milhões, talvez 15 milhões de usuários. Mas o país da Internet em alta velocidade será bem menor, porque ela custa caro e só estará acessível para a elite. Quando boa parte da população não tem saneamento básico, um serviço de R$ 60 a R$ 70 por mês é para a classe A.

Folha - Há cinco anos, imaginava-se que o Brasil teria 6 milhões de usuários de TV paga no ano 2000, mas o número não chega à metade do previsto. Quantos, na sua avaliação, vão pagar para ter acesso à Internet em alta velocidade?
Weber -
A estimativa é que teremos 3 milhões de usuários de Internet com acesso em banda larga (alta velocidade) no país em 2003.

Folha - O senhor acha que se deve ir com mais cautela, olhar a Internet com mais cuidado?
Weber -
Depende do ponto de vista. Todo mercado tem perdedor e ganhador. O acesso gratuito é inquestionavelmente bom para as companhias telefônicas, porque elas vão ganhar com o aumento do tráfego. É também inquestionavelmente bom para os bancos. Mas será bom para a mídia em geral? Essa é uma grande discussão. De modo geral, é bom para o país, porque democratiza a informação e aumenta a eficiência do comércio.

Folha - Segundo as estatísticas, há quase 7 milhões de usuários de Internet no Brasil. O sr. trabalha com esse número?
Weber
- No Chase, consideramos que há 5,5 milhões de usuários de Internet no Brasil.

Folha - Seu trabalho no Brasil mudou com essa explosão?
Weber -
Mudou todo o nosso acompanhamento de empresas no Brasil, porque o mercado está ávido por esse tipo de negócio. Nossa corretora especializada em empresas de Internet está à procura de negócios aqui. A Internet está causando uma reavaliação de ativos e alterando a percepção do risco de crédito.

Folha - Qual é o seu prognóstico em relação ao comportamento das ações das empresas de Internet para este ano?
Weber -
Acho que haverá queda das ações, provavelmente provocada por eventos de fora. Quando digo isso, me refiro a uma realização de lucros pelo investidor ou à percepção do mercado de que os papéis estão superavaliados.

Folha - Essa queda, ou acomodação de preços, ocorrerá só no Brasil ou também no exterior?
Weber
- Vai acontecer no mercado de modo geral, mas será piorada pela percepção de algumas apostas no Brasil. As pessoas tendem a agir em grupo. Meu prognóstico é que neste ano pode ocorrer uma queda substancial no índice Nasdaq, que vai provocar também a queda nos preços aqui. Em consequência, teremos algumas consolidações, ou seja, algumas empresas serão compradas por outras, locais ou internacionais. Provavelmente vamos ter desapontamentos quanto à viabilidade de alguns negócios da Internet lançados em Bolsa.


Texto Anterior: Bolha vai estourar, prevê consultor
Próximo Texto: Euforia tecno derruba "velha economia"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.