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OPINIÃO ECONÔMICA
O efeito Bresser-Nakano
BENJAMIN STEINBRUCH
Embora microscópica , a
redução dos juros decidida
no mês passado pelo Banco Central foi uma surpresa. Todos esperavam a manutenção da taxa
de 19%, porque não havia nenhuma alteração substancial no
cenário para justificar mudança
de atitude por parte do Banco
Central.
Pode ter havido, então, um elemento novo, quase subliminar, a
influenciar a decisão do Copom
(Comitê de Política Monetária):
o fator Bresser-Nakano. Os economistas Luiz Carlos Bresser Pereira e Yoshiaki Nakano produziram, a pedido do presidente do
PSDB, José Aníbal, um documento que servirá de base para a elaboração do plano econômico do
candidato tucano à Presidência
da República.
O trabalho, de 37 páginas, cuja
segunda versão está disponível
na internet (www.bresserpereira.org.br), é corajoso, porque
contesta uma das raras unanimidades brasileiras do momento, a competência da atual administração do Banco Central.
O ponto central do trabalho
dos dois economistas tucanos é a
taxa de juros da economia. Segundo eles, a teoria econômica
classifica como aberração as elevadas taxas vigentes no Brasil
nos últimos 13 anos. Por conta
disso, o país tem patinado sem
nunca conseguir ingressar em
um ciclo de crescimento econômico sustentado.
A cúpula econômica do governo chiou quando o trabalho de
Bresser e Nakano foi divulgado,
no fim ano passado. "Se eles são
tucanos, então não precisamos
de oposição", dizia-se no governo. Mas, na verdade, o estudo só
ajuda a atual administração.
Seu mérito é mostrar ao presidente Fernando Henrique Cardoso que há um equívoco no tradicional argumento oficial de
que o governo pretende reduzir
as taxas, mas não pode porque o
"mercado não deixa". Muita
gente dentro do governo acha
que esse argumento é falso, mas
não ousa contestá-lo. Bresser e
Nakano sustentam que o governo pode baixar os juros e dizem
como.
É difícil resumir em poucas linhas um documento tão extenso.
Mas, em síntese, Bresser e Nakano dizem que o grande desafio
do próximo governo é abandonar a prática de atribuir múltiplas funções aos juros, porque essa tem sido a razão das altas taxas. O Brasil tem juros muito elevados porque esse instrumento
tem sido usado ao mesmo tempo
para (1) reduzir a demanda e
evitar a aceleração da inflação;
(2) limitar a desvalorização da
taxa de câmbio para evitar inflação de custos; (3) atrair capital
externo para fechar o balanço de
pagamentos; (4) induzir investidores internos a comprar títulos
do governo e financiar o déficit
público e (4) reduzir o déficit comercial por meio do controle da
demanda interna.
Embora o discurso oficial diga
que a taxa é usada apenas para
o controle da demanda e da inflação, a verdade incontestável,
segundo Bresser e Nakano, é que
ela vem tendo essas múltiplas
funções. Ao elevar a taxa para
atrair capital externo a fim de fechar o balanço de pagamentos,
por exemplo, o BC provoca a valorização do real em relação ao
dólar, o que agrava o déficit comercial e, num prazo maior, o
desequilíbrio do próprio balanço
de pagamentos.
Os dois economistas chamam
de "ciclo perverso" a forma como
o crescimento econômico tem sido sistematicamente abortado
nas últimas duas décadas: a economia começa a se expandir por
meio das exportações e isso provoca um aumento das importações. Ao mesmo tempo, com o
crescimento provocado pelas importações, o consumo interno
aumenta e grande parte da produção é redirecionada para o
mercado interno, porque a capacidade produtiva não está dimensionada para atender às
duas demandas. Assim, embora
sejam competitivas externamente, as empresas reduzem exportações. Para evitar o agravamento
do déficit comercial, o Banco
Central aumenta a taxa de juros
e o ciclo de expansão é abortado.
Esse ciclo perverso, segundo o
trabalho, ocorre repetidamente
desde 1993. Para rompê-lo, só
existe uma receita: deixar a taxa
de câmbio variar mais (de R$
2,60 a R$ 3 por dólar); reestruturar a indústria para aumentar a
sua capacidade; promover exportações e substituir importações; e estabelecer uma política
comercial ativa, com incentivos
internos aos exportadores e com
negociação agressiva de acordos
e contestação de medidas protecionistas.
Com seu estudo, a dupla de
economistas prestou um excelente serviço ao debate sobre o crescimento econômico, que será certamente a tônica da campanha
eleitoral, tão logo termine a
atual e aguda crise política provocada pela disputa entre os pré-candidatos.
A economia brasileira cresceu
apenas 1,51% no ano passado,
uma taxa medíocre e muito
abaixo da média mundial de
2,4%. O país precisa crescer pelo
menos 5% ao ano para gerar
renda e dar empregos aos brasileiros. Bresser e Nakano dizem
que isso é possível, sem comprometer a estabilidade da economia. E mostram como. Cabe aos
especialistas discutir a sustentação teórica da proposta. Mas tenho certeza de que, ao pôr o dedo
numa ferida brasileira, ajudaram muito mais que imaginam o
futuro do Brasil.
Benjamin Steinbruch, 47, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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